Francesco Sylos Labini: “Uma descoberta feita no deserto não ilumina nada”
De onde deve vir o financiamento científico?
A contribuição financeira para a investigação vem em parte do Estado e em parte do sector privado. O problema é que a parte vinda do Estado costuma ser muito pequena. Em países como os EUA ou a Alemanha, o financiamento vindo do Estado é o dobro do do sector privado.
Há um problema europeu em relação ao financiamento da ciência?
Há pouco dinheiro, especialmente para os países que estão num estado crítico. Mas também existe um problema na distribuição do dinheiro e isso é um problema de política de ciência. Esta política pode determinar se queremos mitigar as desigualdades ou aumentá-las. Há uma maior quantidade de dinheiro da União Europeia que vai para o Norte e não para o Sul. E mesmo dentro da Alemanha, por exemplo, o dinheiro é direccionado para algumas regiões.
Como se muda isto?
É difícil fazer pressão a nível europeu. Enquanto existir uma opinião pública ao nível de cada país, tanto em Portugal como em Itália ou Espanha, não existe uma opinião pública que possa fazer pressão coordenada a nível europeu. Mas pode-se organizar uma rede europeia de investigadores e cientistas. Os países do Sul [com dívida] poderão exigir à Europa que o dinheiro para pagar a dívida vá para a ciência.
E a nível nacional?
Isso depende. Em Itália, tal como em Portugal, há um problema de precariedade. Não há trabalho para os jovens.
Mas isso é sempre uma questão de dinheiro.
O dinheiro de que estamos a falar aqui é uma quantidade relativamente baixa. Por isso, acho que, se procurarmos, conseguimos encontrar esse dinheiro que dá condições para o crescimento.
O que está errado na retórica da excelência?
Se queremos dar dinheiro a quem é excelente, o que se está a fazer é dar dinheiro a pessoas que foram excelentes no passado. Só depois é possível identificá-las como sendo excelentes. O problema é dar o dinheiro a pessoas que vão ser excelentes amanhã. Hoje, essas pessoas são investigadores iguais aos outros. Se olharmos para a história da ciência, vemos que a maioria das descobertas foram feitas graças a financiamento estrutural, não foram financiadas com muito dinheiro.
Qual é a alternativa?
Um país deve assegurar o financiamento estrutural da ciência.
Num artigo que publicou mostra que os países mais desenvolvidos são aqueles que apostam numa ciência mais diversificada. Porquê?
Em investigação, pode-se imaginar a diversificação como muitas luzes pequenas. Uma nova descoberta não é mais do que um pequeno passo que dá uma nova luz. Quando existem muitas outras pequenas luzes, esta descoberta revela alguma coisa de novo. Mas se fizermos a mesma descoberta no deserto, então não se ilumina nada.