Veneno e antídoto
A nossa luta, venham maltrapilhos ou impecavelmente fardados, é impedir que vençam.
Antes de explodir, Ibrahim deixou uma mensagem num computador: procuravam-no por todo o lado, e se não fizesse nada arriscava-se a passar a vida numa prisão. Por causa das pressas, morreram dezenas de inocentes na Bélgica. Morrer sim, ser preso é que não. Esta lógica partilha-a Breivik, um rapazola loiro de olhos azuis que foi fotografado há uns dias num tribunal norueguês a fazer a saudação nazi. Breivik assassinou em 2011, a tiro e à bomba, 77 pessoas em Oslo e Utoya, ferindo 240. Condenaram-no, por isso, a 21 anos de prisão, o máximo que a lei norueguesa permite. Mas Breivik está descontente (e aqui se percebe a pressa de Ibrahim), queixando-se de um “tratamento desumano” na prisão. É que, diz ele, não tem manteiga suficiente e o café chega à cela já frio. Parece impossível!
Claro que não é só o problema das prisões, também há uns deuses que os mandam matar, seja para purificar a raça, a sociedade ou outra coisa qualquer. Tudo isso é compreensível. Agora serem presos? Francamente! Veja-se o caso de outro rapaz que também foi preso e não gostou nada. Chamava-se Adolfo e, na prisão, desatou a escrever um livro. Tinha 35 anos e, para alívio geral, não passou dos 56. O pior é que, antes, encheu o mundo de dor e sangue. O livro chamou-se Mein Kampf (A Minha Luta) e serviu de guia ao nazismo, que desceria uma cortina de terror sobre o planeta. Foi recentemente reeditado em Portugal, pela segunda vez em democracia. Da primeira, lançou-o Fernando Ribeiro de Mello, em 1976, nas ousadas Edições Afrodite, com comentários acusadores para Hitler (entre eles, o do historiador A.H. de Oliveira Marques). Agora voltou com chancela da Guerra & Paz e um relato dos crimes do nazismo, do terror ao holocausto. Ou seja: veneno e antídoto.
Lido, há paralelos com os fascismos de hoje, “europeus” ou “islâmicos”: a fanfarronice, a fé cega numa causa, a submissão ao chefe, a bandeira do ódio, o destemor da morte. Ora a nossa luta, venham maltrapilhos ou impecavelmente fardados, é impedir que vençam. Outra vez.