Justiça coloca 517 novos funcionários nos tribunais e deixa 80 revoltados
Oficiais de Justiça começam a trabalhar na segunda semana de Setembro. Candidatos aprovados em exame que não ficaram colocados nos locais a que concorreram foram excluídos, sem serem colocados oficiosamente. Alguns tinham-se despedido.
A Direcção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ) garante que, nesta primeira fase, iniciarão funções, “na segunda semana do mês de Setembro, 517 novos oficiais de justiça”. No entanto, o projecto de colocação divulgado apenas inclui 508 primeiras colocações, uma discrepância não explicada pela DGAJ. Na resposta enviada ao PÚBLICO esta direcção-geral admite que o 517 corresponde ao “primeiro balanço provisório”, que ainda poderá vir a sofrer alterações, na sequência do processo de reclamação, que só termina na próxima quarta-feira.
O Ministério da Justiça garante que os 600 lugares abertos no concurso serão todos preenchidos, numa segunda fase do concurso, cuja data ainda não definiu. Neste momento equaciona-se a hipótese de fazer um movimento extraordinário em Setembro ou colocar estas pessoas no movimento habitual, o que significaria que começavam a trabalhar só em Novembro. “Não ficará, nesta primeira fase, preenchida a totalidade da quota correspondente aos 600 novos postos de trabalho, uma vez que não foram apresentadas candidaturas que permitissem o preenchimento dos lugares vagos disponíveis, isto é, nenhum dos candidatos não colocados indicou como sua opção os lugares que não foram ocupados”.
Os candidatos aprovados nos exames de admissão que ficaram sem colocação acusam a DGAJ de má-fé, por ter mudado as regras a meio do concurso. E insistem que foram aconselhados por funcionários da própria direcção-geral e dos tribunais a não concorrer às 600 vagas disponíveis, por tal não ser necessário, já que, se não ficassem nos lugares da sua preferência, seriam colocados por ordem da DGAJ, ainda que de forma inversa à ordem de classificação que tinham obtido.
É o caso da mulher do advogado Hugo Saraiva, 31 anos, que tendo ficado a meio da tabela dos 650 classificados aprovados, considerava garantida a entrada, segundo as informações da DGAJ e dos sindicatos. Por isso, despediu-se do escritório de advogados onde trabalhava para cumprir o aviso prévio legal e poder começar em Setembro, como lhe tinham prometido. “Desvirtuaram por completo o concurso. A meio do processo é que decidiram não fazer as colocações oficiosas. Não podiam mudar as regras a meio do jogo”, insiste Hugo Saraiva. O advogado diz-se preocupado com a mulher, que está psicologicamente afectada com a situação. “Afinal a minha mulher desempregou-se para ficar em casa, quando tinha uma expectativa legítima de ir trabalhar para os tribunais”, refere. Para Hugo Saraiva, a única explicação para o que aconteceu é o Ministério da Justiça está a apressar a colocação das pessoas “por causa das eleições”.
Mais dois candidatos contactados pelo PÚBLICO, que pediram o anonimato por temerem represálias, confirmam ter recebido sempre a indicação que se não ficassem nos locais a que concorreram seriam colocados oficiosamente. Um, que tinha ficado classificado entre os primeiros 300 candidatos, era subgerente de uma loja no Norte do país e despediu-se. Continua disponível para ocupar um lugar em qualquer zona do país e lamenta ter sido mal informada. “Tinham que nos avisar que corríamos o risco de não ficar colocados”, sustenta, dizendo-se frustrada com a situação. “Perdi o meu emprego e agora encontro-me sem nada”.
O presidente do Sindicato dos Oficiais da Justiça, Carlos Almeida, diz que a não realização das colocações oficiosas terá sido ordenada pelo Ministério da Justiça à DGAJ, acusando esta direcção-geral de má-fé “por não ter informado correctamente os candidatos”. O dirigente diz temer que a mudança de Governo faça com que estes candidatos nunca mais entrem nos tribunais. Sublinha, por outro lado, que num despacho de 23 de Julho, o director-geral dizia expressamente que “as primeiras colocações, caso os candidatos não obtenham colocação a seu pedido, o critério a observar, para as colocações oficiosas, será a graduação inversa dos candidatos e ordenação por ordem alfabética das secretarias”.
A DGAJ diz que tal referência era apenas uma “hipótese” que necessitava sempre de “decisão sobre a sua efectivação, ou não”. Alega que um elevado número de candidatos seriam colocados em tribunais para os quais não concorreram, o que conduziria inevitavelmente a situações de não aceitação do lugar e consequentemente obstar ao preenchimento das vagas no mesmo movimento com manifesto prejuízo do interesse público. E sustenta, como a ordem de colocação seria a inversa da nota, “a maioria dos candidatos a colocar oficiosamente” teriam notas entre os 9,5 e 10 valores, por referência à classificação da prova de conhecimentos. E remata: “Após cuidada ponderação entendeu-se que as nomeações oficiosas não se adequariam com a prossecução dos interesses dos candidatos que não obtiveram colocação nem seria a melhor solução para o interesse público”.
Carlos Almeida garante, contudo, que a interpretação que a DGAJ está a fazer da lei é diferente da que aquela instituição fez em vários concursos anteriores. “A colocação oficiosa só abrangeria os primeiros 600 classificados. Os outros só entrariam se esses não aceitassem os respectivos lugares”, garante Carlos Almeida. O dirigente acusa a direcção-geral de fazer este movimento à pressa e com muitos erros, que fazem, por exemplo, que haja candidatos que concorreram a lugares que ficaram por preencher não tenham sido colocados.
A DGAJ garante que, “num futuro movimento, todos os candidatos não colocados terão oportunidade de, em igualdade de circunstâncias, se candidatarem aos lugares disponibilizados”. E realça que a prova de conhecimentos realizada por estes candidatos é válida “pelo período de três anos”. Sobre as reclamações, a DGAJ garante ter recebido apenas nove queixas além de centena de pedidos de esclarecimento.