O suicídio como meio de sobrevivência
Um texto de Jean-Pierre Sarrazac em estreia mundial no Porto que o confirma como importante destino teatral europeu.
Sarrazac põe o dedo na ferida quando retrata o desempregado como um morto-vivo, e a maior parte das pessoas, palpito eu, não poderá deixar de se identificar com a estratégia de resistência, agressivo-passiva, que JB adota, entre uma e outra golada de whisky, e mais um copinho de vinho, para passar a perna ao destino.
A urgência artística, cultural e política deste espectáculo torna-o um destino obrigatório, este sim, para os espectadores de teatro. Não é que esses aspectos caucionem a criação teatral. É que o espectáculo — além de excelente nas suas diversas componentes, da luz ao som, passando pela cenografia e pelos figurinos, sem esquecer as actuações individuais e em conjunto — tem esse alcance. A peça é riquíssima e a encenação não lhe fica atrás, ambas revelando domínio da tradição, por um lado, e exploração do que há-de ser, por outro. A familiaridade súbita com as figuras, a acção, as metáforas e a estrutura da peça fazem com que Jean-Pierre Sarrazac se revele, passe o exagero, um verdadeiro autor português de expressão francesa.
Levar à cena esta peça é falar de corda em casa de enforcado. Os artistas têm sido uma das classes mais castigadas pela doutrina do capitalismo dos últimos dias, por um lado, e têm servido inúmeras vezes de flor na lapela dos oficiantes desse culto.
O Fim das Possibilidadesapresenta-se em estreia mundial, no Teatro Nacional de São João, membro da União dos Teatros da Europa, fazendo prova do seu lugar no conjunto dos teatros europeus. O lugar na lista dos melhores destinos é mais do que merecido.