Vírus Zika causa microcefalia, dizem os CDC
Autoridades de saúde norte-americanas confirmam receios sobre defeitos congénitos que têm sido associados ao Zika e querem agora apostar na prevenção da epidemia.
Passadas várias semanas de estudo e de debate, os responsáveis de saúde dos Estados Unidos concluíram que a infecção pelo vírus Zika durante a gravidez causa microcefalia, uma descoberta que os especialistas esperam que mude o foco das atenções para esforços destinados a travar as novas infecções de Zika e faça com que se avance com o financiamento de emergência para a prevenção da epidemia.
“Não há qualquer dúvida de que o Zika causa microcefalia”, assegura Tom Frieden, director dos Centros para o Controlo e a Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC, sigla em inglês), numa conferência de imprensa na última quarta-feira. Os responsáveis da saúde dos Estados Unidos e de outros países têm vindo a dizer que há um acumular de provas científicas que apontam para que este vírus, transmitido por mosquitos como o Aedes aegypti, é a causa provável para o aumento alarmante da microcefalia em regiões com Zika, como no Brasil. Mas até agora ainda não tinha sido declarado que o vírus era, de facto, o responsável.
O anúncio surge numa altura crítica para a administração de Barack Obama, Presidente dos EUA, que tem incitado o Congresso norte-americano, controlado pelo partido Republicano, a aprovar um fundo de emergência de 1900 milhões de dólares (1690 milhões de euros) para a luta contra o vírus, que já está afectar Porto Rico (ilha do arquipélago das Caraíbas que pertence aos Estados Unidos), e que se espera que venha a afectar partes do continente americano com a chegada do tempo mais quente, bom para os mosquitos.
Numa medida provisória, a Casa Branca disse na semana passada que iria redireccionar 589 milhões de dólares (523 milhões de euros) para o país se preparar para a chegada do Zika ao seu território continental. A declaração do Zika como a causa da microcefalia torna mais difícil aos legisladores negarem o pedido de fundos de emergência.
“Acho que isto altera a situação”, disse Lawrence Gostin, um especialista em legislação de saúde da Universidade de Georgetwon, em Washington, que no mês passado testemunhou no Congresso sobre a necessidade de fundos. “É aceitável não estarmos preparados se não soubermos com certeza qual o risco que vem aí, mas é uma vergonha se soubermos em absoluto que vem aí uma epidemia e falharmos na preparação.”
A certeza de que o Zika causa a microcefalia deverá acabar com o debate entre os especialistas de saúde pública sobre o potencial impacto do vírus, e focar a atenção em como se deverá prevenir a infecção, dizem os especialistas. “Tem havido tanto debate. Isto vai acabar com o debate”, disse Michael Osterholm, um especialista em doenças infecciosas da Universidade do Minnesota, EUA.
Em Fevereiro, a Organização Mundial da Saúde declarou o Zika como uma emergência de saúde mundial devido à suspeita da ligação do vírus com milhares de casos no Brasil de microcefalia, um problema congénito em que os bebés nascem com a cabeça pequena e um cérebro subdesenvolvido. A declaração fez com que a comunidade científica fosse para os laboratórios estudar a doença para verificar se existia uma ligação. As novas conclusões dos CDC surgem após todos os critérios científicos terem sido cumpridos para a declaração oficial poder ser feita.
“As informações estão aí. A prova está aí. Os pedaços de informação que temos dão-nos confiança”, diz Sonja Rasmussen, directora do departamento para a informação de saúde pública dos CDC, que lidera um artigo da revista New England Journal of Medicine, onde se explica a prova. Os CDC acreditam que a microcefalia é apenas um dos vários defeitos congénitos graves causados pelo Zika.
No Brasil, as autoridades confirmaram mais de 1100 casos de microcefalia relacionados com a infecção pelo Zika nas mães. E estão a investigar outros 3800 casos suspeitos. As indicações dos CDC para viagens e para a transmissão sexual continuam as mesmas. Mulheres grávidas ou que planeiam ficar grávidas são aconselhadas a evitar viajarem para pelo menos 42 países e territórios onde o Zika se espalhou, e homens que visitaram estas regiões são aconselhados a evitar terem relações sexuais ou então a usarem preservativos com parceiras que estão grávidas ou estão a tentar engravidar.
Na quarta-feira já havia sinais do enfraquecimento da posição dos legisladores republicanos contra o pedido de financiamento da Casa Branca. Tom Cole, republicano da Câmara dos Representantes (uma das duas câmaras do Congresso), disse na quarta-feira que seriam necessários mais fundos para combater o Zika nos Estados Unidos, sinalizando uma mudança em relação à posição insistente de muitos republicanos de que a administração Obama deveria usar fundos existentes para o esforço no combate à ameaça.
“Vai ser necessário dinheiro adicional, não acho que haja nenhuma dúvida sobre isso”, disse Tome Cole aos jornalistas. “Estamos a discutir isso agora.” O senador republicano Marco Rubio, da Florida, afastou-se na semana passada de outros republicanos do Congresso sobre este assunto, anunciando que apoiava o Presidente Barack Obama no financiamento pedido para lutar contra o vírus.
Ainda na quarta-feira, Rubio escreveu aos CDC pedindo para resolverem os testes de diagnóstico do Zika em atraso e darem prioridade às mulheres grávidas, dizendo que viu reportagens na comunicação social de mulheres grávidas que esperaram um mês até que os CDC tivessem prontos os resultados dos testes. Paul Ryan, porta-voz dos republicanos, disse, no entanto, que se fosse necessário mais dinheiro para lutar contra o Zika, os legisladores iriam responder através dos protocolos normais.
Mas as questões científicas sobre a infecção não acabaram aqui. Tom Frieden disse que era preciso perceber qual a percentagem de mulheres grávidas infectadas com o Zika que tinha bebés com problemas. Os investigadores também querem saber quais são todos os problemas de desenvolvimento do cérebro associados à infecção e quais as consequências a longo prazo para estes bebés, disse ainda Sonja Rasmussen.