“A Europa-fortaleza não funciona”

“Espero que a opinião pública não fique preparada pelos piores motivos que é termos um atentado nas nossas áreas de interesse e na proximidade”, disse o almirante Melo Gomes, a propósito de uma eventual intervenção militar da Europa.

Foto
AFP

O general Luís Araújo tem, pelo menos, uma certeza sobre o que não deve ser uma resposta aos atentados em Paris: “Fechar fronteiras não resolve problema absolutamente nenhum.” Ou seja, “a Europa-fortaleza não funciona.”

Qual deve então ser a resposta da Europa aos atentados em Paris? E de Portugal? Deve ou não participar numa eventual intervenção militar? Para o almirante Melo Gomes, a Europa não só tem “capacidade para dar resposta, desde que haja vontade política”, como “é essencial que se tomem medidas para além das palavras”. A opinião pública está preparada para as consequências de uma intervenção? “Espero que não fique preparada pelos piores motivos que é termos um atentado nas nossas áreas de interesse e na proximidade”, disse à margem da conferência “Portugal e a Defesa Nacional”, organizada no âmbito da candidatura presidencial de Sampaio da Nóvoa.

Estas foram algumas das questões às quais o almirante Melo Gomes e o general Luís Araújo responderam aos jornalistas à margem daquela sessão, que decorreu no Museu do Oriente, em Lisboa. Para o almirante Melo Gomes, após o que aconteceu em França, “as declarações iniciais são sempre muito assertivas, afirmativas”, mas depois, com o tempo, “as coisas vão-se esbatendo”. Ainda assim, defende que não se pode ficar indiferente “à barbárie que aconteceu em Paris”, que “põe em perigo a democracia e os valores em que se funda a Europa”. O almirante não respondeu, porém, à questão sobre se Portugal devia ou não participar numa eventual intervenção.

Já o general Luís Araújo frisa que “a situação” é “extremamente complexa”. As perguntas que faz são estas: “Os proventos financeiros do chamado Estado Islâmico vêm de onde? Petróleo. Quem lhes compra petróleo?” “Quem lhes vende armas?” Luís Araújo lamenta que “o deus do nosso tempo” seja “o dinheiro” e que hoje não se fale “em valores, princípios, referências”. Por isso, está descrente do valor da solidariedade e lamenta mesmo que “daqui por uns tempos” acabe por “acontecer outra coisa”.

A solução terá de passar pelas grandes potências – Estados Unidos, Rússia, China, diz. Porque, acrescenta, apesar de a Europa ter meios, “estão completamente dispersos” - isto é, “não existe uma cabeça em termos de comando e controlo”.

O general alerta para os perigos de uma intervenção na Síria: “Aquilo é um ninho de vespas e morrerá muita gente.” Luís Araújo tem também uma dúvida: “Não sei se as opiniões públicas estarão preparadas.” Ainda assim, afirma que a resposta na Síria “só pode ser militar”. Embora não seja um lamento, o general considera que os europeus são “muito soft”: “É a nossa maneira de ser, não tem mal, é assim, é um facto.” Com isto quer dizer que “somos muito reactivos, não somos preventivos”.

Na parte aberta às questões do público, o coronel Vasco Loureço fez uma intervenção, mas sobre a situação política “complicada” que se vive em Portugal: “Pode obrigar-nos, a nós, Forças Armadas, a ter de tomar uma decisão”, avisou. Referia-se ao “conflito entre dois órgãos de soberania”, o Presidente da República (PR) e a Assembleia da República (AR). “O PR está a ir numa deriva de golpe de Estado, de golpe institucional. Não cumprir a Constituição pode levá-lo a um conflito muito grande com outro órgão de soberania, a AR.”

Por isso, questionou: “Qual é o papel das Forças Armadas nesta situação? Temos de pensar bem o que fazer se efectivamente o actual PR insistir numa deriva que pode ser extraordinariamente perigosa”, afirmou. Pouco depois, haveria de esclarecer que não está a fazer nenhum apelo a um golpe militar e que o apelo é ao PR para “não promover o confronto com a AR”.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários