Versão online do maior jornal da China já dá notícias em português
"Queremos levar a China aos 200 milhões de falantes de português", diz responsável do Diário do Povo.
Instalado no 29.º andar de uma torre envidraçada, Shan Chengbiao, responsável pelas edições online em línguas estrangeiras do Diário do Povo, está habituado a ver mais longe: "Queremos levar a China aos 200 milhões de falantes de português".
Criado no início deste ano, o portal em língua portuguesa do jornal oficial do Partido Comunista Chinês (PCC) já tem seis jornalistas, entre os quais um português e um brasileiro, e o objectivo é "continuar a crescer". "Como o maior jornal da China, não poderíamos deixar de ter um serviço noticioso em português", explica Shan, aludindo às profundas relações económicas e comerciais entre o "gigante" asiático e os países lusófonos.
Fundado em 1948, na província chinesa de Hebei, o Diário do Povo é o jornal mais lido do mundo, com uma tiragem diária superior a 2,5 milhões de exemplares e 300 milhões de visualizações na edição digital.
Não é o único órgão estatal chinês, mas logo junto à recepção confirma-se o seu estatuto singular: quatro fotografias exibem os homens que lideraram a China, desde 1949, a ler atentamente o jornal. Mao Zedong, o fundador da República Popular que dirigiu o país ao longo de 27 anos, e os seus sucessores – Deng Xiaoping, Jiang Zemin e Hu Jintao – estão lá todos.
Desde Setembro, o Diário do Povo ocupa um edifício de 33 andares construído de raiz no moderno e cosmopolita Central Business District de Pequim, e emprega cerca de dez mil pessoas.
Renato Lu, 33 anos, chegou no início deste ano para dirigir a secção portuguesa, após uma década a trabalhar na Rádio Internacional da China, um outro grande órgão estatal do país. "Quando terminei o curso de português, muitos dos meus colegas foram trabalhar para Angola, mas eu escolhi a rádio, porque gostava de jornalismo", conta.
Antes de entrar para a universidade, Renato só sabia que o português era falado em Portugal e no Brasil: "Sabia que era a língua oficial de alguns países africanos, mas nem sequer conhecia os nomes". Contudo, na estratégia que tem para o portal que dirige, garante: "Todos os países são igualmente importantes". Para já, a maior dificuldade está em encontrar recursos humanos: "Falta gente experiente na área da comunicação social com conhecimentos linguísticos de chinês e português".
Numa equipa em que a média de idades ronda os 30 anos, Yin Yongjian, jornalista sexagenário, é uma excepção. Na China, estudou espanhol, mas foi em Moçambique, em meados dos anos 1970, que se estreou como correspondente para a agência oficial chinesa Xinhua: "Em Lourenço Marques (actual Maputo) aprendi português, com professores de Portugal".
Em 1983 foi para Lisboa e nos anos 1990 voltou a África, para acompanhar as conversações entre o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA). Naquela altura, a China já tinha adoptado a política de "Reforma Económica e Abertura ao Exterior", que viria a transformar um país pobre e isolado na segunda maior economia do mundo, no espaço de 30 anos.
Entretanto, a defesa do internacionalismo proletário, que levara Pequim a decretar o "apoio aos países africanos na luta contra o imperialismo", já dera lugar a uma visão mais tecnocrata.
Hoje, a China é o principal cliente do petróleo angolano e o maior parceiro comercial do Brasil.
Portugal tornou-se nos últimos anos um dos principais destinos do investimento chinês na Europa, logo a seguir ao Reino Unido, Alemanha e França, num montante que já ultrapassou os 10.000 milhões de euros.
Cerca de 20 universidades, dispersas por uma dezena de cidades da China continental, têm actualmente licenciaturas em português – a esmagadora maioria aberta nos últimos dez anos.
O Diário do Povo online tem também versões em inglês, russo, espanhol, francês, japonês, árabe, alemão e coreano, mas Yin Yongjian não tem dúvidas: "se hoje fosse para a universidade, escolhia o português para estudar".