Silviano Santiago vence Prémio Oceanos de Literatura em Língua Portuguesa

O júri considerou que o seu Mil Rosas Roubadas é um romance de "profunda dramaticidade, elaboração autobiográfica e biográfica, no limite entre ensaio e ficção".

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O autor premiado no Brasil Sergio Castro

O escritor brasileiro Silviano Santiago venceu o Oceanos - Prémio de Literatura em Língua Portuguesa com o romance Mil Rosas Roubadas, anunciou na quarta-feira de madrugada a organização em São Paulo, Brasil.

Silviano Santiago, 79 anos, também crítico e professor de literatura brasileira, tem o nome ligado a mais de 30 livros, incluindo as suas obras de poesia, ensaios, contos e romances, além de participações em antologias literárias e colectâneas que organizou. O vencedor do prémio Oceanos, no valor de 100 mil reais (28.600 mil euros), também é crítico de literatura e cultura em jornais, realiza conferências e faz trabalhos de curadoria.

Formado em Letras Neolatinas pela Universidade Federal de Minas Gerais, fez um doutoramento em Letras na Université Paris-Sorbonne, em 1968, e foi professor visitante e investigador em universidades dos Estados Unidos, Canadá e Brasil.

O livro Mil Rosas Roubadas, vencedor do Prémio Oceanos, parte do encontro entre dois adolescentes em Belo Horizonte, no estado de Minas Gerais, em 1952, à espera de um eléctrico. Sessenta anos depois, um deles, o produtor cultural Zeca, agoniza num hospital, enquanto o outro, um professor aposentado de História, descreve a trajectória do "amigo inseparável" para se lembrar da sua própria vida.

O livro foi publicado no Brasil pela Companhia das Letras e mistura ficção com biografia baseando-se numa personagem real, o produtor musical Ezequiel Neves (1935-2010), que ficou conhecido por ter descoberto o cantor Cazuza (1958-1990) da banda Barão Vermelho, e era muito amigo do escritor. O júri considerou que se trata de um romance de "profunda dramaticidade, elaboração autobiográfica e biográfica, no limite entre ensaio e ficção" e que "revela uma resolução narrativa inovadora na obra do autor."

O Oceanos - Prémio de Literatura em Língua Portuguesa, que foi entregue pela primeira vez, em São Paulo, numa cerimónia apresentada pelo escritor Lourenço Mutarelli e pela professora Lucimar Mutarelli, é organizado pelo Instituto Itaú Cultural e substituiu o antigo Prémio Portugal Telecom de Literatura

A segunda classificada do prémio Oceanos, Elvira Vigna,com o livro Por Escrito, também da Companhia das Letras, é jornalista e escritora. O júri considerou que a autora apresenta "um grande trabalho de ousadia estilística, além de enfrentar temas difíceis com uma agressividade inédita no género"Nascida em 1947, tem dez romances e cerca de 20 contos e textos curtos publicados – entre os quais o romance Nada a Dizer que chegou a Portugal em 2013

Alberto Mussa, 51 anos, que ficou em terceiro lugar com o livro A Primeira História do Mundo (editado no Brasil pela Record) é romancista, contista e tradutor. Realiza estudos sobre diversas culturas e transporta para os seus livros mitologias africanas, árabes e indígenas.Este seu livro conta a história do Rio de Janeiro através de um crime : "a obra reconta o primeiro assassinato da cidade do RJ ocorrido em 1567. Para isso, o autor combina, de forma habilidosa, romance, ensaio e antropologia, convocando a mitologia a iluminar os pontos obscuros da história."

O poeta Glauco Mattoso, 61 anos, que ficou em quarto lugar com o livro Saccola de Feira (editora NVersos), é também contista, cronista, ensaísta e tradutor. O seu nome de nascimento é Pedro José Ferreira da Silva e a alcunha artística alude ao glaucoma, doença degenerativa que lhe tirou a visão. Este é um livro "no qual o passado e o presente da língua se encontram, com a forma fixa dos sonetos sendo renovada pela veia erótica", afirma o júri.

Das mais de 600 obras inscritas, para a edição deste ano, apenas oito eram de autores não brasileiros. Entre as 14 finalistas, havia apenas uma, A Desumanização, do português Valter Hugo Mãe. Por isso o  Prémio Oceanos de literatura quer alargar o seu universo a livros publicados em língua portuguesa, em diferentes países lusófonos, além do Brasil, e admite essa possibilidade já para a edição de 2016.

"O desejo, e o que estamos a trabalhar, é dar cada vez mais acesso a autores e editoras do mundo lusófono, fora do Brasil. A grande intenção é que seja [incluído no concurso] qualquer livro de língua portuguesa", o que vai aumentar a complexidade do processo "e estamos a trabalhar nisso", disse à agência Lusa o responsável pelo Núcleo de Artes Visuais e Literatura do Itaú Cultural, Claudiney Ferreira.

Segundo Ferreira, o alargamento da inscrição a livros publicados fora do Brasil, ajudaria a divulgar a literatura de língua portuguesa no espaço da lusofonia. "Percebemos que esse conhecimento não é tão grande. Queremos ter a possibilidade de o Brasil conhecer mais a literatura africana, e vice-versa", disse.

A curadora gestora do prémio Selma Caetano, por seu lado, realçou que a mudança ainda está em estudo, e que pode ocorrer apenas em edições após 2016. Segundo a curadora, a crise económica brasileira dificultou as vendas das editoras e, com isso, as publicações no país de literatura dos outros países lusófonos, incluindo Portugal.

"Com a crise, as editoras diminuíram consideravelmente o número de títulos, e tiraram justamente livros de outros países de língua portuguesa, que não têm uma venda tão grande quanto a literatura americana, por exemplo. A literatura lusófona está muito mal de intercâmbio, considerando a alta qualidade que tem", disse a curadora à Lusa.