A rua é neste domingo da direita brasileira para marchar contra Dilma

Movimentos conservadores esperam levar 100 mil à rua. Mas o seu sucesso depende de muito mais do que números.

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Um manifestante contra Dilma em Copacabana, no Rio de Janeiro Sergio Moraes/REUTERS
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Com efeito, desde que iniciou o segundo mandato, a Presidente do Brasil tem enfrentado um clima político difícil. Começou cedo, com a formação do Governo. Dilma nomeou para ministro da Fazenda Joaquim Levy, um economista liberal, e para ministra da Agricultura Kátia Abreu, uma figura muito contestada pelo Movimento dos Agricultores Sem Terra (MST), um histórico aliado do seu Partido dos Trabalhadores (PT).

Somou-se depois um cenário económico adverso: a inflação atingiu níveis históricos, o real entrou numa marcha de desvalorização, as secas no Sul do país contribuíram para o aumento das facturas da electricidade e os preços da gasolina e gasóleo subiram. Para além do mais, Dilma tem em mãos a estagnação económica de 2014 e uma perspectiva de queda do Produto Interno Bruto (PIB) em 2015. Para atacar estes problemas, a Presidente apresentou um pacote de medidas de austeridade conhecido como Ajuste Fiscal. Este envolve, essencialmente, um corte de 18 mil milhões de reais na despesa do Estado (cerca de 5310 milhões de euros), assim como restrições ao acesso a subsídios de desemprego e abonos salariais, por exemplo.

E há ainda o caso da Petrobras. Apesar de não estar directamente visada nas investigações à alegada rede de corrupção na petrolífera do Estado, a proximidade da Presidente do Brasil ao caso tem-lhe sido prejudicial. Dilma foi presidente do Conselho de Administração da petrolífera entre 2003 a 2010, período durante o qual se suspeita terem existido vários casos de desvio de dinheiro. Além disso, há quatro ex-ministros seus sob investigação e existem ainda suspeitas de que a sua campanha eleitoral de 2010 tenha beneficiado de financiamentos ilegais.

É neste contexto que surgem os protestos de domingo. Os organizadores esperam cerca de 100 mil pessoas nas ruas, mas a expectativa em torno das manifestações não se deve apenas ao facto de estas poderem ser o maior movimento popular contra a Presidente desde que ela foi reeleita. Existem ainda muitas incertezas sobre qual poderá ser a principal bandeira dos protestos. Os vários movimentos sociais que encabeçam as convocatórias partilham uma matriz conservadora e liberal, mas as suas reivindicações são muito heterogéneas, sobretudo no que toca à exigência de um impeachment a Dilma Rousseff.

O impeachment
Os movimentos populares tentarão capitalizar no domingo o ambiente de insatisfação em torno de Dilma. Mas sob que forma? Vários movimentos pedem o afastamento de Dilma Rousseff da presidência através de um impeachment, uma figura legal que suscita muitas dúvidas sobre a sua utilização no presente contexto. Se esta for a bandeira principal dos protestos, estes arriscam-se a perder parte da sua substância.  

É o que diz ao PÚBLICO Michael Mohallem, investigador da Fundação Getúlio Vargas especialista em Ciência Política. “Há uma confusão: o impeachment é um instrumento constitucional, mas o seu uso nem sempre é constitucional”, afirmou o investigador numa entrevista por telefone. De acordo com Mohallem, embora a figura não seja a adequada ao momento, “a bandeira do impeachment surge com força porque é uma forma de vestir a insatisfação de uma roupa de legalidade”.

Esta é uma das razões pelas quais as grandes forças políticas de oposição a Dilma têm encarado com prudência as manifestações de domingo. Aécio Neves, o líder do Partido da Social Democracia Brasileira e principal opositor nas eleições de 2014, anunciou que apoia os protestos, mas deixou claro que não apoia o pedido de impeachment. Marina Silva, do Partido Socialista Brasileiro, derrotada na primeira volta das presidenciais, fez o mesmo: sim às manifestações, não ao pedido de impeachment. O ex-Presidente brasileiro, Fernando Henrique Cardoso, comparou o recurso ao impeachment ao uso de uma "bomba atómica". 

Essa tem sido, aliás, a principal linha de defesa ao Governo. Nas contra-manifestações de sexta-feira, organizadas por movimentos afectos a Dilma e ao PT, os organizadores dos protestos de domingo foram acusados de estarem a tentar promover um golpe de Estado e de não aceitarem os resultados eleitorais de 2014.

E não é só a ênfase sobre o impeachment que poderá dar um tom anti-democrático às manifestações. Apesar de serem grupos minoritários, a marcha contará com vários movimentos de inspiração militarista e da extrema-direita.

Daí que muito do sucesso dos protestos dependa das principais bandeiras que forem erguidas. Se a imagem predominante for a de um protesto democrático, as principais forças de oposição podem servir-se disso, como diz ao PÚBLICO Michael Mohallem: “A oposição percebe que este é um momento de força política muito grande que não é capitaneada por nenhum partido e nenhuma liderança. Eu acho que isto pode ser decisivo para o futuro da conjuntura política do Brasil. Se alguns partidos ou lideranças assumirem a frente do movimento, isto pode ganhar proporções maiores”.

Significam os protestos conservadores que a demografia eleitoral do Brasil se está a afastar do PT? Para Michael Mohallem, este não será o caso. Este período de contestação aberta a Dilma explica-se, em parte, pelos apertados resultados eleitorais (Dilma venceu na segunda volta com 51,65% dos votos, contra 48,35% de Aécio). “Tradicionalmente, quando a vitória é muito apertada, gera uma frustração muito grande dos eleitores cujo candidato foi derrotado e gera uma percepção de menor legitimidade daquele que venceu. Isto é natural, mas é parte da democracia”, afirma.

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