A campanha "Parem a Hillary" já começou

Foi há um ano que os dirigentes republicanos decidiram a estratégia a usar contra Clinton. Por ser quem é e por ser a única a ter avançado entre os democratas, Hillary uniu a oposição como não acontecia há décadas.

Foto
Favorita à nomeação do Partido Democrata, Clinton não vai ter tarefa fácil para chegar à Casa Branca REUTERS/Jonathan Ernst
Reconhecendo a força política dos Clinton, muitos responsáveis republicanos e estrategas de direita estão determinados a começar o quanto antes os ataques à candidata, valendo-se do seu percurso enquanto foi secretária de Estado e sublinhando o que consideram ser as suas vulnerabilidades, e ignorando os rivais que possam aparecer no caminho de Hillary e que sejam menos conhecidos.

Este ataque imediato — que envolve uma bateria de pessoas para fazerem pesquisa, realizarem vídeos sarcásticos e até documentários — reflecte o desejo do Partido Republicano em ter um só opositor, comum a todos e que una o seu campo, que se fracturou nas duas últimas eleições presidenciais.

Alguns dos que atacam a candidatura de Hillary Clinton estiveram na sexta-feira na convenção da National Rifle Association (associação nacional de armas), onde fizeram discursos contra a candidata e deram entrevista sobre ela.

Há uma sensação familiar nesta estratégia. Mais de 14 anos depois de Bill Clinton ter saído da Casa Branca, os republicanos estão a regressar a um campo de batalha que conhecem e frequentam há décadas, reavivando velhas e novas polémicas enquanto procuram impedir o regresso de um adversário de longa data à política presidencial.

Reince Priebus, o combativo presidente do Comité Nacional Republicano (CNR), que se tornou o elemento mais crítico de Clinton, lidera a guerra. Há dias, o CNR promoveu a campanha "Parem a Hillary" com um anúncio na Internet que denuncia os donativos oriundos do estrangeiro feitos à fundação da família Clinton e que relembra a polémica sobre a utilização do e-mail privado para assuntos de Estado quando ela era secretária de Estado.

Priebus — que habitualmente descreve Clinton como uma pessoa fria, uma espécie de Nixon, mas liberal e milionária — aprovou o gasto de milhões de dólares para anúncios dirigidos aos eleitores dos chamados estados indecisos (que tanto podem dar a vitória ao candidato de um partido como ao do outro). Mas há uma galáxia de gente poderosa, de agitadores e de organizações envolvidos na campanha, entre eles sites de direita e comités de acção política que podem aceitar milhões de dólares em donativos ilimitados provenientes dos maiores financiadores do partido.

No sábado, um consultor do Partido Republicano, Roger Stone, disse numa entrevista que está a terminar um livro que sairá no Verão — para já chamado Os Clinton: guerra às mulheres — sobre a forma como na família da candidata se lidou com os episódios que ensombraram a vida pessoal de Bill Clinton.

David Bossie, presidente da Citizens United, está a produzir uma sequela de Hillary: o Filme, uma obra anti-Clinton lançada na campanha de 2008, quando Hillary Clinton tentou pela primeira vez ser nomeada candidata do Partido Democrata à Casa Branca. Esta espécie de documentário não foi um êxito de bilheteira, mas descobriu informações que abriram caminho para o grupo fazer uma queixa sobre financiamentos de campanhas que chegou ao Supremo Tribunal — o caso Citizens United vs. Comissão Eleitoral Federal.

O filme anterior, de 2008, centrava-se -se no tempo em que Hillary Clinton viveu no Arkansas e em que foi primeira-dama, explicou Bossie numa entrevista. O que se segue "mergulha no período em que foi secretária de Estado e no chamado 'Clinton Global Inc.', ou seja, o capitalismo de compadrio dela e do marido". "Procurem o filme em Março ou Abril de 2016", disse Bossie.

Bruce Fein, um advogado republicano que pertenceu à Administração Reagan, está a ultimar o website HillaryWatch.com. Vai catalogar as posições políticas de Hillary e encontrar matéria-prima para alimentar o discurso e as acções dos detractores da candidata democrata. E o Washington Free Beacon, uma revista online que mandou jornalistas vasculhar nos arquivos da biblioteca presidencial Bill Clinton, está a preparar uma série de histórias que juntam investigação e humor, segundo o seu fundador, Michael Goldfarb. O título de um artigo que já saiu na terça-feira era "É altura de Hillary se pronunciar sobre Hitler".

Questionado sobre quanto tempo ira a revista perseguir tão agressivamente Hillary, Goldfarb respondeu, por e-mail: "Enquanto eu respirar." Disse que o tempo que a candidata passou no Departamento de Estado é "uma mina de ouro" para os conservadores. "Imelda Marcos não tinha tantos sapatos como ela" tem casos.

Sean Spicer, conselheiro político do CNR, disse que foi há um ano que os dirigentes republicanos decidiram a estratégia a usar contra Clinton. Optaram por uma série de ferramentas de marketing digital e decidiram começar o quanto antes, em vez de esperarem pelas primárias presidenciais (quando os partidos escolhem os seus candidatos, de entre todos os que se propuseram).

"O Partido Democrata escolheu coroar Clinton e estamos focados apenas nela. Isso não quer dizer que não estejamos a vigiar Martin O’Malley, Jim Webb ou Lincoln Chafee," disse Spicer, referindo-se a outros potenciais candidatos democratas. "Mas é uma questão matemática, e teríamos de ser de outro planeta para pensarmos que Lincoln Chaffee vai ser um candidato viável."

Porém, alguns republicanos receiam que os activistas conservadores se tornem demasiado zelosos e, por isso, prejudiquem o Partido Republicano junto das mulheres. "Os republicanos têm que ser muito cautelosos quando falarem de competências para não se tornarem condescendentes perante uma candidata mulher. Se não tivermos cuidado, podemos cometer erros que farão com que mais mulheres votem nela, e isso seria devastador", disse Fein. "Aconselhei a que nunca se falasse na sua idade e na sua saúde. Em vez disso, o ponto central deve ser a sua capacidade para o cargo", disse Kellyanne Conway, uma especialista republicana em sondagens que aconselha candidatos republicanos que concorrem contra mulheres democratas. "O pessoal de Clinton vai analisar tudo o que fizermos do ponto de vista do género."

Falando na sexta-feira na convenção da National Rifle Association, em Nashville, o vice-presidente da organização, Wayne LaPierre, foi o exemplo de como os líderes republicanos terão que se controlar quanto ao tom que usam. LaPierre estava apocalíptico. "Hillary Rodham Clinton vai trazer a escuridão permanente da mentira e um desespero eterno aos americanos", disse.

Os candidatos a candidatos republicanos — e estavam lá vários — foram menos severos ao falarem na mesma convenção. O governador do Wisconsin, Scott Walker, chamou a Clinton "veículo da dependência do Governo". O senador Ted Cruz (Texas) lembrou as posições de Clinton sobre a posse de armas e fez uma ameaça: "Se Hillary Clinton se juntar a Barack Obama para virem atrás das nossas armas, o que lhes digo é o seguinte: ‘Venham buscá-las’." O antigo governador da Florida Jeb Bush optou por se atirar à "visão liberal progressista de Obama, Hillary Clinton e Eric Holder".

Mas a mais belicosa operação anti-Clinton a decorre no firmamento republicano é responsabilidade da America Rising, um comité de acção política que ao abrigo da lei de acesso aos documentos públicos fez uma avalanche de pedidos ao Departamento de Estado. Na sua sede em Arlington, montou uma sala de guerra dedicada a Clinton e pôs a trabalhar nela toda a sua equipa de jovens.

Clinton também tem um exército a defendê-la. Por exemplo, o grupo Priorities USA Action, gerido por antigos conselheiros de Obama, que está a preparar o envio de pedidos de apoio e espera superar largamente os muitos milhões que recolheu em nome de Obama em 2012.

Apesar do tom geral de agressividade, o activista anti-impostos Grover Norquist, que há muito organiza um encontro de actores políticos conservadores em Washington, diz que o espírito na direita é, desta vez, algo diferente. Em 1990, lembra, os republicanos lançaram-se "indignados" aos Clinton, em especial a Bill. Agora há menos euforia e mais um sentimento de dever na sua cruzada. "Ela aborrece-me um bocadinho", admite Norquist. "E as pessoas também já perceberam que são menos convincentes quando avançam para uma batalha cheias de raiva".

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post

Sugerir correcção
Ler 3 comentários