Quercus desvaloriza propostas da comissão sobre o festival Marés Vivas

Presidente da associação ambientalista critica “paliativos” que “não protegem as aves do estuário” e mantém hipótese de recurso à justiça contra a localização do evento

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O número de aves na reserva vai ser avaliado no Verão, antes, durante e depois do festiival Nelson Garrido

As propostas para mitigação do impacto do festival de música Marés Vivas na avifauna do estuário do Douro mereceram críticas da Quercus. O presidente desta organização que no ano passado se insurgiu contra a nova localização do evento, no Cabedelo de Gaia, considera que as medidas, aprovadas por uma comissão e avalizadas pelo Ministério do Ambiente, não passam de “paliativos” para justificar a opção do município. E mantém em cima da mesa a hipótese de recorrer à justiça para travar o festival.

O departamento jurídico da Quercus ainda está a analisar a possibilidade de interposição de uma providência cautelar para impedir que o festival se realize na nova localização, encostada ao limite sudoeste da Reserva Natural Local do Estuário do Douro (RNLED). A decisão será tomada nos próximos dias e João Branco explicou que o relatório da Comissão de Acompanhamento do Festival Marés Vivas – criada pelo Ministério do Ambiente após solicitação do município – será mais um elemento a ter em conta na decisão a tomar.

Um dia depois de terem sido conhecidas as medidas propostas pela comissão, o líder da Quercus diz que algumas delas são positivas “mas isso não anula o facto de as aves serem incomodadas” pela realização do evento. João Branco critica a postura do Ministério do Ambiente, e a do Instituto de Conservação da Natureza, que, numa resposta a um pedido de esclarecimento da associação ambientalista, explicou que o evento se realiza numa zona urbana e que a reserva não se localiza numa zona da Rede Natura 2000. Em contraponto, o líder associativo nota que a RNLED, o sítio com “maior biodiversidade” da Área Metropolitana do Porto, está na lista de áreas protegidas promovida pelo próprio ICNF e insiste que o estatuto de protecção das aves selvagens não se aplica apenas às Zonas de Protecção Especial, mas a todo o território.

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“Perante a insistência de manter ali o festival, as demonstrações de preocupação dos promotores soam a falso”, critica João Branco, insatisfeito por não se ter colocado em cima da mesa a avaliação de outras opções de localização do festival, como aconteceria num verdadeiro Estudo de Impacte Ambiental. Se estivessem mesmo preocupados tinham procurado outro espaço, insiste, assinalando que medidas como a antecipação dos horários não fazem sentido: “As aves tanto são incomodadas à meia-noite, à uma ou às duas da manhã, isso é absurdo". João Branco desvaloriza também o Censo às aves que vai ser efectuado antes, durante e depois do festival. “É mais uma forma de justificar o injustificável”, atira. 

Este censo, que vai ser realizado pelo Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (Cibio), foi, segundo o próprio, proposto numa das reuniões da comissão por um elemento externo, o investigador Paulo Santos, que é também membro do Fundo para a Protecção dos Animais Selvagens. Perante esta dupla condição, e tendo em conta a sua posição crítica em relação à localização do festival, o biólogo propôs que o estudo fosse levado a cabo por outro investigador do Cibio. “Foi uma forma de assegurar imparcialidade”, explicou ao PÚBLICO este activista que espera que os resultados do estudo sejam tidos em conta no momento de avaliar, em 2017, se o festival deve ou não continuar no Cabedelo.

Enquanto membro do Fapas, Paulo Santos participou na semana passada em reuniões com o município e o promotor do festival, encontros que terminaram sem qualquer avanço, no que às posições dos contestatários diz respeito. Nessas reuniões, explicou, participaram membros do Movimento Cívico em Defesa do Estuário do Douro, criado recentemente para “lutar contra as agressões iminentes ao local, como o festival Marés Vivas e a construção de edifícios em terrenos vizinhos”. Este movimento conta entre os seus fundadores com nomes conhecidos do movimento ambientalista e, em menos de um mês, ultrapassou, na sua página no Facebook, os 1500 seguidores.      

Medidas propostas pela comissão de acompanhamento

A Comissão de Acompanhamento criada pelo Ministério do Ambiente e pela Câmara de Gaia, para minimizar o impacte do Marés Vivas na Reserva Natural Local do Estuário do Douro (RNLED), propôs várias medidas para atingir este objectivo. Eis um resumo das mesmas retirado do relatório produzido por este grupo de trabalho.

  • Monitorização da avifauna. Vão ser realizados censos parcelares antes, durante e após o Festival Marés Vivas, a realizar por uma equipa do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO-UP). De 10 de Junho a 9 de Julho; 10 a 20 de Julho; 21 de Julho a 10 de Agosto.
  • Ruído. O promotor tem de apresentar à comissão de acompanhamento, este mês, os testes de som a realizar antes do festival e que devem ocorrer em horário que não coincida com os períodos de baixa-mar (altura de alimentação das aves); devem ser colocados mecanismos de absorção acústica lateralmente ao palco; O horário de início e fim do festival deve ser antecipado em 30 minutos, em todos os dias do festival e no primeiro dia (quinta-feira), o festival deve terminar mais cedo; Nos dias de festival, deve ser instalado um limitador sonoro ao palco principal e/ou fonte(s) ruidosa(s) mais relevante(s), (…) que garanta que os equipamentos não ultrapassem a potência sonora fixada durante os ensaios de som; Simulação do ruído decorrente dos equipamentos sonoros a instalar no recinto sob forma de mapa de ruído, abrangendo toda a área da RNLED e envolvente próxima; Implementação de um plano de monitorização do ruído proveniente do festival recorrendo a medições acústicas, a realizar pelo Laboratório de Acústica da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia
  • Pressão humana. O promotor deve desenhar o recinto de forma a criar zonas tampão de acesso directo à RNLED, e garantir a interdição de circulação em algumas zonas críticas e mais próximas daquela; Devem ser adoptadas medidas que condicionem os acessos à área da reserva, durante o período de funcionamento do festival; Os diversos meios de transporte disponíveis devem ser integrados no plano de comunicação do festival, por forma a minimizar o uso do veículo automóvel privado durante o evento; Localização dos parques de estacionamento que servirão os utilizadores a uma distância adequada de forma a não provocar congestionamento na proximidade do recinto e em particular da RNLED.
  • Resíduos. Tendo em conta o histórico de produção de resíduos de eventos deste tipo, e o uso excessivo de embalagens pelos sectores de alimentação e bebidas, a comissão propôs também medidas de minimização deste tipo de impactos na zona.  
  • Para o futuro, a comissão propôs a criação de uma cortina verde entre a ciclovia e a reserva com espécies adaptadas (ex. Metrosideros, Tamarix, outros) de modo a garantir para futuro uma barreira visual; a definição de estratégias de divulgação para uma maior sensibilização da importância da valorização ambiental da reserva.
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