Um restaurante do tamanho do mundo
A Expo 2015 vai reflectir os “paradoxos” de um mundo que sofre com epidemias como a obesidade, mas no qual 870 milhões de pessoas passam fome.
O número é, obviamente, uma construção do marketing, porque na realidade o que se vai poder encontrar na Expo são produtos, naturais ou transformados, dietas, receitas, tradições e experiências gastronómicas que estão na base da experiência alimentar da maioria esmagadora dos humanos. A Expo 2015 de Milão promete ser um dos maiores espaços de exibição de alimentos de sempre e seguramente um dos maiores e mais variados restaurantes alguma vez criados.
A escolha do tema não é inocente, ou não fosse a gastronomia italiana uma das mais mundializadas e um forte suporte para as suas exportações agro-alimentares. Por lá vão estar as suas pastas, os seus presuntos de Parma, vinagres de Modena ou a sua multidão de queijos para uma infinidade de gostos. Todos os países procuraram instalar nos seus pavilhões os bens alimentares emblemáticos e as suas criações culinárias – os europeus e asiáticos estão em luta pela hegemonia do palato mundial. Mas o tema da Expo vai muito para lá da dimensão gourmet da alimentação. Na sua agenda de eventos ou nos seus pavilhões temáticos há a preocupação de discutir os “paradoxos” da fome num planeta que produz muito para lá das suas necessidades, a incorporação da ciência na produção de bens alimentares ou a sustentabilidade da agricultura num mundo em rápido crescimento populacional.
Uma das reflexões que dominará os debates tem como ponto de partida esses “paradoxos” ou essas “contradições do nosso mundo”. Por um lado, subsistem na Terra 870 milhões de pessoas que vivem em permanente penúria alimentar e num estado de contínua subnutrição (dados de 2010-2012) enquanto há 2.8 milhões de pessoas a morrer todos os anos por mau uso ou abuso do consumo de alimentos – a obesidade tornou-se uma epidemia dos países do hemisfério Norte. Enquanto milhões de pessoas de algumas zonas da Ásia ou da África subsariana lutam desesperadamente todos os dias por uma dieta de subsistência, nos países ricos estragam-se todos os anos 1.300 milhões de toneladas de comida. A Itália, recorde-se, tem uma longa tradição no acompanhamento dos problemas da alimentação mundial – Roma é a sede da FAO, a organização das Nações Unidas para a agricultura e a alimentação.
É nos quatro pavilhões temáticos que a dimensão universal da alimentação e dos seus desafios se vai mostrar e discutir. O pavilhão Zero dedica-se à história da alimentação humana desde os tempos da caça-recolecção até à fast-food e a área da Comida do Futuro tentará explicar como a ciência e a tecnologia vão mudar o armazenamento, a distribuição, a aquisição e o consumo de alimentos. Haverá ainda um parque dedicado à biodiversidade que tenta reproduzir diferentes ecossistemas do planeta e um espaço dedicado à relação entre a comida e a arte ao longo dos tempos. Em torno deste núcleo gravitam os pavilhões nacionais, os das organizações internacionais, das empresas da indústria agro-alimentar e a das organizações não governamentais (ONG) ligadas por áleas onde existem mais de 12 mil árvores, um canal artificial e diversas fontes.
A organização espera que a Expo 2015 seja visitada por mais de 20 milhões de pessoas. Uma meta que fica em linha com o número de visitantes nas exposições universais de Hanôver, na Alemanha, em 2010 (19 milhões) e a de Aichi, no Japão, em 2005 (22 milhões). Mas que fica a grande distância do público que visitou a última grande exposição universal, em Xangai, China, em 2010. Ao todo, esta edição acolheu 73 milhões de pessoas. Para se ter ideia do significado destes números, note-se que a Expo 1998 de Lisboa, que era uma exposição Mundial, e não uma exposição Universal, foi visitada por 11 milhões de pessoas.