Vamos deixar de dar vacina BCG a todos os bebés? Decisão está para breve

Portugal já tem poucos casos de tuberculose, por isso acabar com vacinação universal faz sentido, diz especialista. Mas é preciso perceber com mais rigor quais são os grupos de risco.

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A vacina contra a tuberculose está incluída no Programa Nacional de Vacinação Paulo Ricca (arquivo)

Esgotada há quase um ano em Portugal, a vacina contra a tuberculose (BCG) deve deixar de ser dada a todos os bebés à nascença em breve. Pode ser retirada do Programa Nacional de Vacinação e ficar reservada apenas para crianças de grupos considerados de risco, como acontece na maior parte dos países da Europa Ocidental. A Direcção-Geral da Saúde (DGS) prepara-se para tomar uma decisão sobre esta matéria e, enquanto isso não acontece, as crianças incluídas nos grupos de risco já definidos estão a ser sinalizadas para serem vacinadas nos centros de saúde porque desde Fevereiro já há doses disponíveis e que foram importadas do Japão.

Se a DGS optar por retirar do calendário vacinal a BCG, esta deixará de ser universal e dada à nascença nas maternidades e hospitais, como acontecia até ter havido uma interrupção no seu fornecimento em Maio de 2015, quando o laboratório dinamarquês que a produz enfrentou uma ruptura de stocks. A subdirectora-geral da Saúde, Graça Freitas, e o presidente da Sociedade de Infecciologia Pediátrica da Sociedade Portuguesa de Pediatria, Luís Varandas, consideram que não há inconvenientes, até porque estão a ser cumpridos os critérios epidemiológicos da Organização Mundial da Saúde. Portugal está desde 2014 no limiar de baixa incidência (menos de 20 casos de tuberculose por 100 mil habitantes e menos de um caso de meningite tuberculosa por milhão de habitantes, especificam).

No início deste ano, a BCG voltou a ser distribuída em Portugal, após um longo processo que culminou com a aquisição de milhares de doses a um laboratório japonês. Em Fevereiro, a DGS informou que as doses se destinavam apenas às crianças (até aos cinco anos e 364 dias) de grupos considerados de risco.

Cartas aos pais

O problema é que agora há pais que estão a receber cartas das autoridades de saúde e que querem saber se a vacina está a ser "racionada" por constrangimentos orçamentais ou por razões epidemiológicas. Como o de uma veterinária (cujo filho tem quase 11 meses) e recebeu a indicação do hospital onde ele nasceu para o inscrever no centro de saúde para ser vacinado. Por isso, olhou com alguma perplexidade para a recente carta da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo que informa que a BCG só será administrada às crianças que pertencem a grupos de risco e que, no caso de o seu filho estar nesta situação, deverá dirigir-se à "unidade de vacinação" com uma declaração médica a atestar isso mesmo. "Estão a aproveitar esta oportunidade para deixar de vacinar? Como é que eu sei onde estão as crianças consideradas de risco?”, pergunta.

Graças Freitas e Luís Varandas sossegam os pais nesta altura em que falta ainda tomar uma decisão final. O que vai estar disponível por enquanto são cerca de 60 mil doses da vacina que foram importadas a um laboratório japonês e têm estado a chegar a Portugal, mas é necessário "dar a vacina primeiro a quem mais precisa", explica Graça Freitas. Reconhecendo que pode haver alguma confusão por estarmos numa fase de transição, a subdirectora-geral da Saúde acrescenta que a maior parte dos países da Europa Ocidental já passou de uma estratégia universal para uma de risco há muitos anos.

“É mais difícil retirar uma vacina do que incluir uma nova”, comenta Luís Varandas, que não vê inconvenientes no fim da vacinação universal. É o que é feito na maior parte dos países da Europa Ocidental há anos e há países que nem vacinam, ressalva também. Mas antecipa alguns problemas, como os que se prendem com a "operacionalização" dos critérios definidos para a vacinação dos grupos de risco. Estes incluem crianças provenientes ou que vão viajar para países com elevada incidência de tuberculose (Angola, Moçambique e Cabo Verde são alguns destes), ou crianças que vivem com portadores de infecção VIH/sida, ou com pessoas com dependência de álcool ou drogas ou ainda em comunidades com elevado risco de tuberculose. Era preciso perceber com maior rigor quais são estes locais, defende.

Os últimos dados indicam que a taxa de incidência de tuberculose em Portugal era de 18,6 casos por 100 mil habitantes em 2015 (1925 novos casos), mas no Porto, Setúbal e Braga a incidência é superior. “A definição de critérios é ainda pouco precisa”, afirma.

Em Lisboa e Porto, exemplifica, há freguesias de alta e baixa incidência, dentro das cidades as fronteiras são difusas, apesar de as bolsas (a tuberculose é sobretudo uma doença da pobreza) estarem identificadas. Mas Luís Varandas acredita que, depois de afinados estes critérios, não haverá problemas.

A vacina BCG protege contra formas graves de tuberculose nos primeiros anos de vida, ainda que, dada após um ano, a sua eficácia seja discutível, recorda.

Resta também saber, se a decisão da DGS for de acabar com a vacinação universal, o que vai acontecer com as crianças que nasceram antes disso. Vão ser repescadas? A vacinação vai ser feita retroactivamente a Maio do ano passado ou não? São perguntas que ficam a aguardar por respostas da DGS.

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