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Angela Merkel é indiscutível. O seu partido não

Doze milhões de alemães votam pela primeira vez desde que entraram mais de um milhão de requerentes de asilo no país. Os democratas-cristãos vivem alarmados com o crescimento da direita nacionalista, mas nada podem contra a chanceler.

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A ala conservadora dos democratas-cristãos está a fugir para os nacionalistas, mas o pior para Merkel parece já ter passado. Wolfgang Rattay/Reuters

Há vários meses que se olha para as eleições regionais alemãs deste domingo como um momento possivelmente transformador na triunfante caminhada política de Angela Merkel. Seria possível, perguntava-se nos corredores europeus, que por esta altura a chanceler tivesse perdido o controlo da situação dos refugiados ao ponto de provocar uma derrota desastrosa do seu partido e sucumbir depois à pressão interna? Seria este o princípio do fim da chanceler depois de mais de dez anos no poder?

Este domingo, quando 12 milhões de eleitores em três estados se preparam para eleger os seus parlamentos locais, a liderança de Angela Merkel parece tão indiscutível como antes. A chanceler viu entrarem mais de um milhão de requerentes de asilo no seu país ao longo do último ano, enfrentou apelos insistentes do seu partido para que impusesse limites às chegadas e viu a sua taxa de popularidade próxima de mínimos históricos. Mesmo assim, não arrepiou caminho. “Não há plano B”, sublinhou há uma semana, em plena campanha.

Poucos dias depois de o dizer, as sondagens revelaram Merkel de novo em crescendo: 50% dos alemães dizem-se dispostos a votar nela num hipotético cenário de eleições, quando apenas 46% admitiam fazê-lo em Fevereiro. Só 13% dizem preferir o líder dos social-democratas, Sigmar Gabriel. A chanceler continua a ser por muito a figura política mais poderosa na Alemanha, mesmo que mais de 80% dos eleitores sejam da opinião de que ela perdeu o controlo da sua própria política de asilo. 

Não se pode dizer o mesmo do seu partido. Os cristãos-democratas partem para as eleições deste domingo preparados para um desastre eleitoral em Baden-Württemberg, um dos estados mais ricos e populosos no país, lar de construtores automóveis e antigo domínio indisputado dos conservadores. O partido de Merkel perdeu-o em 2011, quando, mesmo depois de ter sido a força mais votada — 39% —, foi afastado pela primeira vez para a oposição por uma aliança de social-democratas e Verdes, estes últimos com um surpreendente empurrão eleitoral depois do desastre nuclear em Fukushima.

Merkel decidiu que recuperar Württemberg seria uma das grandes prioridades do partido. As sondagens antecipam o oposto: a CDU pode perder nove pontos percentuais em relação às últimas eleições e ser ultrapassada pelos Verdes. A confirmar-se, esta será a primeira vez em 60 anos da política do pós-guerra que os democratas-cristãos perdem o primeiro lugar neste estado. Algo irónico, visto que os Verdes são o partido alemão que mais elogia a política de asilo de Angela Merkel. “É por isso que rezo todos os dias para que a chanceler continue de boa-saúde”, disse Winfried Kretschmann, o carismático líder dos Verdes em Württemberg.

A situação difere entre os três estados que votam este domingo e a hecatombe dos democratas-cristãos em Württemberg é um caso isolado. A CDU governa apenas um destes territórios, a Saxónia, no Leste do país, onde se deve manter no poder, mesmo que para isso tenha que alargar a actual coligação com os social-democratas para integrar também os Verdes. Na Renânia-Palatinado, na fronteira Oeste, as sondagens prevêem um voto semelhante ao de 2011 — em si uma desilusão para o partido de Merkel, que esperava vencer este estado antes do êxodo de refugiados.

Alternativa nacionalista
O que mais tem alarmado os alemães é a visível ascensão do partido nacionalista e anti-imigração Alternativa para a Alemanha (AfD). Desde que em 2013 foi incapaz — por pouco — de atingir o limiar mínimo de 5% exigido para entrar no Bundestag, o partido reinventou-se como uma formação de linha dura e canalizou a insatisfação causada pela vaga de refugiados no país. Ronda agora os 10% a nível nacional, sensivelmente o mesmo que lhe é atribuído nas votações deste domingo nos dois estados ocidentais. O seu sucesso é visivelmente maior na Saxónia, onde, com projecções de 18%, arrisca ultrapassar o SPD e tornar-se a terceira maior força política no estado.

O AfD tem duas encarnações: no Leste, onde o desemprego é mais alto e subsistem ainda sinais de divisão da era do domínio soviético, o partido é frontalmente populista; no Oeste, o seu discurso apela sobretudo a um eleitorado conservador que se sente traído pela “amálgama democrática verde-social-liberal” — palavras da Der Spiegel — em que Merkel parece ter transformado o tradicional partido de centro-direita. “Merkel abandonou a ala direita da CDU, a AfD ocupou esse vazio e foi beneficiada pela crise de refugiados”, escreve a revista alemã.

Apesar do poder de Merkel, os cristãos-democratas podem ver numa derrota expressiva no domingo um sinal de alerta de que as políticas devem mudar de maneira a parar o sangramento de votos para a direita nacionalista antes das eleições federais de Setembro de 2017 — o partido está hoje nos 35% a nível nacional, muito abaixo dos 41% que conseguiu nas últimas eleições. Em todo o caso, fenómenos como o da AfD não são ímpares na história do pós-guerra alemão e muitos antecipam o desaparecimento do partido no momento em que a crise dos refugiados se atenuar — seria o concretizar do “no final seremos recompensados”, de Merkel.

O pior, aliás, parece já ter passado para a chanceler. A Alemanha contou em Fevereiro menos um terço de pedidos de asilo do que os registados no mesmo mês do último ano e isso foi antes de a rota dos Balcãs ter sido encerrada unilateralmente pelos países a Sul — algo a que Merkel se opôs, mas que membros do seu Governo reconhecem lhe será benéfico. Para além disso, Merkel espera ainda os proveitos de um acordo com a Turquia que reduza visivelmente as novas chegadas à Europa — o seu verdadeiro "plano B". Nas palavras do editor do jornal alemão Die Zeit, Josef Joffe: “Dependendo dos resultados [de domingo], Merkel pode ficar enfraquecida a nível doméstico, principalmente no seu próprio partido. Mas toda a gente sabe que não há nenhuma alternativa real para ela na CDU.”

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