Refugiados na República Checa são detidos em centros piores que prisões

As "violações dos direitos humanos são sistemáticas" neste país da Europa Central, onde o Presidente Milos Zeman se destaca pelos constantes discursos contra o Islão, diz o alto comissário para os direitos humanos das Nações Unidas.

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Uma criança à janela no centro de detenção de Bìlá-Jezová, que o ministro da Justiça checo diz ser "pior que uma prisão" David W Cerny/REUTERS

O alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein, “criticou vigorosamente” a detenção de refugiados e migrantes que têm estado a chegar à República Checa desde o Verão, obrigando-os até a pagar pela sua detenção. Manifestou-se também preocupado com o discurso público cada vez mais marcado pela xenofobia, incluindo “as repetidas declarações islamofóbicas do Presidente Milos Zeman”.

A República Checa não é o único país da Europa Central a rejeitar receber refugiados da guerra na Síria. Mas, segundo a agência da ONU para os Direitos Humanos, destaca-se negativamente: “O que torna única a República Checa entre outros países de trânsito é estar a submeter de forma rotineira estes migrantes e refugiados a períodos de detenção de 40 dias e por vezes até mais – 90 dias – em condições descritas como degradantes”, diz o alto comissário Zeid Ra’ad Al Hussein, num comunicado divulgado em Genebra.

A ONU diz que “as violações dos direitos humanos dos migrantes não são actos isolados nem meras coincidências, mas sim sistemáticas. Parecem ser parte integral de uma política do Governo checo concebida para travar a entrada de migrantes e refugiados no país, ou para que permaneçam lá”, diz Zeid, citando o que diz serem “relatos credíveis de várias fontes”.

Nada pode justificar que haja crianças detidas, sublinha: “A detenção de crianças com o único argumento do seu estatuto de migrantes, ou dos seus pais, é uma violação.” A provedora de Justiça checa criticou a detenção dos imigrantes, e frisou também que manter as crianças detidas viola a Convenção dos Direitos das Crianças, diz Zeid.

A maior parte destas pessoas não consegue contestar a sua detenção em tribunal, pois não recebe informação sobre como obter apoio judicial gratuito. As organizações da sociedade civil também não estão a conseguir ter acesso a centros de detenção como Bìlá-Jezová, a 80 km a Norte de Praga – que o próprio ministro da Justiça checo descreveu o como “pior que uma prisão”.

Cada migrante é forçado a pagar um valor equivalente a dez dólares diários para permanecer neste centro de detenção, sem qualquer base legal, o que está a deixar as pessoas sem dinheiro. Além disso, foram-lhes confiscados os telemóveis. “O facto de serem obrigados a pagar pela sua própria detenção é particularmente repreensível”, sublinhou o alto-comissário.

O responsável das Nações Unidas critica ainda o Presidente Milos Zeman pelos discursos em que revela a vontade de fechar a porta aos refugiados e a sua desconfiança deles por serem muçulmanos. “Vamos perder a beleza das mulheres porque vão obrigá-las a cobrirem-se da cabeça aos pés em burqas”, afirmou, espalhando o receio de que os migrantes obrigarão a impor a lei da sharia na Europa.

Zeman apoia ainda a petição pública “anti-imigração” lançada pelo anterior Presidente Václav Klaus, que apela ao Governo para garantir a inviolabilidade da fronteira “por todos os meios”, e critica o Governo por estar a ser demasiado passivo face à crise da migração.

O Presidente diz ser, tal como o primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán, um defensor dos “valores da Europa cristã” – e não é são deste Verão as suas posições anti-Islão. Já em 2011 foi foi processado por afirmações polémicas relativas aos muçulmanos. E não só: os familiares de um jornalista processaram-no porque Zeman afirmou que o jornalista elogiou Hitler, um ex-advogado da presidência da República processou-o por lhe atribuírem a autoria de uma lei de amnistia polémica… Digamos que Zeman é um político com o verbo fácil.

Confrontado com as críticas da ONU, um porta-voz de Milos Zeman não se perturbou. “O Presidente já há muito que alerta para a ameaça do fundamentalismo islâmico. Continua firme na sua opinião e não a alterará face a pressões vindas do estrangeiro.”

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