Sendero Luminoso “reduzido” oficialmente a grupo de traficantes

Governo dos EUA passou a incluir a guerrilha maoísta peruana na lista de organizações narco-terroristas.

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O camarada Artemio, o último dirigente fundador do Sendero em liberdade, foi preso em 2012 Reuters

Foram ainda acrescentados três líderes do grupo à lista Kingpin – que agrupa alguns dos mais relevantes traficantes de narcóticos do mundo –, o que implica o congelamento dos seus activos financeiros nos EUA.

O grupo permanece na lista de organizações terroristas do Departamento de Estado, onde está desde 1997, mas a inclusão da nova nomenclatura marca uma “evolução” no seu desenvolvimento recente. “Desde a sua fundação, há mais de três décadas, o Sendero Luminoso evoluiu de um grupo militante terrorista para uma organização criminosa narco-terrorista responsável pelo tráfico de cocaína através da América do Sul”, disse o director interino do Gabinete de Controlo de Activos Estrangeiros do Tesouro, John Smith.

O Governo norte-americano justifica a inclusão do Sendero Luminoso na lista de narco-traficantes por várias razões que apontam para a perda de força do grupo e a maior concentração de esforços no negócio do tráfico de droga. Num país que é desde 2013 o maior produtor de cocaína – depois de ultrapassar a Colômbia –, “o Sendero Luminoso aplica taxas no cultivo [de coca], processamento e transporte de cocaína através do centro-sul do Peru”.

A identificação do Sendero Luminoso com o narco-tráfico não é propriamente uma novidade, mas a descrição do Tesouro norte-americano mostra um grupo praticamente reduzido a essa dimensão e muito longe da ameaça que constituiu. No seu auge, o Sendero Luminoso chegou a ter dez mil membros activos, quando hoje terá pouco mais de 300 confinados à região dos vales dos rios Apurimac, Ene e Mantaro – denominada VRAEM, onde, de acordo com a ONU, são produzidas cerca de 200 toneladas anuais de cocaína.

Fundado no final dos anos 1960 como um pequeno grupo revolucionário liderado por um professor de filosofia, o Sendero Luminoso defendia o derrube das autoridades governamentais peruanas e a sua substituição por um regime comunista, inspirado pela experiência cubana. Para alcançar esse desígnio, o grupo actuava de forma altamente violenta. Conta-se, por exemplo, que para poupar munições, por vezes, as vítimas do Sendero eram mortas a golpes de machete.

A queda do Sendero Luminoso veio apenas após o “golpe” constitucional do Presidente Alberto Fujimori, que em 1992 dissolveu o parlamento e chamou a si amplos poderes. Foi lançada então uma campanha impiedosa contra todos aqueles minimamente envolvidos com o grupo armado, considerado inimigo número um da sociedade peruana – um processo durante o qual o próprio Exército cometeu abusos que ainda hoje são avaliados por uma comissão de memória histórica. Uma das conclusões é de que o Exército foi responsável por mais de um terço das 70 mil mortes em vinte anos de luta armada.

O início do fim do Sendero Luminoso coincidiu com a prisão de Abimael Guzmán, o histórico líder e principal ideólogo do grupo. Guzmán lançou um apelo à reconciliação e ao abandono das armas que criou uma fractura no Sendero Luminoso, entre os que acederam à mensagem do líder e os que apoiavam a continuação da luta armada. “Destacaram-se duas facções, ambas sedeadas em zonas de produção de cocaína: no Alto Huallaga, na selva norte, e no VRAEM, na selva central e até ao sul”, explica o investigador da Universidade Católica do Peru, Nicolás Zevallos, ao jornal digital argentino Infobae.

Actualmente apenas permanece activa a célula do VRAEM, onde intensificaram a sua ligação ao tráfico de cocaína. Zevallos defende que “os seus objectivos económicos se sobrepõem ao seu discurso político”. O recurso à violência é cada vez mais raro e resume-se à defesa do controlo sobre a produção de cocaína. Na sequência de uma operação militar, o Sendero Luminoso matou uma dezena de soldados numa emboscada em Outubro de 2008 – o maior ataque do grupo desde o início do século. A detenção do “camarada Artemio”, o último dirigente fundador do Sendero em liberdade, em Fevereiro de 2012 constituiu o derradeiro revés para o grupo.

A facção dos que preferiram a via pacífica defendida por Guzmán fundou em 2009 o Movimento pela Amnistia e Direitos Fundamentais (Movadef), que fez da libertação dos presos políticos – incluindo o líder histórico, condenado a prisão perpétua – o seu grande objectivo.

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