Governo vende CP Carga com receitas de dois milhões e fecha privatizações

Venda da EMEF à Alstom fica "sem efeito" devido à queixa da Bombardier contra o Estado português.

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Adriano Miranda

É um processo de que saem derrotados o fundo de investimento Atena Equity Partner (detido pelos empresários João Santos, Miguel Lencastre e Vítor Guégués,) que apresentou uma proposta de 45,5 milhões de euros e a Cofihold, consórcio que tem accionistas comuns à Cofina, Altri e F. Ramada, e que ofereceu 30 milhões de euros pela CP Carga.

Segundo revelou esta quinta-feira o secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações, Sérgio Monteiro, no briefing que se seguiu ao Conselho de Ministros que aprovou a privatização, além do envelope financeiro maior, houve um factor diferenciador que pesou na escolha da MSC: “O facto de a empresa se ter comprometido a não fazer revisões unilaterais dos preços da CP Carga com os clientes”.

Os 53 milhões de euros que a MSC vai pagar à CP incluem os dois milhões da aquisição das acções (em Março estavam valorizadas no balanço da empresa em 71 milhões), e outros 51 milhões para “a aquisição de créditos da CP Carga e compromissos de capitalização da empresa”, disse Sérgio Monteiro. Com esse montante, espera-se que a MSC pague as dívidas acumuladas da CP Carga à CP, bem como outros encargos a entidades públicas, como os valores em atraso da taxa de uso à IP.

Em alguns casos, o pagamento será imediato e, noutros, será feito de acordo com os planos de pagamento já acordados, segundo informações recolhidas pelo PÚBLICO. Ainda assim, o passivo da CP Carga, que no final de Março atingia 190 milhões de euros (valor que entretanto poderá ter descido), não ficará a zero, ainda que não tenha sido possível apurar o valor exacto no momento da venda.

A empresa presidida por Aires São Pedro apresentou no primeiro trimestre um prejuízo de 2,3 milhões de euros, menos que os 4,9 milhões no trimestre homólogo. E de acordo com o balanço, no final do primeiro trimestre tinha capitais próprios negativos em quase 86 milhões de euros. Agora, para concretizar esta operação de venda, a CP prepara-se para transferir para a CP Carga a propriedade de várias locomotivas (que até agora estavam alugadas à própria CP Carga) no valor de 110 milhões de euros. Isto permitirá que os capitais próprios da empresa passem a positivos, apurou o PÚBLICO. Ao mesmo tempo, segundo revelou Sérgio Monteiro, a MSC comprometeu-se ainda na sua proposta a realizar alugueres de activos à CP no valor de 16 milhões de euros.

A MSC, que ambiciona agora ser o maior operador ferroviário de mercadorias da Península Ibérica, tem capacidade “do ponto de vista da experiência da gestão e do compromisso financeiro, de dar condições de crescimento à CP Carga em clima de paz laboral”, disse o Sérgio Monteiro. Já a Fectrans, que reúne sindicatos de transportes da CGTP, avançou em comunicado que a privatização da CP Carga deve ser um “estímulo” para o “reforço da luta dos ferroviários, porque o Governo continuará na sua senda de destruição da ferrovia até ao último minuto do seu mandato”.

A data da assinatura do acordo de venda entre a CP e a MSC deverá realizar-se em Agosto, cabendo depois ao vencedor obter as devidas autorizações, nomeadamente a da Autoridade da Concorrência, tendo em conta que a MSC vai passar de cliente da CP Carga a operador ferroviário.

A privatização da CP Carga, que foi anunciada pela primeira vez em 2011, estava prevista no programa de assistência financeira a Portugal, ao contrário da privatização da EMEF. Com a venda da empresa de transporte de mercadorias da CP o Governo finaliza um vasto programa de privatizações que abrangeu diversos sectores. O pontapé de saída foi dado em 2011 com a venda de 21% da EDP aos chineses da China Three Gorges. Três anos e meio depois, com receitas globais de cerca de 9,3 mil milhões de euros, o Estado já tinha saído dos sectores da energia (resta-lhe apenas uma posição de 7% na Galp representada sob a forma de obrigações convertíveis), dos correios, resíduos e gestão aeroportuária. A polémica privatização da TAP também conheceu o seu desfecho em Junho (estando a aguardar as autorizações regulatórias) e agora encerra-se o ciclo com a venda da CP Carga.

Reestruturação à vista na EMEF
Mas se esta está destinada a passar para mãos privadas, o destino da Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário (EMEF) parece, de alguma forma, incerto. Para já, a privatização, para a qual tinha surgido um único interessado, a francesa Alstom, fica suspensa. A secretária de Estado do Tesouro, Isabel Castelo Branco, explicou que a suspensão da privatização da EMEF “não se deveu ao demérito” da proposta da Alstom, mas ao processo que corre em Bruxelas pela prestação de alegados auxílios de Estado. Esta investigação “coloca contingências” de valor e data desconhecidas sobre o processo de privatização que podem afectar o valor do encaixe, disse a governante.

Sem privatização, o cenário para a EMEF é menos optimista do que para a CP Carga. Sérgio Monteiro adiantou que será pedido à CP que entregue com celeridade ao Governo um plano de reestruturação que permita um equilíbrio entre proveitos e custos “para que a EMEF não volte a ter problemas de tesouraria, nem tenha de se endividar junto da banca”.

É um “plano que visa tentar evitar a liquidação”, adiantou o governante, admitindo “um ajustamento forte” em termos do quadro de pessoal da empresa. “Era um cenário que queríamos evitar com a privatização”, acrescentou.

Quanto ao processo que corre em Bruxelas e que foi espoletado pela Bombardier, Sérgio Monteiro definiu-o como uma "uma queixa feita por um concorrente que quer eliminar a EMEF do mercado". A Bombardier acusou a EMEF de ter beneficiado de auxílios ilegais de 90 milhões de euros.

Recentemente ficou a saber-se que o Tribunal de Contas (TdC) recusou o visto a 11 contratos entre a CP e a EMEF, no valor de 354 milhões de euros, por terem sido negociados enquanto decorria o processo de privatização da empresa de manutenção.

Estes contratos, com durações que iam até dez anos, conferiam receitas garantidas ao futuro comprador, pelo que o TdC considerou que poderiam dar vantagem aos investidores privados que ficassem com a empresa.

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