Grigory Sokolov vai finalmente tocar em casa na Sala Suggia
A Rússia vai ser o país-tema da Casa da Música do próximo ano. Programação inclui integrais das sinfonias de Prokofiev e dos concertos para piano e orquestra de Rachmaninoff.
Bem se poderá dizer que, em 2016, na sua visita anual à Sala Suggia, o pianista Grigory Sokolov vai finalmente tocar “em casa” (8 de Março; programa a anunciar) – é que a Rússia, sua terra natal, vai ser o país-tema na programação da Casa da Música (CdM) do próximo ano.
“Mais cedo ou mais tarde, haveria de chegar o ano da Rússia, que é indiscutivelmente uma grande potência da música”, diz António Jorge Pacheco, director artístico da CdM, ao anunciar o país em foco no próximo ano, que sucederá à Alemanha.
Não havendo nenhum pretexto – centenário ou outra efeméride – para a escolha daquele país para 2016, Pacheco realça, contudo, que “a Rússia está na ordem do dia, até por razões políticas e geoestratégicas”. “E entendo que uma instituição cultural não pode nem deve estar desligada daquilo que são os fenómenos socioculturais e a própria sociedade contemporânea”, acrescenta o responsável pela programação.
Nas três dezenas de concertos – o país-tema costuma assegurar cerca de 30% da programação global da CdM – que farão o calendário dedicado à Rússia, os destaques irão para a apresentação de "duas monumentais integrais”: as sete sinfonias de Sergei Prokofiev e os quatro Concertos para piano e orquestra de Sergei Rachmaninoff, além de uma retrospectiva de Alfred Schnittke, “o compositor mais importante da segunda metade do século XX”, diz o director artístico.
Berezovski, Glinka, Glazunov, Rimski-Korsakoff, Mussorgski, Stravinski ou Sofia Gubaidulina serão outros compositores revisitados, num panorama que recuará ao século XVI, aos primórdios da música vocal de tradição ortodoxa, e virá até aos nossos dias – uma actualidade representada, por exemplo, pela vinda ao Porto do “multifacetado e inquieto” Gabriel Prokofiev, neto do autor de Pedro e o Lobo, produtor, músico e compositor, que fará na CdM a estreia de um novo Concerto para turntables e orquestra com a Sinfónica do Porto e o DJ Switch (29 de Julho).
Este retrato da Rússia musical vai estar, de resto, espelhado no programa dos três dias de abertura oficial da programação (15-17 de Janeiro) com a Sinfónica, o Coro e o Remix a interpretarem desde o clássico A Sagração da Primavera, de Stravinski, onde é patente, nota António Jorge Pacheco, “o paganismo que sempre esteve presenta na cultura russa”, até às Vésperas de Rachmaninoff, que denota a influência da música vocal ortodoxa.
Homenagem a Manuel Dias da Fonseca
A temporada de 2016 da CdM vai ser, por outro lado, dedicada Manuel Dias da Fonseca (1923-2015), numa homenagem a “um dos grandes melómanos do país” – justifica Pacheco –, e que terá o seu momento forte no concerto Portugal XXI (23 de Janeiro), em que a Orquestra Sinfónica vai interpretar obras de quatro compositores portugueses – Vasco Mendonça, Luís Tinoco, António Chagas Rosa e Pedro Amaral – a quem Dias da Fonseca fez várias encomendas quando era responsável pelo sector da música na Câmara Municipal de Matosinhos.
Na apresentação da programação feita ao final da tarde desta quarta-feira, foram também revelados os nomes dos artistas e compositores em residência na CdM em 2016. O artista em residência será o suíço Heinz Holliger, compositor, maestro e oboísta visto como o maior virtuoso actual neste instrumento, como o público da Sala Suggia pôde constatar na sua estreia na Casa, no passado dia 13, no concerto Oferenda a Bach (À Volta do Barroco).
O compositor em residência vai ser o greco-francês Georges Aperghis, figura marcante na reinvenção do teatro musical, e que mantém com a CdM uma “relação de cumplicidade já antiga”, diz António Jorge Pacheco.
O já citado Gabriel Prokofiev, “que faz, de uma forma brilhante, a ponte entre a música erudita e o hip hop”, vai ser o artista em associação. Virá também da Rússia a artista em associação com o festival À Volta do Barroco, a jovem violinista Alina Ibragimova, uma revelação dos últimos anos, tanto no exercício do violino barroco como do moderno.
Finalmente, o jovem compositor em residência, sempre um português – “uma discriminação positiva intencional”, realça o director artístico –, será no próximo ano António Sá-Dantas, licenciado em Composição pela Universidade de Graz, na Áustria.
Em 2016, o calendário da CdM vai manter os ciclos tradicionais mensais. Entre eles, o Música & Revolução (23 de Abril a 1 de Maio) vai ser também dedicado ao património russo. Sob o título Surrealismo socialista – “um trocadilho e quase uma provocação à expressão realismo socialista”, diz Pacheco –, o programa vai dar a ouvir compositores que foram perseguidos pelo regime soviético, nomeadamente aqueles que foram vítimas directas de Estaline, na sequência dos “autos-de-fé” subsequentes ao 1º. Congresso da União dos Compositores, em 1948 – casos de Chostakovitch, Miaskovski e Prokofiev –; e os chamados “Sete de Khrennikov”, perseguidos por Brejnev no 6º. Congresso do PCUS, em 1979.
No ciclo Transgressões (13-25 de Setembro), o Remix Ensemble vai produzir aquele que António Jorge Pacheco apresenta como “o grande projecto cénico do ano”, A Viagem de Inverno, de Schubert, na versão de Hans Zender, com o tenor Christoph Prégardien e encenação de Nuno Carinhas, director artístico do Teatro Nacional São João.
Referência ainda para a temporada do jazz, que ao longo do ano e até ao festival Outono em Jazz (Outubro) trará ao Porto figuras como Jack DeJohnette, Brandford Marsalis, Ramsey Lewis ou Billy Cobham.