Projectos sociais que pedem o apoio de emigrantes ainda só têm 35 euros
Em Dezembro foram escolhidos 50 projectos. Até agora, só dois receberam donativos, 25 euros num caso, dez euros noutro. Não há muitos “emigrantes apoiantes”. Mas associações não perdem a esperança.
Variedade não falta. A Associação para a Formação e Desenvolvimento do Montijo quer comprar duas mesas de ping pong, de betão, para as crianças e os jovens que serve. Precisa de 2000 euros. A Associação de Desenvolvimento Social e Cultural dos Cinco Lugares, em Lousã, precisa de uma carrinha usada para o serviço ao domicílio dos idosos que apoia. Custa 2000 euros. E para outro dos seus projectos, chamado “Famílias com Afectos”, diz que faz falta uma casa-de-banho no edifício onde funciona. Mais 2000 euros.
Levar os emigrantes portugueses que vivem no estrangeiro a apoiar projectos sociais nas suas terras de origem era o objectivo do Concurso 50/50, lançado em Novembro pelo anterior Governo. Mas até esta sexta-feira, a julgar pelos dados que constam do site do ACM (http://50por50.pt/), apenas dois dos 50 apresentados mereceram o apoio de algum emigrante.
Há quem queira comprar computadores, dar um retoque na pintura da sede, contratar uma especialista em coaching parental para dar uma palestra, construir casas de madeira para pintassilgos... Para quase tudo é pedido 2000 mil euros, o montante máximo previsto. Mas o dinheiro ainda não chegou. São duas as excepções: a Associação Cultural, Desportiva e Social de Jou, em Murça, propõe-se comprar uma câmara de vídeo, um tripé, um projector e uma tela (1976,74 euros, no total) para actividades com os seus utentes e para recolha de imagens de “testemunhos, histórias de vida, artefactos e tradições” da região. Recebeu, de um emigrante, 25 euros. Ou seja, contabiliza-se no site, 3% da verba necessária.
Também a União de Freguesias de Bustos, Troviscal e Mamarrosa, que orçou em 2000 euros a coordenação de um projecto que visa levar companhia a idosos, recebeu 1% desse montante — 10 euros. O presidente da união das freguesias não está desanimado, e acredita ainda na generosidade dos que saíram daquelas freguesias, “sobretudo nos anos 60 e 70, e hoje estão muito bem, com muito sucesso, lá fora” — “Temos indicação de que alguns nos vão visitar em breve e contamos que depois dessas visitas nos possam apoiar, temos tempo ainda”, afirmou Duarte Novo.
A ideia do 50/50 (que tem como mote “Deixe a sua marca em Portugal”) é que os promotores dos projectos — associações, IPSS, juntas — consigam convencer “Emigrantes Apoiantes” a contribuir com algum dinheiro para a obra que se propõem desenvolver, até 50% do valor da mesma. Se conseguirem, os restantes 50% são suportados pelo Alto Comissariado para as Migrações (ACM), organismo agora tutelado pelo Ministro Adjunto Eduardo Cabrita.
As candidaturas terminaram a 15 de Dezembro. Os 50 projectos escolhidos para poderem constar do site do ACM — onde é possível não só saber o que se propõem fazer as associações, como acompanhar a recolha de fundos e até saber o nome dos emigrantes que apoiam, caso estes o facultem — lá estão, para consulta. Quase todos os promotores pedem o valor máximo permitido 2000 euros. Mas a julgar pelos gráficos que acompanham cada projecto, apenas os dois mencionados conseguiram até agora sensibilizar patrocinadores.
Como vai o VEM?
O calendário prevê que a recolha de fundos e a implementação do projecto decorram até ao fim de Agosto. “Temos feito divulgação nas redes sociais, nomeadamente em páginas no Facebook de emigrantes, mas não me parece que vá ser muito fácil”, diz Liliana Simões, presidente da Associação de Desenvolvimento Social e Cultural dos Cinco Lugares.
“Este concurso não foi muito divulgado e penso que os emigrantes também não estão ainda muito sensibilizados para estas modalidades de financiamento”, prossegue. Garante, ainda assim, que a associação que dirige está habituada a que o dinheiro não abunde, pelo que se não conseguir “emigrantes apoiantes”, não deixará de levar apoio aos idosos, usando os carros pessoais de quem lá trabalha. “Com uma carrinha, contudo, podíamos chegar a mais.”
Contactado pelo PÚBLICO, o gabinete de Eduardo Cabrita diz que "o concurso finalizará de acordo com o previsto, seguindo-se uma fase de avaliação por parte do Governo".
O PÚBLICO pediu também informações sobre outro projecto célebre lançado pelo anterior Executivo, o VEM. Neste caso, tratava-se de um “Concurso de Ideias para pequenos negócios” destinado a apoiar o regresso de emigrantes que quisessem investir em Portugal.
O regulamento do VEM previa que pudesse haver numa primeira fase até 240 projectos de negócio candidatos. Entre Setembro e Outubro de 2015 os proponentes deveriam receber apoio de especialistas, à distância, através de uma plataforma online, para estruturar o seu negócio. Entre Outubro e Novembro deveriam testar o seu plano e, por fim, em Dezembro, deveriam ser seleccionados os melhores planos de negócio, no máximo até 30, que apresentassem "a análise de risco mais favorável de entre todos os candidatos”. Seriam esses finalistas que apresentariam os seus projectos a um júri, já em Janeiro. No fim, até 20 empreendedores receberiam apoio financeiro e operacional do Estado para avançar (e voltar ao país).
Num balanço feito em Setembro o ACM fez saber que recebera 80 candidaturas com origem em 14 países diferentes (do Brasil à China) com capacidade de gerar 387 novos postos de trabalho. O ACM não disse contudo, apesar de vários pedidos do PÚBLICO, quantos empreendedores cumpriram as fases seguintes, remetendo para a tutela.
Já o gabinete do Ministro Adjunto começa por lembrar que "este programa foi criado pelo anterior Governo e encontra-se actualmente em curso". "Nos termos do programa, prevemos que a divulgação de 30 finalistas ocorra a 19 de Janeiro. O programa finalizará de acordo com o previsto, seguindo-se uma fase de avaliação por parte do Governo", acrescentou. No site da inciativa foi já publicada a lista dos candidatos finalistas que agora passam à próxima fase. "Euronexus" é o nome do projecto (sem qualquer descrição) que conseguiu a melhor classificação, seguido do "Bao's Tawainese Burger" em segundo lugar na lista com 35 candidatos e onde se adivinham negócios que vão desde cafés e restaurantes até lavandarias e centros de fitness. O candidato com a pior classificação propôs um projecto com o nome "Apoio às crianças e jovens".