Refugiados sírios já são mais de quatro milhões e vão receber ainda menos ajudas

Sem nenhuma perspectiva de resolução do conflito, a União Europeia “será obrigada a criar mecanismos mais fortes para assumir inteiramente as suas responsabilidades”, diz António Guterres.

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Refugiada síria numa rua de Istambul Bulent Kilic/AFP

Os números oficiais estão sempre atrasados; se na Jordânia, por exemplo, já é difícil estar sem passar por um processo de registo, a situação é muito diferente no Líbano ou na Turquia, onde muita gente chega em fuga sem passar por um posto fronteiriço e nunca percebe que pode registar-se e solicitar auxílio.

São 4.013.000 os registados pelo Alto Comissariado da ONU para os Refugiados nos países vizinhos da Síria – em breve, todos vão receber ainda menos ajuda das organizações internacionais.

O ACNUR tinha estimado que precisava de 5500 milhões de euros para 2015, mas ainda só tem 24% desse valor. Na prática, isso significa que os sírios que sobreviveram às bombas de Bashar al-Assad, à perseguição de jihadistas ou à fome “vão enfrentar cortes duros na ajuda alimentar, terão muitas dificuldades para aceder a serviços de saúde de urgência e não poderão enviar os seus filhos à escola”.

“É a população mais numerosa de refugiados provocada por um só conflito numa geração”, diz o Alto Comissário, António Guterres. “É uma população que necessita do apoio do mundo mas que, em vez disso, vive em condições terríveis, mergulhando cada vez mais na pobreza.”

Sim, os europeus não se entenderam para acolher 60 mil pessoas num conflito que já matou mais de 230 mil e obrigou quase 11 milhões a fugir de casa (dentro da Síria são pelo menos 7,6 milhões os deslocados).

“A deterioração das condições empurra cada vez mais refugiados na direcção da Europa, apesar de a grande maioria permanecer na região”, avisou ainda Guterres, insistindo numa mensagem que nunca fica muito tempo sem repetir. “Não podemos deixar que os refugiados e as comunidades que os acolhem se afundem cada vez mais no desespero.”

É precisamente o que acontece há quatro anos e meio. Na Jordânia, por exemplo, onde o Governo pediu ao ACNUR a construção de dois gigantescos campos de refugiados (Zaatari, que chegou a receber 150 mil pessoas, tornando-se no segundo maior campo do mundo menos em menos de um ano, e Azraq), há 630 mil refugiados sírios. Mais de 400 mil estão fora dos campos e destes, 86% vive abaixo do limiar da pobreza. No Líbano, onde não há campos oficiais, 55% dos 1,2 milhões de sírios vive em “abrigos sem condições”.

78 mil na Grécia

Por tudo isto, Guterres voltou a pedir “uma resposta robusta” e “mais eficaz” da Europa. Num encontro no Luxemburgo com ministros do Interior europeus para discutir o destino dos tais 60 mil refugiados, o Alto Comissário elogiou a Alemanha, que em 2014 registou 200 mil pedidos de asilo, incluindo 41 mil de sírios.

Mas na União, notou Guterres, é a Grécia de todas as crises que está mais exposta à guerra síria, tendo recebido “78 mil pessoas” nas suas costas só este ano, a maioria sírios. Isso exige da Europa uma solidariedade “muito mais forte”.

No mundo com 60 milhões de deslocados e refugiados – metade são crianças –, é da Síria que mais se foge e esta tragédia fez da Turquia o primeiro país de acolhimento de refugiados. São mais de 1,8 milhões os sírios espalhados pelo país, uma ínfima minoria dos quais encontra vagas nos campos que o Governo não pára de erguer desde 2011. Já são 25 mas neles só cabem 278 mil pessoas.

Quarta-feira, as autoridades turcas anunciaram estar a construir o  maior campo até agora. “Um campo para 55 mil pessoas está quase terminado em Kilis”, perto da fronteira. O objectivo não é abrigar as centenas de milhares que vivem em edifícios abandonados, parques ou em casas ocupadas. O novo campo antecipa uma nova chegada caso os jihadistas do Estado Islâmico avancem mais na direcção da fronteira a partir da província de Alepo, onde têm conquistado território aos rebeldes.

“No cenário de movimentos da população aqui, cem mil pessoas vão chegar à Turquia”, estima Fuat Oktay, chefe da agência para a gestão de catástrofes, citado pelo jornal Miliyet.

Este problema “não vai diminuir, claramente não há nenhuma perspectiva de resolução do conflito”, disse ainda o ex-primeiro-ministro português esta quinta-feira. Por isso, queiram ou não, “a UE e os Estados-membros serão obrigados a criar mecanismos mais fortes para assumirem inteiramente as suas responsabilidades”. 
 

   

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