O ministro que declarou guerra às Forças Armadas “insustentáveis”

O titular da Defesa não poupou nos cortes e teve um mandato contestado quase desde o início.

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Aguiar-Branco e os militares, uma relação marcada pela polémica Enric Vives-Rubio

Foi também nesse discurso que apresentou os seus objectivos. “Tal como hoje existem, as Forças Armadas não são sustentáveis”, avisou na altura. E tratou, ao longo de quatro anos, de ensaiar uma reforma legislativa que modernizasse a estrutura militar. Partiu do Conceito Estratégico até chegar ao Estatuto dos Militares (EMFAR). Pelo meio produziu o documento “Defesa 2020” que deu corpo à reforma pretendida. Constituíram-se, no papel, “três conjuntos de forças e meios” – Força de Reacção Imediata, Forças Permanentes em Acções de Soberania e Conjunto Modular de Forças – por forma a concretizar o objectivo de uma estrutura  de “organização modular e flexível”. Definiu o “compromisso orçamental estável” para Defesa em 1,1% do PIB, com a possibilidade de variação de “+/-0,1%”. Definiu o “efectivo máximo das Forças Armadas entre os 30 e 32 mil militares”. E assumiu o objectivo de reduzir em “30% os comandos, unidades e estabelecimentos”. Ao nível da organização, reforçou os poderes do Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas sobre os três ramos. E decidiu a fusão das instituições de ensino superior num único Instituto Universitário Militar.

O esforço de fusão não se limitou aos estudos. Concretizou a sempre adiada ideia de juntar os hospitais militares numa única entidade e local – o Hospital das Forças Armadas, que passou a operar nas instalações da Força Aérea com o encerramento progressivo das restantes instalações.

Mas o mandato fica também marcado pelo cancelamento de contratos de reequipamento. Foi durante o ano de 2012, que Aguiar-Branco congelou investimentos previstos com o argumento das “dificuldades financeiras” do Estado português.

Anulou um concurso de fornecimento de armas ligeiras para as Forças Armadas portuguesas que pretendia a substituição das G-3.Cancelou a compra de dez helicópteros NH90 para o Exército para poupar 420 milhões de euros com a desistência. Denunciou também o remanescente do contrato dos blindados Pandur II, requerendo um reembolso de 55 milhões de euros por incumprimento do fornecedor. O exército ficou com as 166 Pandur já entregues, terminando com as modificações em curso em 47 desses veículos, tendo pago por estes cerca de 233 milhões de euros. O ministro cancelou igualmente a encomenda de dez navios-patrulha oceânicos aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo. Pouco tempo depois, concretizaria o fim da empresa – pagando mais de 30 milhões de euros de indemnizações aos trabalhadores – e o anúncio da subconcessão à Martifer. A decisão provocou um longo braço-de-ferro com a eurodeputada socialista Ana Gomes, que acusou o ministro de ter uma agenda escondida por trás da opção de não recorrer a todos os mecanismos europeus para salvar os estaleiros. No ano passado, assinou um contrato de 12 milhões de euros, para a construção de dois desses navios, celebrado com a West Sea, que assumira, esse ano, a subconcessão. Anunciaria também a aquisição de quatro navios-patrulha usados pela Dinamarca. A sua reconversão eleva o investimento aos 28 milhões de euros.

A contestação ao ministro manteve-se ao longo do mandato, ultrapassando mesmo a esfera das associações militares. Pela segunda vez em dois anos, 150 oficiais dos três ramos, entre os quais almirantes e generais, incluindo seis ex-chefes de ramos, participaram num jantar de reflexão sobre a condição militar e a situação da defesa nacional, que teve o ex-ministro da Defesa, general Loureiro dos Santos, como porta-voz. A lista de falhas apresentada vai desde a ausência de “meios militares necessários para responder às ameaças com que nos podemos confrontar” até ao sistema de promoções, passando pela assistência na saúde e redução dos apoios sociais. 

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