Trocas de acusações limitam sucesso de conversações sobre a Ucrânia
Combates aumentam de intensidade e, sem progressos no terreno, líderes europeus recusam sentar-se à mesa das negociações.
A reunião ao início da noite desta quarta-feira entre os ministros dos Negócios Estrangeiros da França, da Alemanha, da Ucrânia e da Rússia, em Berlim, é vista como uma das últimas oportunidades para que a cimeira de líderes marcada para Astana possa ver a luz do dia. Na semana passada, após uma reunião semelhante, optou-se por cancelar a cimeira, uma vez que os progressos na implementação de um cessar-fogo na Ucrânia eram nulos.
Desde essa altura a situação no terreno não melhorou e a batalha diplomática aprofundou-se. Horas antes do seu início, a chanceler alemã, Angela Merkel, já tinha vindo moderar qualquer optimismo mais exacerbado em relação à possibilidade de que se reúnam condições para a cimeira de líderes na capital do Cazaquistão. “Não quero elevar as esperanças em demasia. É óbvio que o cessar-fogo está cada vez mais frágil”, disse Merkel.
Na véspera, a reunião de Berlim já estava ensombrada pelas repetidas acusações por parte da Ucrânia de que a Rússia está a aumentar o número de soldados no seu território. Primeiro foi o porta-voz do Exército, Andrei Lisenko, que, citado pela Reuters, afirmou que “formações militares regulares das forças armadas russas” atacaram algumas das suas unidades a norte da “zona operacional antiterrorista” – designação que tem sido dada por Kiev à operação militar que vem desenvolvendo no Leste do país.
Já esta quarta-feira foi o próprio Presidente, Petro Poroshenko, a revelar que a Rússia tem mais de nove mil soldados no território ucraniano, durante uma conferência no Fórum Económico Mundial em Davos (Suíça). Ainda assim, o líder ucraniano reiterou as condições para que o cessar-fogo possa ser alcançado, dirigindo-se directamente a Moscovo: “Parar de fornecer armas, parar de fornecer munições, retirar as tropas e fechar a fronteira. É um plano de paz muito simples.” O agravamento da situação no país levou mesmo o Presidente a reduzir a duração da sua estadia em Davos.
A poucas horas do encontro entre os chefes da diplomacia, a questão da presença russa no território ucraniano passou para o debate público. Depois das acusações de Poroshenko, o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, pediu provas que suportem a posição de Kiev. “Digo sempre isto: se alegam isto com tanta confiança, apresentem os factos, mas ninguém consegue apresentar os factos, ou não o querem fazer”, disse numa conferência de imprensa antes de entrar para a reunião. Moscovo negou sempre o envolvimento das suas forças armadas no conflito, embora já tenha admitido que soldados russos possam ter tido alguma intervenção, mas apenas a título “voluntário”.
A posição de Kiev tem sido defendida também pela NATO, que esta quarta-feira reafirmou ter conhecimento da “presença de forças russas no Leste da Ucrânia”. “Vimos também um aumento substancial do número de equipamento pesado russo”, afirmou o secretário-geral, Jens Stoltenberg, sem referir números concretos.
No Leste da Ucrânia os combates não parecem diminuir de intensidade. Nas primeiras semanas do ano, a violência voltou aos níveis mais altos desde a assinatura de um acordo de cessar-fogo no início de Setembro que, apesar de ter sido sempre quebrado pelas duas partes, conseguiu reduzir o calor do conflito.
Os combates têm-se concentrado na área do aeroporto internacional de Donetsk, um terreno que tem passado várias vezes de lado desde o início do conflito. A importância que lhe é atribuída actualmente é sobretudo simbólica, uma vez que a violência dos confrontos levou quase à sua total destruição. Numa declaração no início desta semana, a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa expressou as suas "preocupações sérias pela escalada militar dos últimos dias" e pediu o regresso à mesa das negociações.