Já ouvimos Magic Whip: os Blur continuam a fazer-nos falta

A menos de um mês da edição de Magic Whip e a pouco mais de três meses do concerto no Super Bock Super Rock, em Lisboa, confirma-se: os Blur conseguiram o que se exigia – juntaram mais um admirável acrescento à sua história.

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O novo disco dos Blur é o retorno ao quarteto que não gravava desde 13, de 1999: Albarn, James, Coxon, Rowntree Linda Brownlee

Mas não, o destino não abusou da sua condição e Magic Whip, oitavo álbum de estúdio dos Blur, retorno ao quarteto original que não gravava desde 13 (1999), está prestes a chegar, a 27 de Abril. E o Ípsilon já o ouviu. Do primeiro ao último segundo.

E os primeiros segundos, na verdade, soam a uma declaração de que, com Coxon de volta, somos atirados directamente para os bons velhos tempos: Lonesome Street foi feita e colocada a abrir o disco para sossegar. Soa à época gloriosa de Modern Life Is Rubbish / Parklife (1993/1994), pop arreigadamente inglesa, guitarras irrequietas de nervoso adolescente, teclados com as voltas circenses habituais em Albarn e uns muito apreciáveis ecos beatleanos em linha com I Am the Walrus, canção-delírio de John Lennon. O mesmo puzzle volta a ser montado mais tarde, embora de forma mais desalinhada, em I broadcast. As correspondências com o passado mais recente fazem-se logo em seguida com New world towers, balada de toada espacial que remete para o disco a solo de Albarn, Everyday Robots, e um solo a caminho do fim que só poderia vir das mãos de Graham Coxon. Ao segundo tema já o sabemos – os Blur estão mesmo de volta e a sua discografia anterior não vai ficar envergonhada a um canto, a fingir que não tem nada que ver com isto.

Falando de passado recente: Go out, tema já conhecido, liga os Blur à crueza de Think Tank, mas também a uma jinga rítmica acompanhada de um registo vocal que poderiam ter sido inventados para os Gorillaz, engolidos depois por uma guitarra em roda livre. A partir de Thought I was a spaceman, no entanto, Magic Whip começa a descolar rumo a novos territórios, a soar a um álbum cada vez mais desapegado dos discos anteriores e pouco ancorado em canções óbvias. Mesmo quando se lançam a temas soalheiros como Ghost ship, uma belo canção acústica a lembrar os Kings of Convenience iniciais, com travo ligeiramente tropical, ou Ong ong, com uma guitarra que poderia ter sido emprestada por Marcelo Camelo para um todo em modo festivo à la Kinks, fazem-no com a frescura de quem nunca dobrou aquelas esquinas.

O reverso surge no tom melancólico de Thought I was a spaceman e na elegância sublime do tema final, Mirrorball, acompanhadas de um sentido dramático profundamente presente em There are too many of us, ou de uma espantosa caminhada de tendência épica e misteriosa em Pyongyang (da mesma maneira que a visão de Albarn sobre a Coreia do Norte se vislumbra por trás de uma cortina poética e difusa). É a secção do disco mais sintonizada com o estúdio “claustrofóbico e quente”, ele mesmo um espelho dos apartamentos cubículos-que desenham a paisagem urbana de Hong Kong – a que Albarn se refere muito claramente em There are too many of us, cantando por cima de uma tirânica tarola militar.

E depois há uma desarmante canção chamada My terracota heart, de uma beleza extrema, tudo feito com uma delicadeza tocante: das guitarras meio desmaiadas de Coxon à voz e aos teclados nostálgicos de Albarn.

A menos de um mês da edição de Magic Whip e a pouco mais de três meses do concerto no Super Bock Super Rock, em Lisboa, confirma-se: os Blur conseguiram o que se exigia – não se limitaram a maquilhar canções antigas, nem ficaram reféns de uma forçosa reinvenção. Instalaram-se saudavelmente algures no meio, juntando mais um admirável acrescento à sua história.

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