“Fraude na saúde é endémica”, reconhece Adalberto Campos Fernandes
Joana Marques Vidal e director da Judiciária pedem mais meios para combater corrupção, mas ministra da Justiça fala em racionalização dos recursos disponíveis
“A fraude na saúde é endémica”, reconheceu esta quarta-feira o ministro que tutela o sector, Adalberto Campos Fernandes, à saída de um encontro sobre corrupção que assinalava o dia mundial dedicado ao problema. O ministro elogiou os esforços feitos pelo seu antecessor, Paulo Macedo, nesta matéria, e assumiu também o combate à corrupção e à fraude como uma das prioridades do Ministério da Saúde nesta legislatura.
“Achamos socialmente intolerável que a saúde possa servir para desvio inapropriado de fundos num quadro de restrições financeiras, em que precisamos de encontrar meios para financiar a inovação terapêutica e de compensar melhor os profissionais”. A contrafacção de medicamentos e a falsificação de receitas são duas questões que vão continuar debaixo de especial atenção. Neste âmbito, Adalberto Campos Fernandes anunciou ainda a monitorização dos subsistemas públicos de saúde, com destaque para a ADSE, pelo número de beneficiários que abrange. Sob vigilância estarão ainda o sistema de gestão de inscritos para cirurgia, a aquisição de dispositivos médicos e equipamentos e ainda a adjudicação de obras.
Questionado sobre o comportamento dos próprios utentes que recorrem a expedientes para ultrapassar grandes listas de espera, Adalberto Campos Fernandes expressou o desejo de que “não sejam obrigados a cometer actos ilícitos para fazerem valer os seus direitos.”
Também presente no encontro, que teve lugar na sede da Polícia Judiciária, em Lisboa, a procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, foi mais longe: “Não é só na saúde que a corrupção é endémica, mas em todas as áreas onde há muito dinheiro público a ser utilizado”. E se a criminalidade económico-financeira “recorre a meios cada vez mais sofisticados”, já quem a investiga padece da falta deles. “É importante reforçar a capacidade da Polícia Judiciária, nomeadamente nas perícias informáticas. Temos de investir muito nessa área”, defendeu a magistrada, secundando um apelo proferido na sessão de abertura do encontro pelo director daquela polícia, Almeida Rodrigues, que pediu mais meios de combate à corrupção depois de falar das carências com que se depara a Judiciária.
Mas em resposta aos apelos dos operadores judiciais a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, preconizou uma “racionalização dos recursos humanos e materiais disponíveis”. Sendo o fenómeno da corrupção transversal, para o combater a Polícia Judiciária deve, no seu entender, articular-se com as inspecções administrativas e com as autoridades de supervisão económica, fiscal, financeira e bancária. A governante começou a sua intervenção a citar Shakespeare – “Corrompidas, as melhores coisas transformam-se nas piores” –, tendo-se recusado a falar aos jornalistas à saída do encontro, no qual esteve também o ministro do Trabalho e da Segurança Social. Vieira da Silva elegeu, como áreas decisivas no combate à corrupção e crimes conexos, a retenção das contribuições sociais dos trabalhadores pelo patronato e a obtenção ilegítima de prestações sociais. E deu o exemplo daqueles que conseguem uma melhoria da sua carreira contributiva através da manipulação dos dados do sistema informático da Segurança Social. “Uma das áreas fundamentais de actuação é a blindagem dos sistemas informáticos”, adiantou o ministro.
BES com projecção internacional
Entretanto, a Transparência Internacional pôs a votação também esta quarta-feira os 15 casos “mais simbólicos da grande corrupção” em todo o mundo, figurando entre eles o do Banco Espírito Santo. A votação pode ser feita até 9 de Fevereiro de 2016 no site www.unmaskthecorrupt.org. Esta organização lançará depois um debate sobre a melhor forma de punir o corrupto mais votado. A empresária angolana Isabel dos Santos também faz parte da lista. Nem Ricardo Salgado nem a filha do presidente de Angola angariaram, porém, muitos votos neste primeiro dia: o banqueiro recolheu apenas 17 votos, contra 23 da empresária, enquanto o mais votado, o senador da República Dominicana Felix Bautista já ia em 1751.