Numa vitória para Renzi, Sergio Mattarella é o novo Presidente da Itália
Foi eleito este sábado de manhã, na quarta ronda do escrutínio. Um irmão do chefe de Estado eleito foi morto pela Máfia nos anos 1980.
Depois de três tentativas goradas, em que o seu nome não atraiu os dois terços dos votos do colégio de eleitores, conforme estabelece a legislação, Sergio Mattarella obteve 665 votos – superando confortavelmente o patamar dos 505 necessários para garantir a eleição (uma maioria simples dos deputados, senadores e representantes das regiões do país). O siciliano, de 73 anos, toma posse na terça-feira para um mandato de sete anos.
Com uma carreira política acidental (como assinalava o Financial Times, o seu percurso profissional foi feito no mundo académico e o seu destino parecia ser o de tornar-se um distinto professor de Direito), e uma vida pública discreta e marcada por intervenções sóbrias mas convictas, Sergio Mattarella não é, notava a imprensa italiana, um “protagonista” óbvio. Mas isso não impediu Renzi de apostar todas as suas fichas no seu nome.
Mattarella tem um perfil de centrista e moderado, e uma reputação de homem de princípios, corajoso e incorruptível – sobretudo contra a mafia siciliana, que matou o seu irmão mais velho, Piersanti, com oito tiros à queima-roupa, em Janeiro de 1980. A família ia a caminho da missa em Palermo, e foi Sergio quem seguiu na ambulância com o irmão, que lhe morreu nos braços antes de chegar ao hospital. Os dois integravam o partido da Democracia Cristã que dominou a política italiana no pós-guerra, mas que desapareceu na década de 1990.
A presidência italiana, que é a garantia da ordem constitucional, transformou-se nos últimos anos de instabilidade política e incerteza económica, no centro de gravidade da vida política do país: em Outubro de 2011, com o colapso do executivo de Silvio Berlusconi, o experiente Napolitano iniciou um longo período de excepção, através da negociação de acordos parlamentares para evitar a convocação de eleições. Mesmo assim, nos nove anos que passou no Quirinale, Napolitano deu posse a quatro governos e ratificou duas eleições legislativas.
A eleição de Mattarella entra para a lista das importantes vitórias políticas de Matteo Renzi, que na primeira vez que teve de apostar no jogo de alto risco presidencial foi capaz de ultrapassar as resistências e de unir a indisciplinada bancada do Partido Democrático (PD), que em 2013 minou o acordo para a eleição do seu próprio candidato, Romano Prodi, forçando o Governo então liderado por Pier Luigi Bersani quase a suplicar a Napolitano que aceitasse continuar no cargo.
Desta vez, porém, o primeiro-ministro não se deixou enredar pelas maquinações dos franco-atiradores que transformam a escolha presidencial no processo institucional mais imprevisível da política italiana. Numa demonstração de “grande capacidade táctica e estratégica”, impôs a sua escolha, numa votação que para muitos analistas podia também ser interpretada como uma espécie de moção de confiança dissimulada ao seu Governo. “No caso de Renzi conseguir conter a oposição e manter a unidade da sua bancada, estaremos perante um sinal muito positivo em termos da sua agenda de reformas económicas e políticas”, antecipava o economista do Deutsche Bank, Marco Stringa, citado pela agência Bloomberg.
A eleição tinha uma importância crucial para o enérgico primeiro-ministro, que precisa de um aliado no Quirinale para fazer avançar a sua reforma política, assente numa revisão da lei eleitoral (Mattarella foi um dos autores dessa legislação nos anos 1990). O triunfo de Renzi significou mais um revés político para o seu aliado de direita Angelino Alfano, o ministro do Interior do partido Novo Centro Direita, e, assinalava o La Stampa, correspondeu a uma “retumbante derrota” para o antigo primeiro-ministro e líder do Forza Italia, Silvio Berlusconi.
O Cavaliere, que aceitou os termos propostos pelo Governo para a reforma constitucional, forçou um duelo com Renzi, numa tentativa de condicionar a escolha de um nome consensual. Perante a insistência do primeiro-ministro em Mattarella, Berlusconi deu ordem à sua bancada para romper o pacto e votar em branco, mas acabou por ser desafiado por 30 dos seus deputados.
O Presidente portuguêsfelicitou Sergio Mattarella pela sua eleição como chefe de Estado italiano, destacando o “muito que aproxima” Portugal e Itália e o empenho em “reforçar ainda mais as relações”. Cavaco Silva afirma a sua convicção de que os dois países “continuarão a tirar partido do muito que os aproxima”, quer no plano bilateral quer no âmbito da parceria europeia.