Do livro à selfie, a Livraria Lello cria "acessos pagos"

A conhecida Livraria Lello vai passar a controlar as entradas cobrando um valor dedutível na compra de livros

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Nelson Garrido

A partir da próxima quinta-feira, 23 de Julho, para entrar na Livraria Lello, no Porto, será necessário pagar uma entrada. A pressão turística não é uma novidade para a cidade e a Livraria Lello é um dos lugares que não escapa aos guias turísticos. A fila à porta denuncia um interior caótico repleto de turistas, inúmeras línguas estrangeiras a pairar no ar e dezenas de câmaras fotográficas e telemóveis em punho para registar os cantos e recantos de uma livraria reconhecida cá dentro e lá fora. É para tentar controlar um pouco este caos que os responsáveis pela Lello querem mudar as regras de acesso.

Com as novas regras, passam a existir duas filas de espera, de acordo com a intenção de quem entra na livraria. De um lado, estarão os portadores do cartão de cliente, que irá custar 10 euros, dedutíveis nas compras na livraria ao longo de um ano e que funciona como uma “via verde”. Na outra fila estarão os turistas e curiosos que precisarão de pagar três euros para visitar o espaço. No entanto, se estes visitantes decidirem aumentar as suas bibliotecas pessoais, enquanto visitam a Lello, o valor da entrada também será deduzido – uma possibilidade que é válida pelo prazo de um mês após a aquisição do bilhete.

“O que estamos a tentar criar aqui é a sensação e o conforto de uma livraria. Não é só tirar uma selfie e ir embora”, disse José Manuel Lello, um dos proprietários da livraria. A necessidade de tornar a Lello uma livraria e não um espaço museológico, onde os livros são pretridos em favor da fotografia, e de melhorar as condições de trabalho dos funcionários, levou a que a gerência tivesse ponderado há bastante tempo os “acessos pagos”.

Confrontado com a ideia de um cliente ocasional se dirigir à Lello, apenas à procura de um livro específico e ter de pagar uma quantia para o fazer, o proprietário considera que a pessoa pode sempre telefonar antes, consultar a página da Internet ou dirigir-se até ao “centro de acolhimento”, em frente à Lello, do outro lado da rua. A experiência da procura in loco poderá desta forma não existir, mas o tempo ganho pelos portadores do cartão de “via verde” é suficiente para o cliente ponderar adquirir outro livro, argumenta José Lello.

O proprietário garante que não se trata de “obrigar” a comprar, mas se a pessoa pretender justificar o dinheiro gasto no acesso, para lá do prazer da visita, os responsáveis pela Lello “ficariam encantados”. “Só será uma entrada paga, se a pessoa decidir ir a uma livraria e não adquirir um livro”.

A emblemática escadaria vermelha no interior, que J.K. Rowling admite ter inspirado o cenário da saga Harry Potter, está quase sempre congestionada. Se houvesse semáforos, a circulação tornar-se-ia mais fácil. Pára-se, sobe-se mais um degrau, espera-se não ser um intruso em mais uma fotografia alheia e o percurso continua até ao topo. “Quando um funcionário vem com vários livros empilhados, torna-se complicado subir as escadas”, admite José Lello.

Maria de Céu está de visita ao Porto e à livraria. Embora não saiba muito bem que tipo de impacto a medida terá no estabelecimento, diz que se voltasse não gastaria três euros na entrada. “As pessoas vêm mais para visitar e não tanto para comprar”, afirma.

Ana e Rafael vêm do Rio de Janeiro, estão pela primeira vez no Porto e consideram a medida positiva. Ambos pagariam a entrada, porque “perde-se a livraria com a quantidade de pessoas a tirarem fotografias”.

A 23 de Julho entra em vigor o acesso pago, com programação cultural na livraria até à meia-noite. As entradas podem ser adquiridas na Internet ou no centro de acolhimento.

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