Sem identidade

O novo filme de Tim Burton desbarata uma história intrigante num objecto anónimo e funcional.

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Ainda por cima, há muito em Olhos Grandes – escrito por Scott Alexander e Larry Karaszewski, os argumentistas de Ed Wood (1994) – que parece “à medida” de Burton. É a história verídica de Margaret Keane, pintora americana que era a verdadeira autora de uma série de quadros de imensa popularidade na América dos anos 1950 mas que o marido, Walter, artista frustrado mas incansável auto-promotor, fez passar como seus. É também a história de uma sensibilidade “diferente”, “descentrada”, subalternizada ou ridicularizada por uma sociedade formatada e conformista – a “estranheza” da arte de Margaret apenas foi aceite, e mesmo assim com reservas, por ser assinada por um homem e vendida por um homem – e uma parábola dos primeiros tempos do poder dos mass media.

Precisamente por Olhos Grandes ser tão “à medida” de Burton, custa sentir tão pouca alma, tão pouca chama na sua concretização – como se a sensibilidade peculiar do realizador (que já de si se tem diluído ao longo dos anos) se limitasse aqui à exibição de um ou outro traço para “marcar o ponto”, pelo meio de um funcionalismo puramente ilustrativo que nem sequer consegue tornar convincente a relação entre Margaret e Walter, mesmo com actores de talento comprovado como Amy Adams ou Christoph Waltz. Essa talvez seja a maior oportunidade desperdiçada: que um filme sobre a reclamação por Margaret Keane da identidade artística que lhe foi negada seja um objecto anónimo, sem identidade própria, arrastando-se penosamente por uma auto-estrada sem sequer ter vontade de percorrer os seus caminhos mais esconsos. Olhos Grandes é uma das grandes desilusões do cinema americano recente – e depois disto, receamos já nada mais haver a esperar de Tim Burton.

 

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