Ricardo Ferreira e o voleibol: “Depois de lá estar dentro, é por carreira”

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Quando se pergunta a Ricardo Ferreira se os sacrifícios que faz para manter intacta a carreira de árbitro de voleibol são devidamente compensados, o portuense não tem dúvidas: “Claramente que não, mas uma pessoa depois de lá estar dentro, é por carreira”. Que é como quem diz, por amor à modalidade, ao desporto. Nesse particular, este antigo voleibolista não destoa da maioria dos colegas. E a evolução que tem sentido ajuda-o a continuar a viagem.

Puxemos o filme atrás, até ao momento em que tudo começou, até à era em que o FC Porto também marcava presença no voleibol masculino. Na qualidade de praticante, Ricardo Ferreira fez as primeiras manchetes e blocos no clube, que deixaria cair a modalidade em 1990 para não mais a retomar. A carreira de atleta prosseguiu até aos 18 anos. A partir daí, a perspectiva mudou:  “O meu irmão era árbitro de basquetebol. E decidi tirar o curso de árbitro de voleibol. A ideia era continuar ligado à modalidade, mas também ganhar algum dinheiro. E depois vamos evoluindo, queremos fazer o curso nacional e internacional”, conta ao PÚBLICO.

O salto para pavilhões além-fronteiras deu-se em 2009, muitos anos depois de um jogo de estreia do qual não retém grandes recordações: “Sei apenas que foi em casa do Gueifães”,  atalhou. Mais presente na memória está um encontro de juniores entre Leixões e Castelo da Maia, a contar para o campeonato regional, disputado na época passada: “Foi um jogo em que não me senti confortável. Os jogadores passaram o jogo todo a discutir desde a primeira bola”, responde, quando questionado sobre o momento mais difícil que viveu em campo.

Ricardo não tem grandes razões de queixa quando o tema é pressão externa durante o exercício da função, mas isso não o inibe de apontar uma tendência: “Noto que cada vez mais a falta de cultura desportiva é transversal na formação.  Os pais insultam os árbitros, os dirigentes não respeitam os árbitros. Noto mais esse problema na formação do que nos seniores, até porque, embora eles não sejam profissionais, treinam e jogam como profissionais e têm mais noção das consequências”.

A própria natureza do jogo é uma espécie de “amiga imaginária” do árbitro, com a ausência de contacto físico a facilitar, num certo sentido, as decisões. Uma constatação a que o juiz de 40 anos contrapõe: “É verdade, mas somos a única modalidade que avalia o gesto técnico do atleta”.

De volta à motivação, ao trampolim que impulsiona a escolha de carreira. À simpatia pela modalidade junta-se uma explicação mais material:  “Não escondo que aquilo que ganhamos acaba por nos ajudar em algumas despesas. A mim, por exemplo, ajuda-me a pagar a casa, mas também me tira todos os fins-de-semana. No balanço final, tenho dúvidas de que fique a ganhar”.

Na prática, cada árbitro recebe 45 euros por jogo, valor a que acresce o subsídio de deslocação e alimentação (um valor que ronda os 20 euros para partidas disputadas na zona do Porto). Um cenário que não se altera substancialmente nos compromissos internacionais: 85 euros por dia em viagens que chegam a ocupar três dias, por força das deslocações. Depois, há as condições já contratualizadas no regime de alto rendimento, que prevê, por exemplo, a dispensa de serviço junto da entidade empregadora.

A cumprir a 23.ª época como árbitro, Ricardo Ferreira, que trabalha como comercial fora dos pavilhões, tem assistido de perto à evolução do voleibol e faz um diagnóstico sumário da modalidade: falta divulgação, falta profissionalismo a alguns dirigentes e falta combater o índice de desistência dos atletas. Dos atletas, sim, porque árbitro que é árbitro não atira facilmente a toalha ao chão.

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