A UMAR trouxe a público os resultados de um estudo sobre violência psicológica, física e sexual entre jovens. Os resultados são de arrepiar, mas não surpreendem quem já segue a questão. O lado “bom” da questão (atente-se ao sarcasmo, porque não há nenhum lado realmente bom quando 23% dos jovens legitimam o uso de violência sexual) é que “os dados parecem melhorar”, como diz a notícia do "PÚBLICO". Imagino que tenha sido gralha que escapou na edição: os dados não estão melhores, só estão menos maus.
Dia novo, notícia nova. Desta vez, o Instituto de Medicina Legal aponta para um aumento de 44% no número de casos de violência doméstica face a 2014, sendo que “quase metade das pessoas que fez exames periciais tem até 25 anos”, de acordo com o Diário de Notícias.
Como também não deverá espantar ninguém, a esmagadora maioria dos casos são de violência de homens contra mulheres (87%). Da mesma forma que, nos dados da UMAR, os rapazes mostram bem mais propensão para validar violência e coerção a nível sexual, físico e psicológico.
As reacções multiplicam-se, entre o espanto, a consternação, o pedido de maior intervenção por parte de pais e escolas. Que é, no fundo, uma tentativa de estancar uma enxurrada monumental com um penso rápido.
Os pais: serão esses os mesmos que, há não muito tempo atrás, tentaram por tudo impedir a Educação Sexual de entrar nas escolas porque ai-os-preservativos-meu-deus? Serão os que não tiveram, por seu lado, pais que lhes falassem disso ao crescer? Serão aqueles que, ao nível da OCDE, têm dos mais baixos níveis de formação média?
A escola: será essa (assim, no singular, porque claro que uma escola pública sem fundos e com imensa diversidade cultural é igualzinha a um colégio-privado-para-brancos-endinheirados!) aquela que tem professor@s a quem não é dada formação sobre Educação Sexual, e que tem nos seus quadros pessoas que são tão humanas quanto qualquer outra, com as suas idiossincrasias e tiques culturais? Ou será aquela que tem cada vez menos fundos para articular com serviços de psicologia, de apoio social, de parcerias com organizações como a rede ex aequo e a Associação para o Planeamento da Família e suas respectivas acções de formação?
Então e – perdoem-me o chavão generalista – a sociedade? Pois é, com essa já sabemos que não se pode contar: entre as pessoas que acham que a criminalização do assédio de rua é um disparate, até às pessoas que são fãs do Rui Sinel de Cordes, passando por um Presidente da República que fez campanha pelo “Não” no acesso ao aborto e que agora quer referendar a questão da eutanásia, pouco ou nada se salva desta sociedade.
Não se espantem, então, se os jovens (rapazes) (que não são portadores do "futuro mais além", nem arautos da "perdição final" – são pessoas…) tenham aprendido, com tudo o que está à sua volta, que “consentimento”, “autonomia corporal”, “segurança” e “integridade pessoal” são só palavras complicadas e difusas, com pouca aplicação prática (ou, no caso delas, utopias abstractas). Porque é isso que lhes ensinamos constantemente, subtilmente. Porque é isso que praticamos constantemente, subtilmente, entre nós.
Assim sendo, para melhor reflectir a quase indiferença com que estes dados se recebem, mastigam e deitam fora, e também o quotidiano de milhares de pessoas, que se mude o “dia d@s namorad@s” para “dia d@s Espancad@s”. Para me ficar pelo eufemismo, entenda-se…