Há pontos de entendimento nas pensões, mas acordo para reforma parece difícil

Aumento das receitas da Segurança Social é um dos pontos onde poderá haver convergência entre a coligação e o PS. Passos voltou a desafiar Costa para o diálogo.

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Reforma do sistema de pensões deve ser um dos temas do debate entre o futuro Governo e a oposição pAULO pIMENTA

Logo no discurso da noite das eleições, Passos Coelho fez da Segurança Social o ponto de partida para o eventual lançamento de pontes entre o futuro Governo e os socialistas, dizendo que o PS, “sendo um partido europeísta, estará disponível para possibilitar que reformas importantes ainda possam ter lugar no nosso país nos próximos anos, com destaque para a reforma da Segurança Social”.

Do lado do PS, alguns minutos antes, António Costa tinha estabelecido “quatro objectivos essenciais” para poder cumprir o seu mandato e concretizar o programa. Um desses objectivos é “a defesa do estado social e dos serviços públicos, na segurança social, na educação e na saúde para um combate sério à pobreza e às desigualdades”.

As declarações pós-eleitorais sobre o assunto são ainda demasiado vagas para avaliar a probabilidade de um entendimento na área das pensões, mas olhando para o que está escrito nos programas eleitorais e para o que foi dito durante a campanha, é possível detectar de forma mais nítida alguns pontos de entendimento, mas também linhas vermelhas que tornam pouco provável um acordo amplo para uma reforma do sistema de pensões.

O entendimento mais provável está na diversificação das fontes de financiamento, um objectivo expresso nos dois programas eleitorais. Com um novo corte das pensões colocado de lado por agora, o Governo deverá, a acreditar no que foi sendo dito por Passos Coelho, tentar um aumento imediato das receitas da Segurança Social. Num debate televisivo, Passos Coelho disse explicitamente a Costa que seria através de novas fontes de financiamento que se poderia encontrar uma solução para a meta de 600 milhões de euros, prevista no Programa de Estabilidade para 2016. E lembrou que o PS propõe no seu programa novas receitas para o sisitema, provenientes, por exemplo, da taxa de IRC, das portagens das auto-estradas ou do agravamento das contribuições das empresas com alta rotatividade dos seus trabalhadores. “Só essas medidas fazem mais do 600 milhões. Eu espero que nos possamos entender sobre isso”, disse o primeiro-ministro a António Costa.

Há outras medidas, como o congelamento das pensões com excepção das mínimas, que permite pensar que o futuro governo minoritário consegue encontrar formas de obter apoio parlamentar para a sua gestão da Segurança Social para o próximo ano.

Há no entanto, diferenças claras quando se fala de uma reforma completa. Coligação e PS têm logo à partida divergências sobre os problemas que o sistema enfrenta, com os socialistas a defenderem que o desequilíbrio financeiro se deve essencialmente à perda de empregos e o PSD/CDS-PP a detectar falhas na sua actual estrutura.

Por outro lado, a proposta de plafonamento apresentada pela coligação e a proposta de redução da TSU apresentada pelo PS foram alvo de críticas fortes pelo lado contrário da barricada.

Ainda nesta terça-feira, num relatório divulgado pelo Comité de Protecção Social, a Bruxelas alertava para a necessidade de um acordo político “claro” e de “largo espectro” para garantir a sustentabilidade do sistema de pensões em Portugal.

Pedro Côrte-Real, professor da Universidade Nova de Lisboa que fez uma análise comparada dos programas eleitorais para o grupo de Cidadania Social (Centro de Intervenção e Reflexão de Políticas Sociais), tem ainda assim uma visão optimista sobre a possibilidade de convergências.

No programa eleitoral do PS, nota, “não ficou completamente fechada a porta a uma discussão” sobre a necessidade de reformar o sistema de pensões em Portugal, uma vez que se admite que a situação da Segurança Social sofreu alterações com a actuação do Governo.

“Continuo a achar que são mais as semelhanças do que as diferenças e o PS e a coligação estão mais próximos do que poderá parecer numa primeira leitura dos programas eleitorais de cada um”, refere.

Para o professor,  PS e coligação estão próximos “nos pontos essenciais”. “Quer um quer outro defende um regime público com gestão pública; um sistema obrigatório e universal e a manutenção de um modelo de repartição em que os activos de hoje pagam a reforma dos actuais pensionistas”. Ou seja, resume, o sistema de repartição é para manter, com alteração de alguns aspectos, nomeadamente as fontes de financiamento.

Há ainda outro aspecto que Pedro Côrte-Real, que foi presidente do Instituto de Informática da Segurança Social, destaca: “Quer PS, quer a coligação falam em fazer estudos e em tornar o sistema mais transparente. O objectivo é, na minha opinião, encontrar indicadores de sustentabilidade do sistema”.

“Se duas forças políticas acordam nestes aspectos, é natural que, se se sentarem a uma mesa para negociarem, possam encontrar pontos de contacto”, defende.

Para o professor da Nova, o grande entrave poderá estar na eventual necessidade de mexer nas regras das pensões em pagamento. A proposta não é referida nunca pelos partidos que estão no Governo, tal como nunca se referem à necessidade de poupar 600 milhões de euros com o sistema de pensões. Mas Côrte-Real receia que a questão surja de novo, “caso a pressão sobre as pensões em pagamento volte a colocar-se” se a economia não crescer tanto quanto o esperado.

PONTES E OBSTÁCULOS

Onde há margem para entendimento:

  • Diversificação das fontes de financiamento, aumentando as receitas da Segurança Social através, por exemplo, da alocação de receitas de auto-estradas ou do agravamento das contribuições das empresas com alta rotatividade dos seus trabalhadores.
  • Manter a política de congelamento das pensões, actualizando apenas as mínimas.
  • Impor limites às prestações sociais, através do alargamento da condição de recursos.
  • Promover os sistemas complementares de pensões.
  • Tornar o sistema de pensões mais transparente.
  • Prosseguir o processo de convergência entre o sistema público e privado.

Onde as diferenças são muito grandes:

  • O PS diz que, para o sistema de pensões ser sustentável, o fundamental é criar mais emprego, o PàF defende que é preciso tomar mais medidas.
  • PS propõe cortes na TSU para estimular a economia, Passos Coelho diz que é um plafonamento vertical que conduz a “insegurança e risco”
  • PàF defende plafonamento horizontal no sistema de pensões, mas Costa diz que é “uma enorme aventura para o futuro da sustentabilidade da Segurança Social”

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