Quando se é pai pela primeira vez, de um modo minimamente responsável, penso ser normal definir alguns métodos de educação para passar determinados valores aos nossos filhos. Depois a experiência tende a tornar estes planos em práticas mais naturais.
Uma daquelas coisas que eu e a minha companheira desta parceria da parentalidade definimos foi: não condicionar a petiz pelos estereótipos de género. Ou seja, tentamos ser equilibrados nas cores, roupas, acessórios e brinquedos a escolher para ela. Evitamos ter tudo em cor-de-rosa e afins. Depois descobrimos que nos irritava que a confundissem com um menino só porque andava num carrinho azul ou vestia uma qualquer peça de roupa também azul e não usava bandolete.
Com o passar dos meses vieram os brinquedos mais “sérios”. Tentámos alternar entre bonecas e carrinhos. No entanto, alguém lhe ofereceu um conjunto de cozinha. Não nos pareceu absurdo na altura, pois tinha brinquedos de todo o tipo. Não podíamos cair no exagero e radicalismo de evitar os condicionamentos de género. Obviamente que uma menina podia ter brinquedos de cozinha, desde que não fossem os únicos.
Curiosamente, parecendo que o universo nos está a testar – partindo do princípio que o universo não tinha mais nada de interessante para fazer —, agora a miúda prefere brincar com os brinquedos estereotipados da “boa dona de casa”. Deixa todos os outros de lado e escolhe, quase sempre, os pratos, tachos e panelas.
Podia dizer, arriscando a brincadeira fácil e parva, que era a tendência natural de género. Absurdos de mau gosto à parte, penso que este comportamento pode trazer uma lição para todos nós. Eu diria que ela está simplesmente a brincar ao faz de conta, partindo dos modelos e hábitos que vê todos os dias. Eu e a mãe passamos imenso tempo na cozinha. Muito desse tempo coincide com o tempo que estamos com ela — é assim a vida dos jovens pais que têm de trabalhar e lutar para construir uma carreira enquanto não querem descurar na vida familiar.
Mas há uma coisa que me descansa nisto. Apesar dela escolher aqueles brinquedos, aos quais atribuímos imenso preconceitos de género, pode muito bem ser apenas o acto natural de imitação da mãe e do pai, pois, lá em casa, todos usamos os tachos e as panelas. Se calhar, mais do que as preocupações de evitar os estereótipos associados a objectos, importa destruir os nossos comportamentos estereotipados. Importa reforçar que as lides domésticas são missão de ambos os pais, independentemente dos géneros e dos objectos.