Nova acção de Pyotr Pavlensky na Rússia poderá dar ao artista cinco anos de prisão
Pavlensky deverá ser julgado depois de esta segunda-feira ter incendiado em Moscovo a porta da FSB, a agência de informação e segurança que sucedeu ao KGB.
A sede da agência federal de segurança e informação Russa – a FSB, sucessora do antigo KGB – fica no centro de Moscovo. À primeira hora da madrugada desta segunda-feira o performer e activista político Pyotr Pavlensky regou com petróleo a porta principal deste edifício-símbolo da era soviética, começando um pequeno incêndio.
Num vídeo que o próprio artista pôs a circular e que tem sido reproduzido por meios de comunicação internacionais, Pavlensky, de 31 anos, surge em pé com o bidão de petróleo na mão enquanto as chamas crescem ao fundo, por detrás das suas costas.
Pavlensky foi preso pouco depois por forças de segurança que, entretanto, o interrogaram e abriram um processo legal.
Segundo anunciado por Pavlensky, a intervenção, pela qual poderá vir a enfrentar uma pena de prisão de até cinco anos, intitula-se A Ameaça. Visou chamar atenção para as tácticas de terror usadas pela FSB, que entre 1998 e 1999 foi dirigida e restruturada pelo agora presidente Vladimir Putin, um veterano do KGB.
O video da acção intitula-se A Porta em Chamas de Lubyanka, usando o nome por que normalmente é conhecido o edifício neobarroco da FSB, que ocupa todo um quarteirão e foi usado pelo KGB para prisões, interrogatórios e assassinatos políticos. Uma lógica operativa que Pavlensky diz não ser suficientemente distante da hoje posta em prática pela FSB: “A FSB age usando métodos de infinito terror e exerce o seu poder sobre 146 milhões de pessoas”, fez saber o artista citado pelo Guardian.
A mensagem espalhada por Pavlensky prossegue: “O medo torna as pessoas numa massa pegajosa de corpos descoordenados”, escreveu citado pela Reuters. “A ameaça de represálias inevitáveis pesa sobre todos os que podem ser localizados através de dispositivos, através de escutas às suas conversas ou, nas fronteiras, através do controle de passaportes.”
Tal como em anteriores intervenções, trata-se de abrir buracos na máquina de propaganda do Kremlin, diz Pavlensky – o mesmo que em 2012 coseu os lábios em protesto contra a prisão das Pussy Riot e que, no ano seguinte, se envolveu em arame farpado para expressar a sua oposição em relação a uma série de leis russas que considerou “regressivas”.
Esta última acção contra a falta de liberdade de expressão e pensamentos dos cidadãos russos foi em 2013. Ainda nesse ano, em Novembro, Pavlensky pregou o seu escroto ao chão empedrado da Praça Vermelha de Moscovo no que descreveu como uma metáfora sobre a apatia política da sociedade russa. Mas a mais fisicamente extrema das acções de Pavlensky decorreu em Outubro do ano passado, quando o performer cortou uma parte da sua própria orelha com uma grande faca de cozinha. A acção decorreu com o artista nu sentado no telhado do conhecido centro psiquiátrico público de Serbsky, em protesto contra o internamento de activistas e dissidentes em clínicas e hospitais para doentes mentais.
Detido nessa altura, Pavlensky passou por uma avaliação psiquiátrica, recorda a Reusters. Foi declarado são. Isto depois de meses antes ter sido também detido por vandalismo quando queimou pneus sobre uma ponte, em São Petersburgo, como gesto de apoio aos protestos Euromaidan, pela integração europeista da Ucrânia e contra a corrupção, o abuso de poder governamental e a falta de respeito pelos direitos humanos no país.
Foi durante essa prisão que Pavlensky ganhou um dos seus mais inesperados apoiantes: em quatro meses de contacto com a mensagem política do artista, Pavel Yasman, o jovem investigador encarregado de o interrogar, deixou o seu emprego e começou a preparar-se para se tornar advogado – acabou por testemunhar a favor de Pavlensky, recorda a Artnet num artigo deste Verão.
“Pavlensky é uma pessoa muito forte. É extraordinário acreditar tão ferventemente no que se faz”, disse Yasman em Julho ao Moscow Times .
A Artnet explica que as sessões de interrogatório entre Pavlensky e Yasman decorreram entre Março e Junho de 2014 e incluem debates constantes sobre as fronteiras entre arte, activismo e vandalismo. Nas transcrições, diz ainda esta publicação, é possível identificar a transformação pessoal sofrida por Yasman.
“Portanto, concorda que você é só uma ferramenta, que Governo faz das pessoas ferramentas”, terá a dada altura perguntado Pavlensky. “Concordo", terá respondido Yasman: O mesmo Yasman que em Julho explicou ao Moscow Times há já algum tempo estar a ponderar uma mudança de vida quando conheceu o artista: “Acho que o trabalho de Pavlensky tornou muitas pessoas mais críticas, mudando o seu olhar sobre o mundo.”
Ao mesmo jornal, Pavlensky explicou que muitas pessoas lhe escrevem cartas de agradecimento e apoio: “Muitas vezes pedem desculpa por no início pensarem que sou louco ou que o que faço não tem sentido.”
Segundo a advogada do artista, desta vez Pavlensky foi interrogado no próprio edifício da FSB sobre o qual executou a sua acção. Citada pelo Guardian, Olga Chavdar explicou que foi insistentemente perguntado a Pavlensky se tinha intenção de matar alguém. Segundo Chavdar, a resposta de Pavlensky foi sempre: “O que estão a dizer? Não procurava a morte de ninguém.”
Ainda citada pelo Guardian, Chavdar explicou que não é certo qual a acusação a recair sobre o artista e activista, se vandalismo (até três anos de prisão em caso de condenação) se fogo posto (até cinco anos). “Acho que será um caso criminal, tudo apontada nesse sentido. Mas é difícil dizer sob que acusão: tudo pode acontecer no nosso país”, disse a advogada.
Segundo a Reuters, na tarde desta segunda-feira a porta da FSB estava entaipada com placas de metal e as opiniões na Rússia dividiam-se entre detractores da acção e apoiantes firmes, que recorreram às redes sociais para expressar apoio a Pavlensky.