Fiscalidade verde aumenta consumo de sacos de lixo em 40%

Efeito colateral da taxa sobre os sacos de supermercado era esperado e desejado pelo Governo. Mas pode reduzir parte dos benefícios ambientais da medida.

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Há indicações evidentes de que o uso dos sacos leves antes gratuitos caiu substancialmente Nuno Ferreira Santos

Oito meses após a introdução da taxa de dez cêntimos, o Ministério do Ambiente ainda não tem números sobre a sua aplicação. Há indicações evidentes de que o uso dos sacos leves antes gratuitos caiu substancialmente. Mas também há efeitos colaterais – incluindo quebra de receitas e despedimentos na indústria.

Os efeitos da taxa também estão a ser notados no outro extremo da cadeia, o dos lixos. O PÚBLICO contactou várias entidades gestoras de resíduos sólidos urbanos, representando cerca de 60% do lixo tratado no país. Nenhuma tem ainda dados quantitativos conclusivos, mas quase todas possuem uma impressão visual do que se está a passar. “Verifica-se uma grande redução dos sacos de plástico dos supermercados. O que aparece agora são sacos de maior volume, pretos”, afirma Susana Ramalho, directora executiva da Resialentejo, que gere os resíduos urbanos do Baixo Alentejo.

Outras entidades falam em diminuição “acentuada”, “significativa” ou “aparente”. Onde mais se nota esta alteração é nas linhas de separação dos materiais recicláveis, que vêm dos ecopontos. “Dantes olhávamos e víamos logo os sacos com as marcas dos hipermercados. Isso deixámos de ver tanto. Mas continua a haver sacos”, afirma Patrícia Carvalho, responsável pela Divisão de Reciclagem e Valorização Multimaterial da Lipor, do Grande Porto.

Em contrapartida, no mesmo fluxo dos recicláveis vêem-se mais sacos de lixo, indicando uma substituição. Os cidadãos que antes utilizavam os recipientes gratuitos dos supermercados para levar garrafas, papéis e embalagens para o ecoponto agora compram sacos novos para este fim.

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O mesmo está a acontecer no contentor do lixo normal: os sacos tradicionalmente pretos estão a ocupar o lugar dos de supermercado.

Esta alteração foi várias vezes referida como bem-vinda pelo ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, Jorge Moreira da Silva, por garantir um acondicionamento adequado dos resíduos e facilitar depois a separação destes sacos, dado serem mais resistentes.

Mas também está a acontecer o oposto: os cidadãos estão a despejar o lixo directamente para o contentor, sem saco nenhum, aumentando o problema das escorrências. “Há muito lixiviado. As próprias viaturas de recolha ficam mais sujas”, afirma Cristiana Santos, coordenadora da área técnica da Tratolixo, empresa que cuida dos resíduos de Cascais, Sintra, Oeiras e Mafra.  “As entidades [que fazem a recolha] reportam um agravamento nos custos com as lavagens”, completa.

O Ministério do Ambiente, segundo a sua assessoria de imprensa, não tem ainda dados nem sobre a quantidade de sacos sujeitos à taxa que foram utilizados desde Fevereiro, nem sobre o montante de imposto já arrecadado. Logo ao princípio, terão entrado nos cofres públicos 1,6 milhões de euros, referentes aos 16 milhões de sacos que os comerciantes ainda tinham em stock quanto a lei entrou em vigor. O Governo espera arrecadar 40 milhões de euros este ano.

A taxa foi justificada sobretudo por um benefício ambiental em particular: evitar que os sacos leves voem facilmente, poluindo cidades, campos e mares. Mas a consequente redução do consumo de petróleo – de que os plásticos são feitos – será minorada pela maior utilização de sacos de lixo. Do lado positivo, estes sacos são parcialmente feitos com material reciclado.

O aumento na sua procura este ano supera os 40%, segundo Rui Toscano, presidente da Plastval – a sociedade que representa a fileira do plástico no sector da reciclagem.

Isto terá contribuído para uma subida de 38% na fracção de plásticos em filme, como os sacos, recolhida dos resíduos indiferenciados, os que são depositados no contentor normal, em todo o país. Nos ecopontos, houve uma redução de 2%.

O impacto nas entidades que tratam dos resíduos urbanos é muito diverso. Na Braval, do Baixo Cávado, há este ano menos 13,5% de filme plástico nos ecopontos. Mas no lixo indiferenciado a fracção correspondente ao filme subiu de 4,2% para 5,0%.

Já na região de Lisboa, a Valorsul teve uma queda marginal de apenas 1% no filme plástico dos ecopontos. E no caso dos indiferenciados, é mais difícil notar visualmente qualquer alteração, pois os resíduos são depositados numa fossa funda, antes de serem incinerados.

Só agora é que algumas entidades gestoras vão detalhar melhor a caracterização dos lixos, de modo a poder quantificar a presença dos sacos de plástico.

Há outros efeitos colaterais da taxa. Apenas os sacos de supermercado têm o “ponto verde”, ou seja, a sua reciclagem é financiada pela indústria. Os sacos de lixo não o têm, porque são considerados um produto, e não uma embalagem. A Sociedade Ponto Verde, que gere este fluxo, acaba por tratar de ambos da mesma forma, mas só é paga por um. “Temos o custo, mas não temos a receita”, diz Luís Veiga Martins, director-geral da empresa.

Os efeitos benéficos da taxa sobre os sacos leves serão provavelmente diluídos pelo aumento da produção de lixo em Portugal. Nas 12 empresas gestoras de resíduos que responderam a um inquérito do PÚBLICO, a subida média foi de 3,6% em 2014, em relação a 2013. E a tendência se mantém este ano.

A Suldouro, que trata dos resíduos de Vila Nova de Gaia e Santa Maria da Feira, vê aí uma possível explicação para a maior quantidade de filme plástico que agora recolhe para a reciclagem, contrariamente ao que está a acontecer noutros sistemas de gestão de resíduos. “Este aumento pode dever-se a fenómenos de consumismo marcados pela retoma da economia”, refere a empresa, numa resposta por email.

As contas certas do impacto da nova taxa ainda dependem de outros factores. Os sacos mais grossos agora vendidos pelos hipermercados acabarão, mais tarde, por aparecer no fluxo da reciclagem, embora durem mais tempo. E o significado do aumento do consumo de sacos de lixo ainda está por avaliar.

A Comissão para a Reforma da Fiscalidade Verde, que propôs a taxa, não se preocupou com a questão dos sacos de lixo. “É uma análise ambiental, nós fizemos a análise económica”, diz Jorge Vasconcelos, que presidiu à comissão. O saldo ambiental positivo do novo imposto foi tido como um dado adquirido, dada a experiência internacional.

No País de Gales, onde uma taxa semelhante foi introduzida em 2011, também houve um aumento no consumo de sacos de lixo, mas equivalente a apenas 4% da redução dos sacos de supermercado. A organização não-governamental Wrap, autora do estudo que conduziu a estas conclusões, salienta porém que os sacos de supermercado provavelmente não eram em regra usados para o lixo normal e que aqueles resultados não são válidos para outras situações onde o contrário seja a norma – como acontece em Portugal. 

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