Sob pressão da opinião pública, Bulgária investiga "caçadores de migrantes"

Grupos nacionalistas que perseguem e capturam refugiados são cada vez mais comuns na Bulgária. Número de pessoas que chegam ao país vindas da Turquia tem diminuído.

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Refugiados sírios em direcção à fronteira entre a Turquia e a Bulgária, em Setembro de 2015 BULENT KILIC/AFP

Depois de os ter incentivado, o Governo de Sofia foi obrigado a mudar de atitude em relação aos "caçadores de migrantes" e decidiu abrir uma investigação sobre os grupos de civis que perseguem e capturam refugiados ao longo da fronteira do Sul da Bulgária com a Turquia.  

Na origem desta mudança de atitude está um vídeo, difundido nas redes sociais, onde se vê um grupo de refugiados deitados no chão, com as mãos amarradas atrás das costas, enquanto vários indivíduos gritam: “Bulgária, não! Voltem para a Turquia!”. A polémica provocada nos media pelas imagens levou à detenção do responsável pela divulgação do vídeo, e as autoridades procuram identificar outros suspeitos, segundo informações da procuradoria búlgara à AFP. 

"É absolutamente inaceitável que pessoas ou organizações que se auto-intitulam como 'destacamentos de defesa' ou 'unidades de cooperação' se apropriem de funções de órgãos do Estado e se envolvam naquilo que os media qualificam como caça aos refugiados”, afirmou Sotir Tsatsarov, procurador-geral búlgaro, citado pelo AFP.

Nos últimos meses, têm aumentado as actividades de “captura” de refugiados por grupos nacionalistas e xenófobos. Estes grupos atacam os refugiados que chegam ao país provenientes da Turquia com o objectivo de roubá-los e detê-los. Depois, chamam a polícia fronteiriça ou forçam os refugiados a regressar à Turquia, explicou na rádio búlgara Focus Valeri Simeonov, líder da Frente Patriótica, partido que apoia a coligação no poder.

Muitos destes indivíduos são aclamados como “heróis”, e entre eles destaca-se Dinko Valev, um wrestler semi-profissional, de 29 anos, que se tornou uma autêntica estrela televisiva, e que foi agora convocado pela polícia para ser interrogado.

No mês passado, Valev admitiu na televisão nacional que deteve um grupo de 12 refugiados com “as próprias mãos”. A sua história chegou aos media internacionais e, numa entrevista à BBC, reforçou a sua conduta xenófoba. “Estes migrantes são repugnantes e más pessoas, devem ficar onde estão”, afirmou.  

A resposta do governo à actuação destes grupos de vigilantes foi, num primeiro momento, de passividade. Mas as críticas ao comportamento do Executivo, liderado pelo primeiro-ministro Boiko Borissov, começaram a avolumar-se. O Governo foi duramente criticado por organizações de defesa dos direitos humanos por ser indiferente às acções destes grupos, como também por parecer incentivar as suas actividades. Borissov chegou a agradecer publicamente a “ajuda” destes grupos. “Qualquer ajuda à polícia, à polícia fronteiriça e ao Estado é bem-vinda”, afirmou. “Qualquer um que ajude merece o nosso agradecimento”.

Depois da divulgação do vídeo, no início da semana, o primeiro-ministro tentou justificar-se, disse que foi mal interpretado. A organização de defesa dos direitos humanos Bulgarian Helsinki Committee apelou à sua detenção. “[Borissov] deve ser preso por convidar abertamente à prática de crimes e por incentivar a violência e a discriminação baseadas na nacionalidade, etnia ou raça”, disse ao Guardian Margarita Ilieva, vice-presidente e directora desta organização não-governamental.

Para agravar ainda mais a situação, as declarações que parecem incentivar as actividades de grupos de vigilantes não foram exclusivas do primeiro-ministro. Também o chefe da polícia fronteiriça, Antonio Angelov, manifestou o seu apoio, na sequência de uma detenção de um grupo de 23 refugiados – 18 homens, três mulheres e duas crianças. “Quero encorajá-los e dizer que reagiram apropriadamente. Este grupo [de refugiados] estava bastante calmo, mas nem sempre é assim”, afirmou Angelov à televisão búlgara Nova TV.

Chegada de refugiados tem diminuido

Desde que vários países dos Balcãs decidiram fechar as suas fronteiras e o acordo da União Europeia com a Turquia começou a ser posto em prática, o número de refugiados que tem chegado à Bulgária diminuiu, revelou o vice-ministro do Interior búlgaro.

“Os números têm baixado como resultado do acordo UE-Turquia, uma vez que a Turquia está a colocar mais pressão [para que os refugiados não atravessem a fronteira]”, disse Philip Gounev, citado pelo Guardian.

Nos primeiros três meses deste ano, a chegada de refugiados ao país diminui 20%. Neste período, foram detectadas 2800 chegadas irregulares à Bulgária, enquanto em igual período do ano passado o número situava-se em 3500. O número de pessoas que atravessam a fronteira e que não são detectadas permanece, contudo, desconhecido, revelou o ministro.

Perante a vaga migratória que tem chegado à Bulgária, sobretudo através da Turquia, o Governo búlgaro tem reagido de uma forma agressiva. No início de Março, enviou cerca de 400 soldados para junto da fronteira com a Grécia e com a Macedónia, e começou a prolongar a barreira que já existe na fronteira terrestre com a Turquia.

Só em 2015, mais de 30 mil pessoas chegaram ao país, e muitas mais poderão ter passado sem serem detectadas. A maioria destas pessoas entra na Bulgária e em outros países dos Balcãs com o objectivo de chegar a outros países europeus, na esperança de encontrar melhores condições de vida, mas as portas continuam a fechar-se.

Texto editado por Ana Gomes Ferreira

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