Tribunal militar russo condena realizador ucraniano a 20 anos de prisão
Oleg Sentsov foi detido num protesto contra a anexação da península da Crimeia pela Rússia.
Sentsov foi detido há mais de um ano num protesto contra a anexação da península da Crimeia por Moscovo, um dos primeiros capítulos na tensão e conflito entre a Rússia e a Ucrânia e que se prolonga até agora. Segundo a acusação, o realizador, que vivia na Crimeia, estava envolvido num plano para fazer explodir um monumento dedicado a Lenine e ainda numa tentativa de incêndio da sede do partido pró-russo Rússia Unida, em Simferopol.
Além de negar todas as acusações produzidas contra si, Oleg Sentsov, de 39 anos, contestou a legalidade da sua prisão, dizendo não ter sido produzido um único elemento de prova para sustentar as acusações e classificando-se como um prisioneiro político. Também denunciou inúmeros incidentes de tortura em interrogatórios – as marcas físicas dos abusos denunciados foram desvalorizadas pelas autoridades prisionais russas como auto-infligidas, resultado de uma suposta propensão do arguido para práticas sexuais sadomasoquistas.
“Quando te põem um saco na cabeça e te espancam, não demora mais de meia hora até estares pronto a negar tudo aquilo em que acreditas, e a implicar-te a ti e a todas as pessoas que tu conheces no que quer que seja que te dizem, só para que não te batam mais. Mas aquilo em que acreditas não vale de muito se não estiveres disposto a sofrer e a morrer por isso”, declarou Sentsov em tribunal.
A Amnistia Internacional criticou a Rússia por não ter aberto um inquérito para apurar as queixas de Sentsov. “A ausência de investigação [de actos de tortura] é só mais uma manifestação do total desrespeito dos critérios mínimos de justiça e transparência deste caso”, disse um porta-voz da organização, Bogdan Ovcharuk, ao Kiev Post.
Oleg Sentsov estava a trabalhar num novo projecto cinematográfico quando as tropas russas invadiram a península da Crimeia, que em Março de 2014 viria a votar pela anexação à Rússia num referendo contestado pelo Governo de Kiev. O realizador abandonou a nova longa-metragem e passou a dedicar-se ao apoio às tropas ucranianas, coordenando missões humanitárias para auxiliar os soldados e populações isoladas pelas forças de Moscovo.
Numa carta aberta endereçada ao Presidente russo, Vladimir Putin, realizadores como Mike Leigh, Pedro Almodóvar ou Stephen Daldry e vários cineastas russos, entre os quais Alexander Sokurov, descreveram as acusações produzidas contra Sentsov como “do domínio do fantástico” e exigiram a sua libertação imediata.
Detido na mesma manifestação, em Maio de 2014, um outro activista ucraniano, Alexander Kolchenko, foi julgado sob a mesma acusação como cúmplice de Sentsov e condenado a uma pena de dez anos de prisão. O tribunal militar de Rostov-no-Don já tinha condenado outros dois detidos no mesmo protesto, Guennadi Afanasiev e Alexei Chimigo, a sete anos de prisão. Os dois foram arrolados como testemunhas no julgamento de Oleg Sentsov, para confirmar os depoimentos que constavam no processo, mas recusaram-se a falar alegando que o seu testemunho fora obtido através de tortura.
Quando as penas foram anunciadas, Sentsov e Kolchenko – que terão de cumprir pena numa prisão de segurança máxima – levantaram-se da cadeira e começaram a cantar o hino nacional da Ucrânia. Minutos depois do encerramento da sessão judicial, transmitida em directo pela televisão ucraniana, o Presidente do país, Petro Poroshenko, deixou uma mensagem de apoio ao cineasta. “Coragem, Oleg. Chegará o dia em que quem estará no banco dos réus serão aqueles que organizaram tudo isto contra ti”, escreveu no Twitter.
Outros cidadãos ucranianos detidos e acusados de terrorismo pela Rússia foram classificados pelos Estados Unidos como reféns de Moscovo. Entre estes está uma piloto da Força Aérea ucraniana, Nadiya Savchenko, que foi capturada e aguarda julgamento no Sul da Rússia.