Câmara de Vila do Conde troca dois terrenos por três metros de afastamento de prédio à Igreja das Caxinas

PSD diz que o acordo garante 72 apartamentos ao construtor e promete queixar-se ao Tribunal de Contas. Para domingo está agendada uma reunião da população para decidir eventuais formas de luta.

A minuta do acordo foi aprovada nesta segunda-feira pela maioria socialista liderada por Elisa Ferraz – faltou um dos vereadores do PS -, mas após a decisão, Miguel Paiva, em nome dos vereadores do PSD, que são os únicos da oposição e que votaram contra, anunciou que o seu partido vai solicitar ao Tribunal de Contas e à Inspecção-Geral de Finanças que investiguem os termos deste "contrato leonino".

Para o autarca social-democrata os dois terrenos localizados “na melhor zona de construção de Vila do Conde” têm uma “capacidade construtiva de 72 apartamentos [trinta num e 32 noutro]”. Os lotes "oferecidos" ao promotor permitem a construção de um total de 6785 metros quadrados de construção, enquanto que o município obtém somente 225 m2. "Estimamos que os dois terrenos não tenham um valor comercial inferior a um milhão de euros. Este acordo é penalizador do erário público e o PSD vai denunciar junto das entidades de supervisão”, acrescentou Miguel Paiva.

Por sua vez, Elisa Ferraz preferiu um comunicado onde garante “ a legalidade e transparência” de todo o processo que culminou numa solução com “equidade”. O acordo “salvaguarda as legítimas preocupação das gentes das Caxinas, não pondo em causa o desenvolvimento equilibrado do concelho, nem a legalidade dos actos praticados”, lê-se no texto.   

Já Fernanda Araújo, do grupo de caxineiros que tem contestado publicamente o prédio - chamam-lhe “uma parede” que tapa uma igreja que, pela sua forma de barco, tem uma vincada expressão arquitectónica – disse que vai ser agendada para o próximo domingo à tarde um encontro com a população para que esta decida as eventuais formas de luta. “Se calhar, nesta altura, concordo com as pessoas que disseram que devíamos fazer manifestações”, afirmou Fernanda Araújo. "Saíu o euromilhões” ao construtor, acrescentou, salientando que o grupo ao qual pertence se sente “insultado”.

O acordo aprovado  implica que o promotor  – a empresa Nova Vaga, Construções Imobiliárias - afaste o edifício, em relação ao muro da igreja, num total de sete metros, ou seja, um recuo de mais três metros face que foi definido no licenciamento inicial (quatro metros). Para “compensar” os prejuízos causados ao promotor – que vai poder prosseguir a construção do prédio com 16 metros de altura -, o município vai entregar-lhe dois lotes a título de indemnização, ambos situados na rua Cidade de Portalegre, uma zona pejada de construções recentes, no trajecto do antigo circuito automóvel, entre o rio e o mar. Os lotes a entregar ao promotor têm 1453 m2 e 630 m2, enquanto que a totalidade do lote das Caxinas  tem apenas 560 m2.  

Para justificar o pedido de alteração da estrutura do prédio, já depois de a construção ter começado, a câmara invoca, no texto do acordo, o “interesse público municipal” que representa o alargamento do arruamento pedonal que vai surgir entre o muro da igreja e edifício, ligando uma artéria interior – a Avenida Carlos Pinto Ferreira – à estrada marginal (Av. Infante D. Henrique). Uma nova passagem considerada “fundamental para a mobilidade daquela zona da cidade”, não obstante existirem duas vias paralelas próximas: uma encostada à parte sul da igreja (Av. António Bento Martins Júnior) e outra (rua do senhor dos Navegantes) a ladear o prédio erigido pela mesma empresa, colado pelo norte, ao imóvel que está a provocar polémica. 

Após a assinatura do acordo, os terrenos da rua Cidade de Portalegre têm de ser entregues à empresa através de uma escritura pública a ser formalizada num prazo de dez dias. Caso se registe qualquer atraso não imputável à Nova Vaga, a câmara obriga-se a pagar 30 mil euros por mês ao promotor. Miguel Paiva disse que a Câmara conta formalizar o negócio na próxima Assembleia Municipal.   

A câmara vai pagar agora uma indemnização para corrigir algo que ela própria licenciou, em Abril do ano passado: a edificação de um imóvel com rés-do-chão (lojas para comércio e serviços), mais quatro andares - total de 16 fracções - e dois pisos abaixo da cota de soleira, a uma distância de quatro metros da Igreja. Quando o prédio começou a ganhar forma eclodiu um movimento popular de contestação que levou os responsáveis camarários a tentar rectificar aquilo que foi qualificado como um “erro urbanístico” pelo anterior líder do executivo e atual presidente da assembleia municipal, Mário Almeida. Isto apesar de ter sido durante o seu mandato que ocorreram a operação de loteamento da área e a solicitação à assembleia para a venda do espaço a norte da Igreja. Esta transacção foi concretizada já depois das eleições autárquicas, com Elisa Ferraz na presidência do município, por 612 mil euros. 

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