Clima, humores e orçamento
Estratégia de Passos é mais para 2017 do que para agora.
Desde as últimas eleições que tem havido alterações substanciais nas práticas políticas adoptadas nestes quase 40 anos de existência de uma Constituição democrática. A mais relevante foi, sem dúvida, a tomada de posse de um Governo minoritário cuja génese e composição não é sustentada pelo partido mais votado. Mas o actual Orçamento, há dois dias aprovado na generalidade, também trouxe uma novidade assinalável: pela primeira vez, um partido, no caso o PSD, além de anunciar o voto contra, decidiu também não apresentar quaisquer propostas de alteração. Mais, o PPD/PSD, como agora se lhe refere mais frequentemente Passos Coelho desde o anúncio da sua recandidatura à liderança, propõe-se levar também uma posição fechada na especialidade: abster-se em cada votação artigo a artigo. Com uma particularidade acrescida. Tal votação não terá em conta nem posições anteriores do partido sobre os temas em apreço, nem posições ideológicas subjacentes aos mesmos. É uma postura inédita, polémica e até criticável em termos democráticos, na medida em que se demite de colocar em cima da mesa medidas alternativas caras ao eleitorado que votou no partido, mas que se enquadra perfeitamente no objectivo estratégico definido pelo PSD. A saber: fazer cair o Governo e provocar eleições antecipadas. Para isso, Passos ensaia duas manobras tácticas, que passam a) pela rejeição total do OE, daí o voto contra; b) pela tentativa de provocar divisões à esquerda através de uma posição neutral sistemática que em determinadas matérias pode levar os socialistas a rejeitar propostas mais radicais que surjam do Bloco e do PCP.
Vai ser muito difícil ao líder do PSD obter grandes resultados nesta primeira abordagem estratégica, como foi patente pelo bom clima que os partidos de esquerda exibiram durante os dois dias de debate. Mas daqui a meses há novo OE. E como se sabe, no tempo e na política o clima é instável e os humores são volúveis.