Três vezes por semana, 17 mulheres tiram o "niqab" para fazer ginástica. Têm entre os 16 e os 50 anos e durante uma hora entregam-se aos "push ups", "abs", "cardio" e zumba. Actividades físicas normais no mundo actual não fossem acontecer num campo de refugiados palestiniano, onde pela primeira vez na vida um grupo de mulheres fez exercício físico.
Uma portuguesa, uma espanhola e uma polaca são as responsáveis por pôr estas mulheres a mexer. Luísa, Catalina e Kamila são voluntárias ao abrigo do Serviço de Voluntariado Europeu (SVE) e todas as semanas viajam desde a Amã até Jerash. Também conhecido como Gaza Camp, este é um dos mais antigos campos de refugiados palestinianos na Jordânia, onde vivem, segundo dados oficiais, mais de 24 mil pessoas.
“Yala nissuan! Vamos lá mulheres!” chama em árabe Luísa para a aula das dez da manhã. Os "niqabs" negros, que apenas deixam os olhos a descoberto, já estão religiosamente pendurados e agora é altura de aquecer os corpos. "Leggings", t-shirts e por vezes pijamas, o importante é sentirem-se confortáveis durante um ritual que, quando começou, há nove meses, causou muito embaraço. No início, quando aqui chegaram, as três europeias não sabiam uma única palavra em árabe. “Basicamente usávamos 'body language'. Elas eram muito descoordenadas e limitavam-se a imitar tudo. Agora já misturamos inglês e árabe”, explica a portuguesa licenciada em criminologia.
Casadas, donas de casa, com filhos e seguidoras do Islão. É este o perfil das “aprendizes” de desporto do Campo de Refugiados de Jerash. “Estas mulheres são muito felizes quando fazem exercício”, diz Catalina, com um brilhozinho nos olhos. “Dentro do ginásio são mulheres normais, com curvas, que saltam e adoram dançar zumba. Lá fora, nas ruas, usam o "niqab" e na maioria das vezes não as reconhecemos”, mas o choque cultural, garante a espanhola de 24 anos, já foi ultrapassado. “Não tínhamos ideia de como seria um campo de refugiados, mas com o tempo percebemos que no meio deste caos e, apesar das dificuldades, paira uma certa normalidade ”, declara a integradora social.
Até hoje, o caso de maior sucesso é o de Sana, de 37 anos, que no início do programa pesava 123 quilogramas. Em oito meses perdeu cerca de 25 quilogramas. “É uma das alunas mais assíduas. Não falha uma única aula”, conta Kamila com orgulho. Para tal contribuiu, segundo a voluntária polaca, uma maior consciencialização da mulher muçulmana com os cuidados a ter com o corpo e a alimentação. “A comida árabe é deliciosa, mas muito calórica”, explica a estudante de 19 anos.
Sensibilização que é complementada a outros níveis através do "Circle of Discussions around women in the Mena Region". Uma discussão aberta que tem lugar mensalmente, em Amã, e serve para quebrar estereótipos sobre a mulher do Médio Oriente e Norte de África. “No fundo, dar voz a diferentes grupos de mulheres que se estão a movimentar a favor da igualdade e contra um sistema que é considerado patriarcal”, evidencia Luísa.
Uma das experiências mais incríveis na vida destas três jovens europeias está prestes a chegar ao fim, mas há esperança que o projecto prossiga o seu caminho pela mão destas mulheres. “Aqui sentimos que ninguém está a ser ajudado. Há uma entrega mútua, caso contrário jamais funcionaria”, concordam as três amigas.
O modesto ginásio, onde até agora só entravam homens, estará fechado durante o Ramadão. No entanto, nem voluntárias nem alunas estão dispostas a prescindir do seu "Riyada", a palavra em árabe para desporto. "Inshallah!" Se deus quiser!