Parlamento não agenda iniciativa legislativa de cidadãos contra aborto

Foi tomada decisão, por unanimidade, de perguntar se os proponentes preferem retomar a iniciativa na próxima legislatura. Isilda Pegado discorda da decisão e considera que o argumento apresentado é "completamente descabido".

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Esta tarde, a discussão subiu de tom no Parlamento Nuno Ferreira Santos

Na conferência de líderes desta quarta-feira, o presidente da Assembleia da República em exercício, Guilherme Silva, sugeriu perguntar aos proponentes da iniciativa legislativa contra a actual regulamentação da lei do aborto se estão disponíveis para adiar o debate e a votação para a próxima legislatura, já que não é possível garantir que o processo fique fechado até 22 ou 23 de Julho, as datas previstas para o último plenário de votações. A sugestão foi aceite por unanimidade, segundo o secretário da mesa da Assembleia da República, Duarte Pacheco. 

Caso os autores da proposta – que asseguram ter reunido 50 mil assinaturas – pretendam forçar a votação ainda este mês, o Parlamento não garante, em caso de ser aprovado na generalidade, que o processo fique concluído até ao fim da legislatura, correndo o risco de cair e só poder ser retomado com um novo processo de recolha de assinaturas. Critério diferente para situação idêntica foi usado para duas propostas da Assembleia Legislativa dos Açores, uma sobre a duração do tempo de trabalho da função pública (dia 26 deste mês) e outra sobre o aumento do rendimento mínimo mensal (dia 3 de Julho). 

Duarte Pacheco assumiu que será difícil agendar a iniciativa legislativa de cidadãos ainda nesta legislatura. "Diria que os agendamentos estão fechados", afirmou. 

A proposta deu entrada no Parlamento em Fevereiro, mas a indicação de que podia ser votada na generalidade (depois de concluído um relatório de admissibilidade) só chegou ao gabinete da Presidente no passado dia 3 de Junho. 

Entre outras medidas, este grupo de cidadãos defende que a interrupção voluntária de gravidez até às dez semanas deixe de ser gratuita, que as mulheres que estão a pensar abortar tenham um aconselhamento prévio feito por psicólogos e técnicos sociais e que vejam e assinem as ecografias feitas para determinação do tempo de gestação.

Querem, por exemplo, que as mulheres que abortam deixem de gozar licenças de parentalidade pagas a 100% pela Segurança Social e que o pai também seja ouvido. Pretendem “reconhecer o bebé, antes do nascimento, como membro do agregado familiar e com direito a nascer” e entendem que um médico objector de consciência deve poder participar na consulta pré-aborto. O projecto-lei inclui ainda a criação de uma Comissão e de um Plano Nacional de Apoio pelo Direito a Nascer. 

Esta proposta "pelo direito a nascer" diz respeito a uma causa que tem simpatizantes sobretudo nas bancadas do CDS e do PSD. O instrumento que este grupo usou para levar o tema ao Parlamento é a iniciativa legislativa de cidadãos, que permite apresentar propostas à Assembleia da República, desde que se reúna 35 mil assinaturas. 

"Falta de respeito pelos cidadãos"
A presidente da Federação Portuguesa pela Vida está “estupefacta” com a decisão que diz representar “uma ausência de democracia e uma falta de respeito pelos cidadãos”. Lamentando que “o poder não goste de ouvir o povo”, Isilda Pegado, que faz parte da comissão representativa da iniciativa, defende que o argumento apresentado é “completamente descabido” e ainda tem esperança que o Parlamento reconsidere.

“Esta iniciativa deu entrada em Fevereiro no Parlamento, esteve parada em várias comissões, nomeadamente na saúde, dirigida pelo PS, na qual esteve parada um mês. Mas, por decisão da Presidente da Assembleia da República, foi dado carácter de urgência à iniciativa e encurtou-se o período de audição pública. E agora o Parlamento vem dizer isto?”, questiona.

Para Isilda Pegado, “a iniciativa deve ser continuada”: “Não reconheço legitimidade legal à interpretação dada, uma vez que o projecto-lei pode subir ao plenário e, caso seja aprovado, baixa à especialidade. E, na próxima legislatura, é concluída. Não caduca se a votação final ainda não tiver sido feita”, argumenta.

Ainda sem uma posição oficial tomada, o conjunto de cidadãos vai, para já, aguardar que a Assembleia da República os informe. “Espero que o Parlamento repense aquilo que fez. Mas a minha posição individual é a de que isto não tem qualquer cabimento legal e, por isso, acredito que ainda volte atrás”, diz a presidente da Federação Portuguesa pela Vida.

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