Declínio do mamute-lanudo ficou marcado no seu genoma

Cientistas utilizaram dois animais que viveram em locais e alturas diferentes para descodificar por completo o ADN do mamute-lanudo. Este trabalho revelou a ocorrência de duas grandes reduções de população antes da extinção da espécie.

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Restos de mamutes, como esta presa, permitem aos cientistas conhecer o passado destes animais extintos há cerca de 4000 anos Love Dalén
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Eleftheria Palkopoulou estuda a presa de um mamute Love Dalén
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O investigador Love Dolén com o osso de mamute Ivar Benediktsson

O trabalho analisou o genoma de dois mamutes e avaliou a variabilidade genética de cada um. Segundo os resultados, divulgados esta semana na revista científica Current Biology, houve dois momentos na história desta espécie com uma redução abrupta da população de mamutes-lanudos. O momento mais antigo foi há cerca de 280.000 anos. E o mais recente foi no fim da última era glaciar, há 12.000 anos.

As conclusões do trabalho, feito por uma equipa internacional com investigadores da Suécia, dos Estados Unidos, do Canadá e da Rússia, podem ajudar a estimar qual é a diversidade genética óptima de uma espécie em vias de extinção.

"Dado que populações pequenas levam à redução da capacidade de reprodução (fitness) dos animais selvagens, é plausível que a baixa variação genética detectada neste estudo possa ter tido impacto nessa capacidade da população de mamutes-lanudos da ilha de Wrangel e ter contribuído para a sua subsequente extinção”, conclui Love Dalén, do Museu de História Natural de Estocolmo, na Suécia, e colegas, no artigo.

Os fósseis mais antigos de mamutes-lanudos (Mammuthus primigenius) têm 700.000 anos, de acordo com Love Dalén. A espécie dispersou-se pela Eurásia e pela América do Norte, alimentando-se da vegetação que existia nas estepes e na tundra. Estes mamíferos atingiam quatro metros de altura, eram cabeçudos e tinham enormes presas enroladas para dentro.

Um dos mamutes analisados — o de um jovem cujo cadáver foi encontrado congelado no solo em Oimiakon, no Nordeste da Rússia — viveu há 44.628 anos e pertencia a uma população continental. O ADN do segundo animal foi retirado do um dente molar de um mamute da ilha de Wrangel, que viveu há cerca de 4300 anos, poucos séculos antes da extinção da espécie.

“Descobrimos que o genoma de um dos últimos mamutes do mundo tinha uma baixa variabilidade genética e uma assinatura que é consistente com a endogamia, provavelmente devido ao pequeno número de mamutes que sobreviveram na ilha de Wrangel”, defende Love Dalén, citado num comunicado do grupo editorial Cell Press.

Os cientistas verificaram que os pedaços de ADN do mamute de Wrangel tinham muito menos variabilidade do que os pedaços de ADN do mamute mais antigo. Segundo o investigador, a população daquela ilha teria apenas cerca de 330 mamutes em idade reprodutível naquela altura.

A comparação entre os dois genomas permitiu ainda concluir que a população sofreu uma redução abrupta em duas alturas diferentes. Desconhece-se os motivos que levaram à primeira diminuição — há cerca de 280.000 anos —, pois não há nenhum fenómeno climático ocorrido nesta altura que possa explicar o sucedido.

A análise genética do mamute de Wrangel indica que a população “parece ter-se mantido estável até uma [nova] redução drástica há cerca de 12.000 anos”, diz o artigo. Por esta altura, deu-se o fim da última era glaciar. “A nossa melhor estimativa para a altura desde declínio rápido coincide com a transição do Plistoceno com o Holoceno e o subsequente isolamento da ilha de Wrangel, devido à subida do nível médio do mar.” Ao mesmo tempo, a espécie desapareceu do continente euroasiático.

O estudo mostrou ainda que os dois mamutes pertenciam a populações genéticas diferentes que se terão separado há cerca de 50.000 anos.

Para os autores, este estudo é importante para avaliar a diversidade genética normal de uma espécie e pode ter aplicações importantes: “Os resultados realçam o valor da sequenciação de genomas de animais antigos que viveram antes de um declínio da população de uma espécie, para se determinarem os níveis de referência da sua diversidade genética. Na biologia da conservação, esta abordagem pode ser usada para medir directamente a diversidade que já se perdeu nas espécies agora ameaçadas de extinção.”

A análise e descodificação do genoma do mamute-lanudo poderá ainda ser utilizada para tentar trazer este animal de volta à vida através de engenharia genética, usando elefantes fêmeas como barrigas de aluguer. Mas ressuscitar espécies extintas levanta muitas questões éticas.

“Antes de sabermos se é possível fazer isso no futuro próximo, há questões éticas importantes que precisam de ser discutidas”, defende Eleftheria Palkopoulou, investigadora do Museu de História Natural de Estocolmo e outra autora do estudo, à agência Reuters. “Quantos mamutes seriam necessários para manter uma população viável? Será que não seria melhor aproveitar os recursos usados nisso para conservar espécies vivas e manter os seus habitats?”

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