Propaganda versus propaganda
Esta fotografia, que escolhemos como “imagem da semana”, vem com uma nota especial na legenda: “Atenção editores — A Reuters não consegue de forma independente verificar a autenticidade, o conteúdo, o lugar ou a data desta imagem. Esta fotografia é distribuída exactamente como foi recebida. É um serviço ao cliente”. Nas redacções, estamos habituados. De vez em quando, delicadamente, a Reuters assume que a fotografia não cumpre os critérios básicos do jornalismo e que o cliente (nós) recebe um produto cheio de defeitos. Não sabemos se estas belas macieiras são de facto da quinta de Taedonggang, como a legende afirma, não sabemos se o líder da Coreia do Norte lá foi e, se foi, quando. Posto isto, o primeiro instinto foi olhar para o pé das maçãs e tentar ver se eram verdadeiras ou se estariam coladas às árvores — com cola ou em fotomontagem. Não era necessário. No YouTube há vídeos de propaganda sobre a quinta nos quais senhor explica que as macieiras anãs em questão são muito produtivas; que cada árvore dá mais de 100 maçãs e que cada equipa colhe mais de dez toneladas por dia. Não sabemos quantas equipas ali trabalham nem durante quantos dias por ano se apanha fruta. Mas dez toneladas são 125 mil maçãs em 1250 macieiras. Uma pujança contrariada pelas imagens de fome que nos chegam. Há três anos, Kim Jong-un suspendeu os testes de mísseis de longo alcance em troca de ajuda alimentar. A própria agência de notícias oficial — a mesma que enviou para o mundo esta fotografia — noticiava em Junho que a Coreia do Norte vive a pior seca dos últimos 100 anos e que 30% dos arrozais estão inutilizados. Segundo a ONU, um terço das crianças sofre de malnutrição. Também não sabemos o que terá Kim Jong-un dito, inspirado pelas maçãs. Coisas interessantes com certeza, a avaliar pela atenção e cuidado com que os cinco homens à sua volta tiram notas nos seus blocos.
A propaganda norte-coreana é ridícula. Para fora não resulta. Não sabemos se a propaganda que a Coreia do Sul emite para o Norte através de colunas de som, uma originalíssima medida de soft power que vem do tempo da Guerra Fria, será mais eficaz. Aos nossos olhos ocidentais parece caricata. Esta quinta-feira, quando Seul transmitia mensagens sobre as vantagens da democracia e do seu estilo de vida, além de notícias do mundo e previsões de tempo nas colunas montadas ao longo da fronteira, Pyongyang disparou contra o Sul e a seguir o Sul respondeu e disparou contra o Norte. Granadas de artilharia. Foi a primeira vez em cinco anos. O objectivo claramente não era só destruir as colunas de som. Quereria o Norte testar o tempo de resposta do Sul? Tudo começou e acabou numa hora.
As colunas de som ficaram intactas.