Regresso de emigrantes de países como Angola pode afectar economia
CMVM diz que pode haver “um stress adicional no sistema social e afectar a recuperação de uma já frágil economia”.
O alerta consta de um relatório do regulador do mercado de capitais, a CMVM, intitulado risk outlook, e que aborda os vários caminhos com que Portugal se defronta, estejam relacionados com política económica, com o mercado imobiliário ou de capitais.
Quando a economia portuguesa começou a encolher, muitas empresas apostaram em mercados como Angola e Brasil para tentar diminuir os impactos da quebra no mercado doméstico. Essa tendência, por sua vez, levou a que muitos portugueses emigrassem para estes países (a que se junta Moçambique), seja por serem trabalhadores expatriados, sejam por não terem emprego em Portugal e procurarem novas oportunidades.
Agora, há um novo ciclo, onde se destaca o caso de Angola, país que atravessa uma conjuntura de crise económica com a queda do preço do petróleo, o que afecta as empresas expostas a este país e, também, os emigrantes.
Diz o relatório da CMVM (apenas escrito em inglês) que, se nada mudar, o regresso dos emigrantes (e o impacto nas contas das empresas), somado ao “lento crescimento verificado na criação líquida de postos de trabalho”, pode “criar um stress adicional no sistema social e afectar a recuperação de uma já frágil economia”.
Não há dados concretos (o registo não é obrigatório), mas Angola atraiu dezenas de milhares de trabalhadores nos últimos anos. O sindicato da construção já alertou para a existência de trabalhadores a regressar a Portugal e que a situação tende a agravar-se.
Angola é um caso particular, e isso está bem visível no número de empresas que têm negócios com este país. Conforme noticiou o PÚBLICO, há 9440 empresas em Portugal que exportam os seus produtos para Angola, e, destas, mais de metade não vende para nenhum outro mercado externo. Em 2014, 5256 empresas dependiam a 100% de Angola para realizar as suas vendas para fora do país. Em valor, representaram 1234 milhões de euros, o que equivale a 41% do montante arrecadado com as exportações para Angola durante o ano passado.
Nos primeiros cinco meses, as vendas para este mercado caíram 25%, o que significa menos cerca de 300 milhões de euros face a idêntico período do ano passado. Ao mesmo tempo, as empresas estão com dificuldades em transferir verbas para fora do país devido à falta de divisas, e têm de lidar com mais atrasos nos pagamentos. O Governo português criou uma linha específica de apoio à tesouraria para empresas com dificuldades em repatriar capitais, mas há instrumentos de apoio que não estão a ser usados.
Uma análise agora publicada pelo gabinete de estudos do banco angolano BAI, através da unidade que detém em Portugal, destaca que uma das medidas contra-cíclicas que Angola podia usar é uma linha de crédito negociada com Portugal. Esta passa por um seguro às exportações de mil milhões de euros e que, diz o BAI, tem cerca de 650 milhões disponíveis. Os créditos, cobertos pela Cosec, são avalizados pelo Estado angolano, que fica responsável pelo “bom pagamento”. Esses cerca de 650 milhões de euros, escreve o BAI, oferecem a vantagem de se encontrar “imediatamente disponíveis, dependendo a sua utilização da própria vontade das autoridades angolanas”.