Estudantes estrangeiros em Portugal aumentaram 74% nos últimos cinco anos
Alunos de 200 nacionalidade estudam em Portugal. São cerca de 34 mil. O país é considerado um dos destinos favoritos de quem quer estudar fora. E as instituições estão a apostar nisso.
As mãos de Mfoutou Geloy não param. Há um momento em que se apertam, muito juntas, com força. É quando este congolês de 27 anos conta que soube da notícia da morte da mãe poucas semanas depois de ter chegado ao Porto, em Setembro, para estudar. “O trabalho ressentiu-se nesses dias”, confessa. É um dos raros momentos em que não está a sorrir durante a conversa. Geloy veio para Portugal fazer um ano do seu mestrado em Filosofia e é um dos quase 34 mil estudantes estrangeiros inscritos no ensino superior português. O número quase duplicou nos últimos cinco anos.
Antes das más notícias vindas de Brazzaville, Geloy estava apreensivo. Esta é a primeira experiência que tem fora de África e teve medo de que pudesse ser vítima de racismo. Quatro meses volvidos diz que nunca experimentou nenhuma situação de discriminação. “As pessoas no Porto são muito acolhedoras. Quando tenho dificuldades em expressar-me, falo francês e são muito receptivas a ajudarem-me”, explica.
A “afectividade” que encontrou em Portugal é apontada pelo congolês como uma das explicações para o aumento da procura das universidades e politécnicos nacionais por parte de estudantes internacionais. “Aqui não há medo de estrangeiros, toda a gente é amigável e as pessoas na rua têm um bom nível de inglês”, acrescenta Audri Maulana, indonésio de 24 anos, que também estuda na Universidade do Porto desde Setembro.
Nos últimos anos, o número de estudantes estrangeiros em Portugal não tem parado de crescer. Nos cinco anos lectivos mais recentes para os quais existem dados (2009/10 a 2013/14), o total de alunos não nacionais inscritos no ensino superior passou de 19.425 para quase 34 mil. Um aumento de 74%. “Isto põe-nos à prova”, valoriza Joaquim Ramos de Carvalho, o vice-reitor da Universidade de Coimbra. “Somos obrigados a fazer um esforço muito profundo para melhorarmos sempre.”
Este crescimento no número de estudantes internacionais “é muito importante para toda a gente”, concorda o vice-presidente do Instituto Politécnico do Porto (IPP) para a área da internacionalização, Carlos Ramos.
O fenómeno tem um impacto não só na organização das instituições, como a nível financeiro (ver texto nestas páginas), ainda que a principal mais-valia sublinhada pelo responsável do IPP seja a que diz respeito aos estudantes nacionais. Mesmo que não tenham possibilidades de fazer um período de estudos no estrangeiro, o contacto com colegas de outros países e com as diferenças linguísticas e culturais pode trazer “o mesmo tipo de vantagens que colhem os estudantes Erasmus”, acredita.
Segundo um estudo sobre o impacto do programa de mobilidade europeu, publicado há dois anos, os diplomados com experiência internacional têm mais êxito no mercado de trabalho. A probabilidade de estudantes que fizeram Erasmus sofrerem uma situação de desemprego de longa duração é 50% menor em relação aos que não estudaram no estrangeiro.
200 nacionalidades
O crescimento do número de estudantes estrangeiros inscritos em Portugal tem acontecido sobretudo no sector público, onde o aumento nos últimos cinco anos ascende a 86,6%.
No sector particular, a variação continua a ser positiva, mas é mais residual: há mais 1800 alunos não nacionais entre 2009/10 e 2013/14 nas privadas, totalizando 6693 estrangeiros inscritos.
Estes dados incluem alunos em mobilidade internacional e estudantes que vivem em Portugal, mas que têm nacionalidade estrangeira. Ainda assim, permitem perceber o aumento da capacidade de atracção do ensino português, que se acelerou nos últimos dois anos com a aprovação do Estatuto do Estudantes Internacional.
De acordo com os dados da tutela, são cerca de 200 as nacionalidades que têm pelo menos um representante no ensino superior nacional, com um peso muito particular dos alunos oriundos dos membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Na Europa, os principais mercados de origem de estudantes são Espanha, Itália e a Polónia.
É deste último país que é originária Dorota Stankiwicz, 26 anos. No ano passado, tinha vindo ao Porto duas vezes em passeio e “apaixonou-se” pela cidade. “Decidi que ia fazer tudo o que fosse possível para tentar viver aqui”, conta. Tinha acabado a parte teórica da sua formação universitária em Psicologia e Sociologia, em Varsóvia, e conseguiu um estágio no departamento da Universidade do Porto que acolhe os estudantes estrangeiros. É por isso uma testemunha directa do crescimento do número de alunos de fora naquela instituição.
“Têm uma excelente cooperação internacional, acordos com universidades em todo o mundo e fazem boa publicidade”, elogia.
A explicação para a maior notoriedade internacional do ensino superior em Portugal tem várias dimensões para Carlos Ramos: “É preciso enviar e receber alunos, estar em redes internacionais, mas também é importante a participação em projectos internacionais.”
No caso do IPP, a grande visibilidade no Brasil, que lhe garante um contingente anual de dezenas de alunos daquele país, explica-se pelo facto de serem professores daquele politécnico a liderar investigações feitas em parceria com algumas das principais universidades brasileiras.
Estas estratégias têm permitido a Portugal começar a aparecer nos “radares” internacionais como destino a ter em conta. No final do ano passado, a maior base de dados mundial sobre experiências de estudantes internacionais, a STeXX.eu, colocou o país como o nono destino favorito dos seus mais de 7000 utilizadores, com uma nota média de 8,9 em 10 valores possíveis. As universidades de Aveiro e Coimbra receberam então um certificado de satisfação extraordinária dos alunos, por terem tido classificações próximas da perfeição (9,5) e outras três instituições (ISCTE, IPP e Universidade do Porto) receberam classificação de “excelente”.
Foi a reputação da Universidade do Porto que trouxe Audri Maulana até à cidade. O estudante indonésio estava na Turquia a fazer um mestrado em Ciência Política e Relações Internacionais, quando decidiu fazer um semestre da sua formação num outro país europeu: “A minha universidade é que me recomendou que viesse para aqui. Não conhecia nada da cidade nem da universidade, mas a experiência tem sido óptima.”