Vídeo de 13 minutos de rapaz agredido por outros jovens gera onda de indignação

Jovem apresentou queixa à PSP nesta quarta-feira, quase um ano depois das agressões. Caso ocorreu na Figueira da Foz e a PSP, que reforçou a segurança nas escolas do concelho, já estava a investigar após alguns agentes terem descoberto as imagens no Facebook.

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Este é um "frame" do vídeo em que se vê o aluno a ser agredido DR

No vídeo, que dura 13 minutos, aparecem duas adolescentes a agredir um rapaz. Há várias pausas, nomeadamente quando se ouvem carros a passar ou quando os próprios jovens alertam que alguém se aproxima. As agressões são levadas a cabo maioritariamente pelas duas jovens, mas no vídeo aparecem ainda pelo menos mais duas raparigas e dois rapazes. Durante todo o tempo, o rapaz que é agredido permanece praticamente quieto e não tenta fugir ou responder às agressões, estando grande parte do vídeo com as mãos atrás das costas e encostado a uma parede.

Quase um ano depois das agressões terem ocorrido, o jovem decidiu nesta quarta-feira apresentar queixa, convencido por algumas pessoas e mesmo por colegas de escola que ficaram indignados com o video, adiantou fonte da PSP. Na manhã desta quarta-feira, acompanhado pelos pais, deslocou-se à esquadra da Figueira da Foz. "Foi hoje formalizado o procedimento criminal por parte da vítima, a qual se deslocou pessoalmente às instalações policiais para o efeito e confirmou o momento e circunstâncias do ocorrido”, diz um comunicado da PSP.

A PSP, porém, face à grande divulgação do vídeo nas redes sociais, já estava a investigar o caso desde terça-feira, depois de alguns agentes terem visionado no Facebook as imagens que terão sido gravadas em Junho de 2014. Até agora, a polícia não encontra motivos para aquilo que os agentes consideram ter sido um castigo organizado pelos restantes jovens. 

Nas poucas horas que se seguiram à divulgação do vídeo, a PSP identificou todos os suspeitos. Entre os intervenientes estão cinco raparigas e três rapazes entre os 15 e os 19 anos. Também a segurança policial nas escolas da Figueira da Foz foi reforçada, como medida preventiva.

Em reacção ao sucedido, o Ministério Público (MP) decidiu investigar o caso em dois inquéritos diferentes. Relativamente aos menores de 16 anos, foi instaurado um “inquérito tutelar educativo no MP da Figueira da Foz”, confirmou a Procuradoria-Geral da República (PGR). Por outro lado, “foi também apresentada no DIAP de Coimbra uma participação, relativamente aos maiores de 16 anos, pelas agressões e pela divulgação das imagens”, segundo a PGR.

Quanto aos agressores maiores de 16 anos estarão em causa crimes de sequestro e ofensa à integridade física, segundo fonte policial. O crime de sequestro é de natureza pública. Não depende, por isso, de queixa, como aconteceria se o crime fosse semipúblico. Nesse caso, o direito de apresentar queixa já teria caducado, uma vez que os factos ocorreram há mais de seis meses. Também por serem vários os autores das agressões, poderá estar em causa o crime de ofensa à integridade física qualificada, que prevê uma moldura penal até aos quatro anos de prisão.

Os restantes jovens, menores de 16 anos, verão os seus processos correr no Tribunal de Família e Menores de Coimbra. Na noite da divulgação do vídeo, dois progenitores de duas das envolvidas decidiram ir à esquadra da PSP para dar conta do sucedido. Jorge Ferreira, pai de uma das agressoras, em declarações à SIC pediu desculpa pelo comportamento da filha e disse que estava longe de imaginar o caso “inconcebível e impensável”. Contactado pelo PÚBLICO, Jorge Ferreira escusou-se a prestar mais declarações, justificando que não quer “inflamar” mais o caso.

Até agora, a polícia não encontra motivos para aquilo que os agentes consideram ter sido um castigo organizado pelos restantes jovens. Os adolescentes foram ouvidos na tarde de ontem na PSP da Figueira da Foz, onde foi também inquirido o jovem agredido. Saiu daquela esquadra pelas 16h50 num carro acompanhado por dois polícias. 

O vídeo que regista a violência terá sido gravado junto à Rua Dr. Calado, no Bairro Novo, Figueira da Foz. Ao PÚBLICO o proprietário do Bar Marujo, localizado naquela rua há 25 anos, disse conhecer os jovens envolvidos no caso, com quem, contudo, nunca teve problemas.

"Dá-lhe mais"
As imagens não têm muitos diálogos, ouvindo-se apenas frases soltas como uma das agressoras a dizer ao jovem “isto é força, isto é força. Queres ver com mais força?” e uma outra a sugerir “dá-lhe mais” enquanto a primeira adianta que vai mudar de lado “porque já está a doer a mão”. Depois chama uma colega para trocar de lugar e contam as estaladas, mas a contagem é quase sempre “um, um” e só quando há mais força se passa a “dois” ou “um, dois, três”. Só mais à frente é apontada uma possível razão para a agressão. “É que a mim não me apetece andar à chapada. Apetece-me andar à porrada, sabes porquê? Porque tu meteste-me nojo”, diz uma das agressoras. Neste momento, o jovem diz que não fez nada e ouve-se a voz de outro rapaz a dizer “metes-te com ela, metes-te comigo, basicamente”.

A publicação do vídeo gerou, até ao final do dia de quarta-feira, mais de 70 mil partilhas e dois milhões de visualizações na rede social Facebook. Na maior parte dos casos, os comentários são de indignação com a situação, condenação da violência e apoio ao jovem agredido, com pedidos para intervenção das autoridades. Algumas das pessoas dizem que terão dado conhecimento da situação à PSP da Figueira da Foz e à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ) da Figueira da Foz. Outras identificam tanto o agredido como alguns dos agressores e indicam que terão entre 15 e 17 anos, mas a maior parte dos envolvidos já apagou o perfil na rede social.

Protecção de menores averigua
A CPCJ da Figueira da Foz, contactada pelo PÚBLICO para perceber se estava a par do caso, disse que não prestava declarações. No entanto, a presidente desta estrutura, Sandra Lopes, confirmou à Lusa que vai averiguar os acontecimentos divulgados no vídeo. “A CPCJ não tinha conhecimento desta situação e só a conheceu depois de divulgado o vídeo. Vamos averiguar o que aconteceu. Recebemos depois da divulgação do vídeo várias participações, mas faríamos uma averiguação mesmo que isso não tivesse acontecido”, acrescentou.

Apesar de a agressão ter ocorrido fora dos estabelecimentos escolares da cidade, o director da Escola Dr. Joaquim de Carvalho confirmou ao PÚBLICO que o jovem agredido é aluno naquela instituição, mas assegurou que os restantes não estudam no mesmo estabelecimento. Carlos Santos diz-se “chocado” com o que viu, mas também com os comentários que leu.

“A situação, ao que já averiguei, ocorreu no Verão de 2014. A situação não ocorreu na nossa escola e, pressupostamente, em nenhuma escola da Figueira, mas sim na zona do picadeiro. Sendo o aluno agredido da nossa escola, já comuniquei à encarregada de educação toda a nossa disponibilidade para todo o apoio que o mesmo venha a necessitar e estiver ao nosso alcance”, disse o professor, acrescentando que “a ocorrência já foi denunciada e está a ser tratada pelas entidades competentes” e que estaria relacionada com questões de namoro.

Carlos Santos adiantou que desde o Verão que o comportamento e rendimento escolar do aluno têm sido normais, pelo que ficou “surpreendido” com esta situação e “preocupado com os efeitos ainda mais nocivos que esta exposição pode trazer”. O director garantiu também que “sempre foi e continuará a ser política da escola desenvolver programas de prevenção deste tipo de situações, nomeadamente na disciplina de Educação para a Cidadania”.

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