Coligação apresenta pouco programa e muito medo

Discursos de Passos e Portas focaram-se no fantasma do “passado”. “Bancarrota”, “radicalismo”, despesismo, “buraco”, “caras das políticas do passado”, “rating”. Todos os chavões foram usados para atacar o PS.

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O prelúdio organizado esta quarta-feira ao fim da tarde num hotel de cinco estrelas da capital recuperou a soma de todos os medos com que os sociais-democratas e centristas tencionam derrotar socialistas nas eleições de 4 de Outubro.

O objectivo era apresentar o programa eleitoral, mas tanto Paulo Portas como Pedro Passos Coelho aproveitaram para atacar o PS. As palavras-chave foram todas concentradas nos dois discursos dos líderes da coligação: “Bancarrota”, “radicalismo”, despesismo, “buraco”, “caras das políticas do passado”, “rating”.

As palavras mais fortes e o grosso das intervenções tiveram sempre como alvo o PS, apresentado como a imagem do “passado” do país. Passos Coelho falou da sua última vitória para lembrar que se os portugueses já tinham tido a oportunidade de “corrigir o voto em 2011”, derrotando o PS nessas legislativas, era agora “importante, em 2015”, que essa viragem, fosse “confirmada”. Porque senão...

Passos Coelho engrenou para o seu discurso lembrando que a coligação tinha no currículo o mérito de “salvar Portugal da bancarrota”. “Os portugueses sabem onde está a origem da crise que ultrapassámos”, rematou, sem verbalizar a sigla do principal partido da oposição, como se com isso receasse estar a invocar um qualquer espírito maligno.  

Mesmo quando elogiou o seu próprio programa, fê-lo com ataques velados ao PS: “O que aqui está não abre nenhum buraco em lugar nenhum.” Quando quis enaltecer os seus quatro anos de governação, foi por oposição. “Nestes quatro anos mostrámos que podíamos defender o Estado social do socialismo.”

Passos Coelho acusou até o PS de falta de renovação. "Do outro lado temos uma proposta que nos dá mais do mesmo que nós já conhecemos do passado, nem o cuidado tiveram de mudar as caras mais responsáveis por essas políticas do passado."

Acenou ainda com o fantasma das agências de notação. O actual primeiro-ministro avisou que a possibilidade de revisão do “rating seria resultado da escolha dos portugueses”. “As empresas de rating estão à espera, conforme eu disse, do resultado das eleições para saber se o que se passou nestes anos foi assim porque não tínhamos alternativa, ou se nós sabemos mesmo o que queremos fazer para futuro.”

A intervenção do líder do CDS não foi muito diferente. Paulo Portas até começou o seu discurso dizendo que sobre o passado empregaria “uma única palavra”. Mas não o fez. Depois de agradecer aos portugueses o esforço feito para ultrapassar a “excepcionalidade” destes quatro anos, descaiu para o passado para lembrar o “partido responsável pelo resgate” que “nunca pediu desculpa aos portugueses, nunca agradeceu aos portugueses terem superado a crise que o PS criou e deixou”.

E enquanto resumia alguns dos “compromissos adicionais” constantes do programa, aproveitou para pintar o PS como irresponsável por “prometer tudo a todos”. Quando falava da Segurança Social, contrapôs à “moderação” das propostas da coligação o “radicalismo de certas posições socialistas”.

As referências ao programa centraram-se no “plano social”. Tanto Portas como Passos apostaram essencialmente nessa parte do documento. O primeiro-ministro prometeu “apoiar as famílias mais numerosas ou que têm idosos a seu cargo”. Prometeu dar “luta sem quartel” aos problemas da demografia e da desigualdade social. O vice-primeiro-ministro falou na universalização do pré-escolar e do médico de família. Falou na Segurança Social e no “caminho de uma limitação contributiva voluntária” proposto pela coligação.

Mas o resultado prático dos discursos foi uma sala sem ovações ou entusiasmo. As palmas foram escassas, as palavras de ordem gritadas quase nulas. Discursar pela negativa tornava mais difícil à assistência assumir “orgulho” na governação, como tentara a voz-off minutos antes. Os convidados mantinham o burburinho e as conversas laterais enquanto os altifalantes e ecrãs replicavam imagens de paisagens solares e vocalizavam a confiança de que “Agora Portugal pode mais”.

Quando, perto do fim, se cantou o hino, as vozes enlatadas da gravação não disfarçaram o austero empenho vocal da assistência. E tudo terminou sem os habituais gritos repetidos da sigla política em causa. Ali ninguém gritou PAF, PAF, PAF. O que até teria soado como conclusão adequada ao ensaio de ataques realizado contra o PS.

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