Cassini atravessa plumas de Encelado para saber se esconde um oceano habitável

A sonda da NASA vai atravessar os jactos de água a 50 quilómetros do Pólo Sul da lua de Saturno. É mais uma experiência na longa procura de vida no sistema solar.

As plumas no Pólo Sul de Saturno
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As plumas no Pólo Sul de Encelado JPL/NASA
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A lua está coberta com uma crosta de gelo JPL/NASA

A missão já está a ser planeada há cinco anos. A sonda Cassini, da NASA, vai atravessar às 15h22 (hora de Lisboa) desta quarta-feira as plumas de material que se libertam do Pólo Sul de Encelado, a sexta maior lua de Saturno. Desta forma, a sonda poderá analisar directamente o material que vem de um oceano interior situado por baixo da crosta de gelo e, com essa informação, avaliar se aquele oceano longínquo tem condições de habitabilidade.

Este é o segundo de três voos finais a Encelado que a Cassini vai fazer, programados pelos cientistas do Laboratório de Propulsão a Jacto da NASA, na Califórnia, Estados Unidos. O primeiro ocorreu a 14 de Outubro, quando a sonda passou a 1839 quilómetros de altura do Pólo Norte para obter imagens daquela região. A última será a 19 de Dezembro: nessa altura o aparelho ficará a 4999 quilómetros da superfície e vai medir o calor que se liberta do núcleo de Encelado.

Nesta quinta-feira, o voo é muito mais rasante. A sonda ficará apenas a 49 quilómetros de distância da superfície daquele astro – uma crosta de gelo com cerca de 30 quilómetros de grossura. Não será o voo mais próximo que a sonda já fez a Encelado, mas é o mais próximo dos jactos no Pólo Sul.

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O oceano de Encelado estende-se por toda a lua por baixo da crosta de gelo NASA

“Este voo não pode detectar vida, mas vai dar informação sobre a habitabilidade do oceano”, disse na segunda-feira Curt Niebur, um dos cientistas responsáveis pela missão, que falou numa conferência de imprensa da NASA. Ou seja, vai dar informações sobre o calor no interior da lua e as moléculas orgânicas que lá existem, ingredientes básicos para a vida na Terra.

A Cassini chegou ao sistema de Saturno em 2004. Ano após ano, as análises feitas pelos seus instrumentos e as imagens que foi enviando para a Terra sobre Encelado revelaram que este é um dos lugares mais interessantes para a procura de vida no sistema solar.

Em 2005, a sonda descobriu os jactos de água no Pólo Sul daquela Lua, vindos de fendas que parecem listras de tigres vistas do espaço, e mostrando a existência de uma fonte de calor e actividade geológica. Em 2008, a sonda fez o primeiro voo junto à superfície onde analisou mais de perto aqueles géiseres que emitem gelo, gases e outras partículas.

Mais recentemente, em 2014 e 2015, após análises gravíticas da lua, chegou-se primeiro à conclusão de que havia um oceano interior, por baixo da camada de gelo, na região do Pólo Sul, e depois que este oceano – com dez quilómetros de profundidade – afinal se estendia por toda a lua. Os cientistas pensam que o calor capaz de gerar água líquida e géiseres provém da tensão gravítica entre Encelado e Saturno.

Três objectivos
Agora, o voo da Cassini terá três objectivos concretos. Por um lado, vai procurar por hidrogénio molecular (dois átomos de hidrogénio ligados que formam uma molécula). Nalgumas fontes hidrotermais na Terra, este hidrogénio é produzido em grandes concentrações. Além disso, é usado como fonte de energia por algumas formas de vida que vivem naquelas fontes. A sonda vai usar um espectrómetro de massa para detectar o hidrogénio molecular: quanto maior for a sua concentração, mais actividade hidrotermal existirá no oceano de Encelado, defendem os cientistas.

Por outro lado, o Detector de Poeira Cósmica da sonda irá procurar pequenas moléculas orgânicas, como metano ou etano. Esta é uma limitação da sonda, que não pode detectar grandes moléculas orgânicas – como o ADN, que, se encontrado, demonstra a presença de vida. Ainda assim, esta análise dará uma ideia mais completa sobre a constituição da sopa de moléculas que preenche o oceano e pode alimentar vida.

O terceiro objectivo do voo é desvendar a estrutura dos géiseres. Não se sabe se o material ejectado vem de orifícios independentes ou de rachas ao longo da crosta de gelo. Ou ainda se os dois tipos de estruturas coexistem. Um detector da Cassini vai contar o número de micropartículas de gelo que atingirá a sonda para responder a esta questão, que permitirá compreender como é que o material do oceano sobe até à superfície. Além disso, esta experiência ajudará a estimar o volume de material libertado nestes jactos, um dado importante para se saber desde quando é que a lua está activa.

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O Pólo Norte de Encelado fotografado pela Cassini JPL/NASA

Os cientistas defendem que a sonda não corre perigo ao atravessar as plumas àquela altitude, já que será atingida por micropartículas. A sonda vai fazer o voo a 30.600 quilómetros por hora, uma velocidade alucinante. Mesmo assim, tentará fotografar a superfície da lua. As imagens serão tratadas posteriormente na Terra e espera-se que sejam divulgadas na quinta-feira ao final do dia ou já na sexta-feira.

Os cientistas esperam ainda divulgar, uma semana após o voo, um primeiro olhar sobre a informação obtida pela Cassini. Os dados completos só serão publicados dentro de alguns meses.

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