Fugiu a Salazar e viajou para crescer

Sair da zona de conforto e enfrentar novas realidades é a melhor preparação que um jovem pode ter para mais tarde ingressar no mercado de trabalho

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Chegara o grande dia. Estávamos em 1956 e António Valadas tinha desejado este dia quente de Agosto com todas as suas forças.

Aquilo que os pais pensaram ser uma ideia surrealista e efémera de adolescente de 16 anos caiu que nem uma bomba no dia em que chegara a casa a carta que anunciava que o filho tinha sido admitido no programa da American Field Service. António tornar-se-ia um dos primeiros portugueses a participar num programa de intercâmbio internacional.

A mãe chorará inconsolável. Afinal, estávamos na década de 50, Salazar chefiava um regime ditatorial e nem era suposto os filhos abandonarem a terra. Nem existiam telemóveis. Nem Internet. Nem Facebook. Nem Skype. Nem assim tantos voos internacionais com destino aos EUA.

Mas uma conversa séria e sensata fê-los renderem-se ao espírito aventureiro de António e à sua enorme vontade de aprender. E, na verdade, nunca assumiram o que aquele dia quente de Agosto lhes custaria.

Embarcara para Los Angeles com mais sete rapazes. Sim, só rapazes, visto que, à data, Portugal apenas permitia a inscrição de indivíduos do sexo masculino. E era o único país com esta limitação.

Foi nos EUA que percebeu a ditadura em que Portugal vivia e estranhou o enorme diferencial de conceitos comportamentais. Mas a integração na escola foi fácil. A existência de alunos em intercâmbio era tão rara que rapidamente adquiriu o estatuto de celebridade, “e maximizei isso no relacionamento com as miúdas”, admite divertido. Afinal, frequentava uma instituição de ensino com mais raparigas que rapazes, algo que estava em total oposição à realidade portuguesa da época, revelando dinâmicas de “dating” também bem diferentes.

Só se sentia intimidado à mesa com a nova família americana. O à-vontade com que se falava de assuntos que eram tabus na cultura portuguesa constrangiam-no.

Passou um ano. Estudou, melhorou o inglês, fez novos amigos, viveu as experiências mais incríveis da sua vida e à mãe telefonou uma só vez.

A experiência intercultural

Voltou. Diferente, claro. E a maior diferença era que o sangue que lhe corria nas veias passara a ter glóbulos aventureiros. Por isso, nunca mais parou. Ainda antes de ingressar na universidade viajou durante dois meses à boleia pela Europa. Sim, ainda estávamos na década de 50.

Mais tarde, começou por colaborar com a Instituição através da qual tinha ido para os EUA e rapidamente percebeu que queria ajudar pessoas a viverem experiências internacionais para o resto da sua vida.

Fundou a MultiWay, uma empresa que oferece cursos e oportunidades de trabalho por todo o mundo, das línguas à moda, da hotelaria à música e, até hoje, milhares de jovens já integraram programas internacionais com a ajuda da sua empresa.

Aos 74 anos, quando questionado sobre que conselho daria aos jovens de hoje, o fundador e CEO da MultiWay é peremptório. “Nenhum jovem devia iniciar a sua vida activa sem ter tido uma experiência intercultural de média ou longa duração. O conceito de gap year está ainda a dar os primeiros passos no nosso país. Nos países mais desenvolvidos é considerado fundamental e nalguns é mesmo subsidiado pelo Governo. Sair da zona de conforto e enfrentar novas realidades é a melhor preparação que um jovem pode ter para mais tarde ingressar no mercado de trabalho. E as empresas sabem-no.”

Outro bom conselho: é bom ouvir os conselhos dos mais velhos.

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