Parlamento distingue deputados constituintes com título honorário no dia 14

Antigos parlamentares – incluindo Marcelo - recebem a condecoração no dia 14 e descerram placa na Assembleia da República. CDS elogiou a coragem dos que há 40 anos votaram contra o texto fundamental. Partidos enalteceram o papel histórico dos autores da Constituição.

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Ferro Rodrigues: “Já pouca coisa nos deixa perplexos nas várias análises que o Governo faz" Enric Vives-Rubio

O Parlamento aprovou na quinta-feira por unanimidade a atribuição do título de deputados honorários aos parlamentares que fizeram parte da Assembleia Constituinte que, num ano, elaborou, discutiu e acabou por aprovar a Constituição da República Portuguesa a 2 de Abril de 1976.

A distinção será entregue numa cerimónia no salão nobre da Assembleia no próximo dia 14, ao final da tarde, que incluirá o descerramento de uma placa de homenagem aos deputados constituintes no átrio principal. A única excepção será Marcelo Rebelo de Sousa, que irá recebê-la das mãos de Eduardo Ferro Rodrigues no Palácio de Belém, na manhã desse mesmo dia.

Nas galerias, durante a tarde de quinta-feira, estiveram os antigos deputados António Riço Calado e Luís Kalidás Barreto, que foram aplaudidos pelos actuais parlamentares. Mas na sala do plenário, nas respectivas bancadas, ainda estavam Jerónimo de Sousa, Miranda Calha e Helena Roseta, apontados por alguns deputados como o socialista Pedro Delgado Alves como exemplos.

Antes, ao ler o projecto de deliberação, o presidente da Assembleia da República classificara a aprovação da Constituição como um “momento marcante do processo de consolidação da democracia e de construção de um país mais livre, mais justo e mais fraterno”, e realçou a contribuição da “pluralidade das visões políticas representadas pelos diferentes deputados à Assembleia Constituinte”. Ferro Rodrigues inaugurou assim uma possibilidade prevista no Estatuto dos Deputados mas nunca usada de se poder atribuir a distinção de deputado honorário por “relevantes serviços prestados na defesa da instituição parlamentar”.

O social-democrata Fernando Negrão salientou o “momento histórico de grande tensão” em que os deputados constituintes trabalharam durante 10 meses, divididos entre duas “correntes” – os que achavam que a sua missão exclusiva era elaborar a Constituição e os que defendiam que se devia debater a actualidade. “Felizmente prevaleceu a segunda: a corrente da liberdade, da discussão, do debate nesta AR.” Negrão lembrou ainda que do grupo de 250 constituintes saíram vários futuros presidentes do Parlamento e dois Chefes de Estado – Soares e Marcelo – e escolheu Sophia de Mello Breyner, então deputada, para através dela homenagear todos os parlamentares da época.

Tríptico do 25 de Abril
Pedro Delgado Alves (PS) realçou que a Constituição “está triplamente ligada ao 25 de Abril: no preâmbulo diz-se que a 25 de Abril de 74 o MFA derrubou o regime fascista; a 25 de Abril de 75 realizou-se o acto eleitoral que elegeu a Constituinte, e o texto termina com a data de 25 de Abril de 1976, quando entrou em vigor.” O 25 de Abril está assim “indissociavelmente” ligado ao texto e ao objectivo de “dotar o país de um Estado de direito democrático, com separação de poderes, de direitos fundamentais”. O resultado do trabalho dos deputados de então foi “pleno, completo e representativo do sentir dos portugueses”.

O deputado socialista, que disse ser uma honra poder hoje privar e partilhar corredores com constituintes, disse que se trata de um texto constitucional em que “ainda hoje nos revemos, exigente” e que pertence a todos, “independentemente de terem votaram a favor ou contra”, numa referência ao voto contra de então da bancada democrata-cristã.

Foi precisamente por aí que começou Nuno Magalhães: o líder do grupo parlamentar do CDS reconheceu o esforço e o contributo dos constituintes para a “consolidação da democracia, iniciada no 25 de Abril de 74 mas só consolidada no 25 de Novembro de 75”, e saudou “particularmente a coragem dos 16 homens e mulheres que votaram contra uma Constituição que pretendia o caminho para o socialismo”. Uma ideia sublinhada com os aplausos do resto da bancada, com Magalhães a assumir “por inteiro e orgulhosamente esse passado” e a elogiar os que “souberam estar do lado certo do muro” porque alertaram para o “perigo” de um texto que “preconizava uma sociedade que levou à miséria de milhões de pessoas em vários países”. A Constituição, afirmou o dirigente centrista, “tem vindo a ser melhorada mas que há muito para fazer”.

O comunista António Filipe considerou ser esta uma “justíssima homenagem” aos deputados daquela que foi a primeira Assembleia representativa “verdadeiramente democrática em toda a nossa história” - pela primeira vez foi eleita por sufrágio directo e universal (por 92% dos eleitores). “Legitimadíssima pela vontade popular, elaborou uma obra notável”, que “reflectiu a diversidade de opiniões e posições políticas da sociedade” e que aos 40 anos “está viva, se recomenda, e com a qual os portugueses muito se identificam. Não há melhor homenagem que lembrar isso.” O texto foi o “bilhete de identidade dos princípios, dos valores e da democracia política, económica, social e cultural” preconizados no 25 de Abril.

O bloquista Pedro Filipe Soares aproveitou o momento para fazer a ponte entre o passado e o presente. Na “pena com que escreveram” a Constituição que “como nunca, apontava ao socialismo”, os deputados de então tiveram a “arte” de reflectir a relação de forças existente num país que “reclamava por direitos, por poder estar na liberdade e na democracia, na construção da escola pública, do Estado social, na garantia do direito ao trabalho, ao salário e à habitação. Na garantia de que um país é de e para todos e para todas.”

“A melhor forma de celebrar qualquer Constituição é aplicá-la”, apontou o líder da bancada do Bloco vincando que o país regressa hoje à “estabilidade constitucional depois de quatro anos em que o governo da direita tentou fazer o que sempre sonhara: atacar o documento fundamental da nossa sociedade”. Pedro Filipe Soares afirmou que “foi graças ao texto fundamental que a direita não cortou salários como quis cortar, que não riscou direitos como quis riscar, que não rasgou contratos com quem trabalhou uma vida inteira, como quis rasgar”.

Mas nem tudo é perfeito: “No conteúdo ainda falta muito para que aquele programa de Abril seja plenamente levado por diante.” E por isso o dirigente do BE assumiu o compromisso de que o partido tudo fará “para que seja fielmente cumprida em todos os seus conteúdos, com todos os direitos que ainda faltam cumprir 40 anos depois”.

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