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Putin recebe Merkel e Hollande com a diplomacia presa por um fio

Chanceler alemã e Presidente francês foram a Moscovo fazer uma contraproposta ao Presidente russo. Moscovo diz que conversações forma construtivas e diz que resultados da reunião serão divulgados no domingo.

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O Presidente russo enviou um roteiro para a resolução do conflito aos dois líderes europeus MAXIM ZMEYEV/AFP

Assim que chegaram à capital russa, nem a chanceler Angela Merkel nem o Presidente François Hollande perderam tempo com apertos de mão para a fotografia, num sinal claro de que o relógio da diplomacia está cada vez mais desfasado da situação no terreno.

Depois de uma passagem na quinta-feira por Kiev, onde falaram com o Presidente ucraniano, os dois líderes europeus não esconderam a dificuldade da tarefa que têm entre mãos, à partida para Moscovo. No final da conferência, um porta-voz do Kremlin disse apenas que as conversações foram "construtivas".

"Há possibilidades, mas também há riscos. Tivemos de tomar esta iniciativa pela paz, para que não tenhamos arrependimentos no futuro", disse o Presidente francês antes do início da reunião de quase seis horas.

A chanceler alemã também deixou claro que a surpreendente decisão de ir a Moscovo falar com Vladimir Putin foi suscitada mais pela urgência do momento do que por uma profunda convicção de que é possível travar a escalada da guerra no Leste da Ucrânia: "Estamos convencidos de que não existe uma solução militar para este conflito. Mas também sabemos que estas conversações não garantem nenhum acordo de cessar-fogo. Não sabemos se isso vai acontecer hoje, ou se serão necessárias mais reuniões, nem se as conversações vão durar muito ou pouco tempo."

Angela Merkel e François Hollande decidiram deslocar-se a Moscovo depois de terem recebido, durante a semana, um roteiro de Vladimir Putin para o fim do conflito. Os pormenores desse documento não foram revelados, mas a iniciativa de Moscovo foi interpretada na Europa como uma das últimas oportunidades para se impedir que a guerra na Ucrânia assuma proporções ainda mais perigosas para a paz no continente.

As posições entre as partes estão tão extremadas que o eventual sucesso de Angela Merkel e François Hollande depende das suas capacidades para apresentarem um acordo que agrade a todos, o que é muito mais do que apenas evitar danos maiores – oferecer a Putin uma saída em ombros perante o seu povo; satisfazer as reivindicações das autoproclamadas repúblicas populares de Donetsk e de Lugansk; não provocar um terramoto político e social na Ucrânia, evitando cedências inaceitáveis pelo povo ucraniano; e fazer tudo isto sem desfazer a frente comum com a Casa Branca, cada vez mais pressionada pelo Congresso norte-americano a armar o Exército da Ucrânia.

Apesar deste esforço diplomático de última hora, Alemanha e França deixaram claro que a ausência de progressos no terreno terá como resposta mais sanções contra a Rússia – e poderá levar à entrada dos EUA na guerra de forma indirecta, através do envio de armas para o Exército ucraniano, algo que tanto Berlim como Paris querem evitar.

Nesta sexta-feira, durante uma reunião da NATO em Munique, a ministra da Defesa alemã, Ursula von der Leyen, deixou clara a posição do seu país: "Temos a certeza de que vamos melhorar a situação do povo ucraniano se enviarmos armas? Temos mesmo a certeza de que a Ucrânia pode ganhar à máquina militar russa? E não seria isso uma desculpa para a Rússia intervir abertamente no conflito?"

Paz ainda é miragem
Os pormenores da reunião de quinta-feira à noite entre Merkel, Hollande e o Presidente ucraniano, Petro Poroshenko, não foram divulgados, mas se os três líderes apenas discutiram os temas mencionados no comunicado de Kiev, será difícil que a viagem a Moscovo tenha um final inesperado – ou seja, um compromisso credível com um plano de paz.

"As partes apelaram a um cessar-fogo imediato, à saída da Ucrânia de tropas estrangeiras, à retirada de armamento pesado, ao encerramento das fronteiras [com a Rússia] e à libertação de todos os reféns", disse o Presidente ucranianoO comunicado deixa claro que o ponto de partida para o novo – e mais urgente – plano de paz para a região tem como base o velho plano de paz, assinado em Minsk, em Setembro do ano passado, e constantemente violado desde então.

O ponto fundamental continua a ser a delimitação do terreno conquistado pelos pró-russos e o futuro estatuto dessas regiões, num momento em que os rebeldes estão prestes a cercar a importante cidade de Debaltseve, ainda nas mãos do Exército ucraniano, mas cobiçada por ser um nó de ligação entre as capitais das províncias separatistas de Donetsk e Lugansk.

A tarefa mais complicada da chanceler alemã e do Presidente francês é convencer o Presidente Vladimir Putin de que o conceito de integridade territorial da Ucrânia inclui a península da Crimeia, anexada pela Rússia em Março do ano passado – para além disso, será também necessário que os rebeldes pró-russos cedam uma parte do território conquistado ao Exército ucraniano desde o acordo de Minsk.

Tal como em tentativas anteriores, o problema é gerir a expectativa entre um possível plano de paz e a sua concretização no terreno, numa guerra que já fez mais de 5300 mortos desde Abril do ano passado.

Na semana passada, em entrevista ao jornal britânico The Telegraph, o presidente do parlamento da autoproclamada República Popular de Donetsk, Andrei Purgin, voltou a garantir que nunca irá abrir mão do território já conquistado e da exigência de separação total da Ucrânia: "Depois de tudo o que já aconteceu, é evidente que não é possível nenhuma forma de união política."

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