Unidos pelo luto, Hollande e Putin defendem “grande coligação” na Síria
França e Rússia insistem na urgência de um combate unido ao Estado Islâmico. Putin “pronto a cooperar”.
Os Presidentes da França e da Rússia coincidiram na necessidade de se unirem esforços no combate ao autoproclamado Estado Islâmico na Síria. A coordenação dos bombardeamentos entre os dois países deverá continuar.
À partida para a reunião de Moscovo, tanto François Hollande como Vladimir Putin eram líderes de nações enlutadas pela violência jihadista. “Os actos de terror forçam-nos a unirmos os nossos esforços no combate ao terrorismo”, disse o Presidente russo, antes de se reunir com o homólogo francês. Putin disse estar “pronto a cooperar” para tornar possível essa aliança, sem que tenham sido dados mais pormenores.
A necessidade de uma “grande coligação” internacional na Síria foi evidenciada por Hollande. “O nosso inimigo é o Daesh [acrónimo árabe que designa Estado Islâmico], que tem território, um exército e recursos, portanto temos que criar esta grande coligação para derrotar estes terroristas”, afirmou.
A dinâmica de reaproximação entre os dois países começou a desenhar-se logo após os atentados de 13 de Novembro em Paris — em que morreram 130 pessoas durante vários ataques coordenados e reivindicados pelo Estado Islâmico. Dias depois, Putin reconhecia que o avião da Metrojet que se despenhou no Monte Sinai (Egipto) com 224 pessoas a bordo foi abatido pelo mesmo grupo terrorista.
A França passa então a ser designada como “aliada” pelo Ministério da Defesa russo e são coordenados bombardeamentos na Síria entre os dois países — algo inédito desde que Moscovo iniciou a sua intervenção, no final de Setembro. As declarações dos dois líderes indiciam que esta cooperação será para continuar.
Ao longo do périplo diplomático da última semana, Hollande foi ganhando alguns apoios dos parceiros ocidentais, especialmente na Europa. Londres prometeu estender os bombardeamentos à Síria — a Câmara dos Comuns vai votar essa matéria na próxima semana. A Itália reiterou que não vai integrar os bombardeamentos, mas disponibilizou apoios indirectos. A fragata belga Leopoldo I faz parte da escolta do porta-aviões francês Charles de Gaulle, mobilizado logo após os atentados de Paris para apoiar os bombardeamentos. A Dinamarca manifestou desejo de participar nos raides aéreos na Síria, mas só terá os seus caças F-16 operacionais após o Verão, segundo o Governo. Mas foi de Berlim que veio a manifestação mais significativa. Angela Merkel anunciou o envio de uma força militar para o Mali, libertando, desta forma, efectivos franceses para o Médio Oriente, e mostrou-se disponível para ir ainda mais longe no futuro. Apenas a Espanha desafiou este consenso europeu, com o chefe de Governo, Mariano Rajoy, — que terá eleições em menos de um mês — a recusar comprometer-se com qualquer apoio militar.
Porém, o grande objectivo estratégico a que Hollande se propunha – alargando à Rússia a coligação internacional de combate ao Estado Islâmico liderada pelos EUA — não foi alcançado. No início da semana, o Presidente Barack Obama já tinha sido bastante explícito ao indicar claramente que a Rússia se mantinha à parte da actual aliança.
Para que uma coligação deste âmbito se efective é necessário vencer vários obstáculos que aproximem os dois lados. Em termos operacionais, a Rússia é desde logo criticada pelos Estados Unidos e aliados por se ter concentrado, num primeiro momento, em bombardear as posições dos grupos da oposição a Bashar Al-Assad. Publicamente, a linha oficial do Kremlin não faz distinção entre estes grupos e o Estado Islâmico, privilegiando geralmente fórmulas mais difusas como “grupos jihadistas”.
No campo político, as diferenças residem no papel de Assad numa futura solução pós-conflito na Síria. Os aliados ocidentais querem o Presidente sírio afastado desde logo, enquanto Moscovo — que tem em Assad um aliado forte na região — não quer predeterminar o seu futuro.